Descrição de chapéu salário mínimo inflação

Governo manobra e não inclui custo de reajuste adicional do salário mínimo no Orçamento

Decisão contribui para reduzir ainda mais o déficit, projetado agora em R$ 107,6 bilhões

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Brasília

A equipe econômica decidiu não incluir agora no Orçamento uma despesa de R$ 4,5 bilhões para bancar o reajuste adicional do salário mínimo para R$ 1.320, já confirmado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e que vai entrar em vigor em 1º de maio.

A manobra contribuiu para reduzir ainda mais a projeção do déficit primário, que caiu de R$ 228,1 bilhões para R$ 107,6 bilhões.

Técnicos e autoridades ouvidos pela Folha na véspera da JEO (Junta de Execução Orçamentária), ocorrida na terça-feira (21), afirmaram que até então a estimativa era que o déficit fosse atualizado para a casa dos R$ 120 bilhões.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em cerimônia no Palácio do Planalto - Evaristo Sá - 10.mar.2023/AFP

Havia ainda uma avaliação preliminar de que poderia ser necessário um bloqueio nas despesas dos ministérios, que acabou não se concretizando.

As novas projeções foram divulgadas nesta quarta-feira (22) pelo Ministério do Planejamento e Orçamento, após serem previamente aprovadas pela JEO. O colegiado é formado pelos ministros Rui Costa (Casa Civil), Simone Tebet (Planejamento), Esther Dweck (Gestão) e Fernando Haddad (Fazenda) —este último representado no encontro pelo secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron.

Em entrevista coletiva nesta quarta, o secretário de Orçamento Federal, Paulo Bijos, disse que a reavaliação de receitas e despesas do primeiro bimestre considerou parâmetros vigentes.

Ele citou que a SPE (Secretaria de Política Econômica), vinculada ao Ministério da Fazenda, manteve em sua grade de projeções a previsão de salário mínimo em R$ 1.302 —valor vigente hoje, sem o reajuste adicional.

"Se por ventura houver uma decisão de que esse parâmetro será considerado já no segundo bimestre [cujo relatório é divulgado nos meses de maio], nós consequentemente consideraremos o valor nas nossas projeções", disse o secretário.

Bijos afirmou que a inclusão dos R$ 4,5 bilhões "não afetaria a essência do anúncio", mas não respondeu quando perguntado sobre as razões de o governo não ter adotado uma reserva prudencial para destiná-la futuramente ao reajuste extra do salário mínimo.

"Não há nenhuma mágica envolvida, é simplesmente seguir nossa metodologia", afirmou.

Além da redução do déficit, o governo anunciou a existência de uma folga maior em relação ao teto de gastos (regra que limita o crescimento das despesas à inflação). No início do ano, o espaço disponível era de R$ 3,4 bilhões. Agora, passou a R$ 13,6 bilhões.

A folga cresce quando há redução de despesas —a não incorporação do custo do novo salário mínimo contribuiu justamente nessa direção.

Em tese, o maior espaço no Orçamento permitiria ao governo elevar ainda mais as despesas neste começo de ano. O secretário, no entanto, evitou dar indicações sobre se haverá preenchimento da folga com mais gastos.

"A LOA [Lei Orçamentária Anual] está disponível em sua integralidade para empenho. Se vai haver uma decisão de acréscimo de despesa, é uma decisão do governo. Não há [decisão] da nossa parte, o que estamos indicando é que há esse espaço", disse Bijos, evitando fazer avaliações sobre a prudência ou não de usar a folga disponível.

O governo também incluiu em sua estimativa de resultado primário uma receita de R$ 26 bilhões com o resgate de ativos hoje depositados no Fundo PIS/Pasep, parados há décadas sem que sejam reivindicados por seus beneficiários. O saque desses recursos pelo governo já foi autorizado pelo Congresso por meio da PEC (proposta de emenda à Constituição) da Transição, aprovada no fim de 2022.

No entanto, o Banco Central, órgão responsável pelo cálculo oficial do resultado primário, informou o governo de que tem entendimento contrário: o saque do Fundo PIS/Pasep não configura receita primária. Isso significa que, nas estatísticas oficiais, isso não vai melhorar o resultado das contas.

Na prática, aos olhos do BC, é como se o déficit hoje projetado fosse de pelo menos R$ 133 bilhões.

Bijos disse que a decisão do governo de considerar a receita na redução do rombo tem a ver com o texto da emenda constitucional, que diz que os recursos "serão apropriados pelo Tesouro Nacional como receita primária". "Estamos seguindo o mandamento constitucional", afirmou.

O secretário disse ainda que o governo não pode "de modo algum" interferir no entendimento do BC. "O critério oficial é o do BC. Se houver discrepância, nada impede que isso seja rediscutido", afirmou.

O governo também incorporou um ganho de R$ 82,5 bilhões em receitas de tributos como PIS/Cofins e Imposto de Renda. Outras reavaliações proporcionaram, ao todo, um ganho de R$ 110 bilhões na receita líquida do governo federal.

Do lado das despesas, houve uma redução líquida de R$ 10,6 bilhões na previsão para o ano.

Segundo o Planejamento, os gastos com créditos extraordinários subiram R$ 4,1 bilhões, e as despesas com apoio financeiro a estados e municípios previsto na Lei Aldir Blanc 2, R$ 3 bilhões. Esses impactos foram mais do que compensados por uma redução de R$ 7 bilhões no Bolsa Família e de R$ 5,8 bilhões em benefícios previdenciários.

O governo vem conduzindo uma reavaliação dos cadastros do Bolsa Família, o que tem resultado no desligamento e beneficiários que não preenchem os critérios do programa.

Além disso, o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome começou a pagar só em março o benefício adicional de R$ 150 a crianças de até 6 anos. O não repasse nos meses de janeiro e fevereiro acabou significando uma economia de recursos para o governo.

Em janeiro, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), anunciou uma série de medidas para derrubar o déficit "absurdo" de mais de R$ 220 bilhões. O pacote previa um ajuste potencial de R$ 242,7 bilhões, mas já na época ele reconheceu que algumas ações podem não se confirmar.

Por isso, o ministro tem dito que o objetivo é fechar o ano de 2023 com o déficit de até 1% do PIB (Produto Interno Bruto), equivalente a cerca de R$ 100 bilhões.

No mesmo anúncio, o governo indicou uma previsão de economizar R$ 50 bilhões em despesas, metade com execução menor da LOA e metade com revisão de contratos e programas. O relatório indica que R$ 10,6 bilhões já foram cortados, e há folga no teto de R$ 13,6 bilhões que pode não ser executada, a depender de decisão política.

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