O STF (Supremo Tribunal Federal) retoma nesta quinta-feira (27) o julgamento da revisão do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), que discute a constitucionalidade do uso da TR (Taxa Referencial) na remuneração dinheiro dos trabalhadores.
O pedido é para substituir a taxa por um índice de inflação, que pode ser o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) ou IPCA-E (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - Especial).
Luís Roberto Barroso, relator da ação, já apresentou seu voto, defendendo que o FGTS tenha ao menos a remuneração da poupança. Hoje, o fundo rende 3% ao ano mais TR (Taxa Referencial), que tem ficado próxima de zero. Já a caderneta paga atualmente 6,17% ao ano mais TR (veja simulações aqui).
O ministro, no entanto, limitou a decisão, definindo mudança na correção a partir da publicação da ata de julgamento, deixando para trás os valores retroativos. A ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 5.090 chegou ao Supremo em 2014, após estudo encomendado pela Força Sindical e o partido Solidariedade indicar perdas de 88,3% no FGTS entre 1999 e 2013.
O voto de Barroso foi seguido por André Mendonça, que acrescentou entendimento de que a TR é inconstitucional. A decisão do ministro, porém, divide especialistas. Para alguns, é correto definir mudanças daqui para frente, pois a dívida a ser paga —estimada em R$ 661 bilhões— afetaria toda a sociedade.
Outros apontam que a indicação de apontar a correção da poupança como o mínimo que possa ser aplicado ao FGTS mostra uma vitória, porque traria ganhos melhores do que os atuais. E há ainda quem defenda a inconstitucionalidade da TR, a aplicação de um índice de inflação e o pagamento dos atrasados.
O julgamento ainda não terminou e pode ter uma reviravolta. Faltam votos de ao menos mais seis ministros: Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Kássio Nunes Marques, Cármen Lúcia, Luiz Fux e Edson Fachin.
A ministra Rosa Weber, presidente do Supremo, não é obrigada a votar, mas também pode apresentar seu posicionamento. Com isso, a causa dos trabalhadores ainda não está definida. O caso é o primeiro na pauta do Supremo desta quinta.
Às vésperas da decisão, advogados se mobilizaram em favor de defender a constitucionalidade ou derrubar o uso da TR. Mario Avelino, presidente do Instituto Fundo de Garantia do Trabalhador, encaminhou estudo sobre o assunto ao STF, com diferenças entre a TR e o INPC.
Segundo ele, apesar de Fundo de Garantia ser isento de Imposto de Renda, há perdas ao trabalhador. "Nos últimos anos e com a continuidade da TR como índice de atualização monetária, o trabalhador 'paga um imposto', que é o confisco, pois a TR não repõe as perdas geradas pela inflação", diz.
O que pode acontecer com o julgamento da revisão do FGTS?
O julgamento da revisão do FGTS pode não terminar nesta quinta-feira. Há várias situações que podem ocorrer, dentre elas, algum ministro pedir vista para analisar melhor o caso. Quando isso ocorre, as discussões ficam paradas e não há prazo para nova análise. Neste caso, a corte dependerá da devolução do processo para, só depois, a presidência marcar novo julgamento.
Além disso, pode ser que sejam apresentados novos votos e, se forem longos, não haver tempo hábil para a conclusão do caso durante a sessão desta quinta. A decisão, que está favorável aos trabalhadores, também pode se reverter. É possível que algum ministro abra divergência ao que foi dito pelo relator e sua tese contrária seja aprovada, trazendo perda da ação.
Outra hipótese é que a maioria dos ministros votem com o relator e a remuneração do FGTS seja julgada inconstitucional, com mudança futura para o modelo de atualização da poupança. Isso não significa, porém, que a correção do dinheiro do Fundo de Garantia será imediata.
A advogada Tonia Galetti, coordenadora do departamento jurídico do Sindnapi (Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos), diz ainda que, mesmo que o julgamento chegue ao final, ainda há a possibilidade de embargos de declaração —pedido de esclarecimento de algum ponto da sentença—, o que levaria mais tempo para que a ADI tenha o trânsito em julgado.
"É possível que os ministros decidam, mas ainda cabem embargos de declaração. Nada que possa mudar o julgamento, mas que pode protelar a decisão. Se houver a finalização do julgamento, é possível que o Supremo diga que os processos possam voltar a caminhar para que haja o ganho efetivo de causa."
Dinheiro não poderá ser sacado
Mesmo que o Supremo defina nova correção ao FGTS, o dinheiro parado no fundo só pode ser sacado em situações específicas, conforme a lei, como aposentadoria, compra da casa própria, demissão sem justa causa ou doença grave.
Em 2019, foi acrescentada mais uma situação, que é o saque-aniversário. No entanto, quem opta por essa modalidade não pode fazer o saque-rescisão ao sair do emprego. Vejas 16 situações:
- Demissão sem justa causa
- Fim do contrato temporário
- Compra ou construção da casa própria
- Amortização de parcelas da casa própria
- No mês de aniversário para quem optou pelo saque-aniversário
- Rescisão do contrato por falência ou morte de empregador individual, empregador doméstico ou nulidade do contrato
- Rescisão do contrato por culpa recíproca ou força maior
- Aposentadoria
- Desastre natural, inundações e situações de emergência
- Suspensão do trabalho avulso
- Morte do trabalhador
- Idade igual ou superior a 70 anos
- Trabalhador ou dependente portador de HIV
- Trabalhador ou dependente com câncer
- Trabalhador ou dependente com doença grave ou em estágio terminal por doença grave
- Se ficar por três anos seguidos fora do regime do FGTS
ENTENDA A REVISÃO DO FGTS
A revisão do FGTS é uma ação judicial na qual se questiona a constitucionalidade da correção do dinheiro depositado no Fundo de Garantia. O pedido é para que a TR, usada como índice de correção, seja substituída por um índice de inflação, como INPC ou IPCA-E. O caso chegou ao Supremo em 2014, após o partido Solidariedade ingressar com uma ADI.
POR QUE SE QUESTIONA A CORREÇÃO DO DINHEIRO?
A TR tem rendimento muito baixo, próximo de zero, fazendo com que os trabalhadores não consigam repor seu poder de compra com o saldo do dinheiro do FGTS. Diversos cálculos apontam perdas que vão de 24% nos últimos dez anos a até 194% para quem tem valores no fundo desde 1999.
Em 2014, data do início da ação, estudo da Força Sindical mostrou que um trabalhador que tinha R$ 1.000 no ano de 1999 no Fundo de Garantia tinha, em 2013, R$ 1.340,47. Se fosse considerada a inflação medida pelo INPC, usado na correção de salários, o valor deveria ser de R$ 2.586,44, uma diferença de R$ 1.245,97.
Na defesa da correção maior, especialistas alegam que o dinheiro do FGTS é renda proveniente do salário e não pode trazer perdas, pois não se trata de um investimento.
QUAIS OS PRÓXIMOS PASSOS DA REVISÃO DO FGTS?
Agora, os trabalhadores devem esperar novos votos dos ministros e o final do julgamento. Além disso, após a decisão, se a revisão for realmente aprovada, poderá haver embargos de declaração, que é um pedido para esclarecer algum ponto da decisão.
QUEM TEM DIREITO À REVISÃO?
Trabalhadores com dinheiro no fundo desde 1999 podem ter direito à correção maior. Segundo a Caixa, há 117 milhões de contas do Fundo de Garantia entre ativas e inativas.
Especialistas calculam que ao menos 70 milhões de trabalhadores podem ser beneficiados. É possível que um trabalhador tenha mais de uma conta, aberta a cada novo emprego com carteira assinada.
A expectativa é que todos tenham novos depósitos corrigidos pela nova regra a partir de então. Para definir questões como o pagamento de valores de anos anteriores, por exemplo, o STF terá de modular o tema.
O QUE É E COMO FUNCIONA O FGTS?
O FGTS funciona como uma poupança para o trabalhador. O fundo foi criado em 1966, com o fim da estabilidade no emprego, e passou a valer a partir de 1967. Todo mês o empregador deposita 8% sobre o salário do funcionário em uma conta aberta para aquele emprego.
Há ainda a multa de 40% sobre o FGTS caso o trabalhador seja demitido sem justa causa. Desde a reforma trabalhista de 2017, há também a possibilidade de sacar 20% da multa após acordo com o empregador na demissão.
Fux não apresenta voto, mas defende correção pela inflação
O ministro Luiz Fux pediu para que Nunes Marques considere, durante sua análise, o direito de propriedade do trabalhador, não levando em conta só as despesas para o poder público.
"Toda apropriação deve preceder uma justa indenização", afirmou, em concordância com as observações feitas por Barroso nesta quinta-feira.
"Estamos discutindo a recomposição do poder de compra do trabalhador. O FGTS visa atender o trabalhador quando se desfaz o vínculo empregatício", afirmou.
Para Fux, nada impede reajuste por um índice que efetivamente representa o poder de compra do trabalhador.
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