Descrição de chapéu indústria petrobras

Resta saber se Petrobras vai usar nova regra de forma sábia ou política, diz Wongtschowski

Para empresário do grupo Ultra, objetivo deve ser o de equilibrar volatilidades de preço no mercado doméstico

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São Paulo

O empresário Pedro Wongtschowski, acionista do grupo Ultra, dono das marcas Ipiranga, Ultragaz e Ultracargo, diz ter feito uma leitura positiva do futuro após o fim do PPI (preço de paridade de importação) na Petrobras.

Ele afirma acreditar que o objetivo da estatal ao abandonar o modelo não é usar a nova regra para segurar altas de preços por interesse político, e sim equilibrar as volatilidades.

"Resta ver se eles vão aplicar isso com sabedoria ou se vão aplicar com alguma intenção política. Na minha expectativa, a Petrobras, com o seu grau de profissionalismo no conselho, diretoria etc, vai aplicar sabiamente", diz.

O empresário Pedro Wongtschowski, presidente do conselho superior de Inovação e Competitividade da Fiesp - Gabriel Cabral - 12.nov.2018/Folhapress

O empresário, que deixou a presidência do conselho de administração do Ultra no mês passado e lidera o conselho superior de inovação e competitividade da Fiesp, é hoje um dos principais porta-vozes de uma série de sugestões da indústria, já levadas ao governo Lula, para fomentar o financiamento de longo prazo com foco no BNDES.

A lista inclui propostas defendidas pelo presidente do banco, Aloizio Mercadante, como a ideia de zerar a incidência de IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) nos financiamentos da instituição e reduzir o pagamento de dividendos na tentativa de elevar a capacidade de concessão de crédito, com contrapartidas como a proibição de financiamento direto do Tesouro ao BNDES.

Embora represente renúncia fiscal para o governo, o empresário defende as medidas como prioritárias.

"Se você quer um programa ambicioso e agressivo de modernização da indústria, de fomentar inovação, exportação, de atender as pequenas e médias empresas, você vai precisar de dinheiro também. Trata-se, em última análise, de uma definição de prioridades", afirma.

A Fiesp enviou ao governo uma série de propostas para fomentar investimento. Quais são as ideias? Elas passam pela defesa da volta de subsídio? Estudamos alguns temas horizontais que afetam os setores da indústria, inovação, manufatura avançada, BNDES e mercado de capitais. E as cadeias críticas de fornecimento, como alimentos, defesa, energia e saúde. O foco é produtividade, competitividade e crescimento da indústria nacional. Em cada um desses tópicos, temos sugestões.

Em inovação, por exemplo, a sugestão central estava no restabelecimento do FNDCT [Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, administrado pela Finep], que são R$ 10 bilhões por ano, aproximadamente, e que, como é sabido, estava sendo contingenciado. O problema foi resolvido e ele está disponível para aplicação em ciência e tecnologia e inovação. Para padrões brasileiros, é um bocado de dinheiro.

A gente defende, também nessa área de inovação, uma certa concentração, e pelo menos um pedaço do dinheiro ser aplicado de maneira concentrada em um número pequeno de grandes projetos que tenham alcance, para não deixar esse dinheiro virar milhares de projetinhos que podem ter relevância para a universidade, mas não tenham necessariamente relevância nacional. Então, separar parte desse dinheiro para projetos grandes de longo prazo e que tenham impacto nas questões nacionais, econômicas, ambientais, sociais, tecnológicas e industriais.

E o BNDES? Nós pegamos cada um desses temas. Por exemplo, no BNDES, o que diz o nosso documento, basicamente, é que a TLP [Taxa de Longo Prazo] não é uma taxa adequada de juros para financiamento de longo prazo, porque ela é extremamente volátil, incerta, além de ser muito alta. Ela é muito acima da Selic na maior parte do tempo.

A TLP tem que ser substituída por uma taxa mais previsível, mais estável e menor. A gente não defende nenhuma fórmula específica.

E a questão do IOF nos financiamentos do BNDES? A gente propõe que o IOF seja excluído do custo dos financiamentos do BNDES.

Mas isso não gera renúncia fiscal? O IOF não era cobrado até 2015. Ao que me consta, CRIs [Certificados de Recebíveis Imobiliários], CRAs [do agronegócio] etc também não pagam IOF.

A expectativa é que o BNDES se concentre em financiar inovação, infraestrutura, modernização do parque industrial brasileiro, especialmente na linha da descarbonização e da digitalização. E exportação, que obviamente é central, e financiamento para pequenas e médias empresas, porque nos últimos anos já se desenvolveram mercados privados para os outros setores. Os grandes projetos industriais hoje têm uma possibilidade de financiamento razoável no mercado.

Então, o BNDES pode sair um pouco desses setores e se concentrar nessas questões mais gerais.

Esse foco nas pequenas e médias pelo potencial de inovação, na sua opinião, afasta o risco de cair na polêmica dos campeões nacionais? Não quero me referir a essa figura que foi criada no passado. Eu acho que as grandes empresas brasileiras, hoje, em grande parte, são internacionalizadas, com operações fora do Brasil. E mesmo quando não são, elas têm acesso ao mercado internacional e ao mercado doméstico.

Desenvolveu-se um grande mercado de debêntures no Brasil, por exemplo, de títulos de dívida. E o mercado externo está absolutamente disponível para as empresas brasileiras. Isso inclui um risco de câmbio, evidentemente, mas as empresas que têm grandes exportações ou produtos indexados em dólar, que é o caso das grandes commodities todas, têm uma espécie de hedge natural para esse tipo de financiamento.

Então, o BNDES se concentrando nesses setores que eu mencionei, acho que faz mais sentido e é onde existe uma demanda.

É um pouco nesta linha que nós pegamos cada um destes setores, alimentos, defesa, energia, saúde etc, e fizemos recomendações. É um documento valioso. O Josué [Gomes, presidente da Fiesp] e eu tivemos o prazer de entregar em mãos esse conjunto de documentos para o ministro da Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, que ficou muito interessado, e eu espero que seja usado como base para a definição da política industrial do governo Lula.

E a discussão sobre limitar os dividendos do BNDES para retornar para financiamento? Nós fizemos uma recomendação de que o BNDES distribuísse 25% de seu lucro na forma de dividendo, que é a definição do estatuto. E é o que faz a maioria das empresas brasileiras justamente para reter recursos na companhia para fazer investimentos. Para o BNDES, se aplica a mesma coisa. No governo anterior, havia, acho, que um exagero de demanda de investimentos para cobrir o déficit público.

Acho que, agora, essas instituições como o BNDES têm que permitir que apliquem seus recursos, inclusive uma parte do seu lucro, nos seus objetivos fins.

Isso não faria falta ao governo em um momento como o atual? Se você quer um programa ambicioso e agressivo de modernização da indústria, de fomentar inovação, exportação, de atender as pequenas e médias empresas, você vai precisar de dinheiro também. Se trata, em última análise, de uma definição de prioridades. Eu acho que se o dinheiro ficar no BNDES, ele vai ser muito bem aplicado.

Sobre a Petrobras, o que o sr. achou do fim do PPI? Abre espaço para intervenção política? Achei a definição muito vaga e me pareceu que ela é propositadamente vaga. Ela deixa um grau de arbítrio para a administração da Petrobras fixar os preços, que ela não tinha antes, já que estava rigidamente presa ao modelo de paridade de preços internacional.

Eu acho que esse modelo anterior era bom em si. A paridade me parecia sempre um princípio razoável. Agora, eles deveriam ter adotado algum tipo de média móvel, de tal maneira a não transferir a volatilidade enorme do preço do petróleo, dos derivados e do câmbio ao mercado doméstico.

Então, eu acredito que, ao final, o que a Petrobras vai fazer, talvez sem explicitar, é manter uma política muito próxima da paridade de preços internacionais, no entanto, sem uma transferência imediata da volatilidade dos preços do mercado internacional ao mercado brasileiro.

Isso significa que ela vai poder segurar as altas de preço quando for interessante politicamente? Em tese sim. Mas eu tenho a expectativa de que o objetivo não seja esse. O objetivo é justamente não transferir uma enorme volatilidade, que é da natureza do preço do petróleo e do câmbio, imediatamente ao mercado doméstico, sujeito a solavancos para cima e para baixo.

Lembre-se de que houve tempos em que o preço variava a cada dois ou três dias. Isso desorganiza toda a cadeia. Imagine um dono de posto recebendo cada carga com um preço diferente. Criava um nível de complexidade muito grande no sistema.

A minha expectativa é a de que essa nova política visa manter, sem dizê-lo explicitamente, uma política de paridade de preços internacionais, no entanto, atenuada com o grau de liberdade que a Petrobras não tinha antes e passou a ter agora. A minha leitura é positiva.

Não vai atrapalhar a referência dos preços no país? Resta ver se eles vão aplicar isso com sabedoria ou se vão aplicar com alguma intenção política. Na minha expectativa, a Petrobras, com o seu grau de profissionalismo no conselho, diretoria etc, vai aplicar sabiamente, justamente com esse objetivo de manter a paridade, mas atenuada, para não transferir a volatilidade externa ao mercado doméstico.

O sr. sentiu que a mensagem da Petrobras veio diferente, com um pedido para que a cadeia, de postos e distribuidoras, repasse a redução nos preços ao consumidor? Eu não entendi assim. O Brasil tem mais de 200 distribuidoras de combustíveis, 40 mil postos, é quase uma concorrência perfeita.

O mercado se movimenta não só em função do movimento de preços da Petrobras, mas também da parcela que é importada. Alguma coisa entre 20% e 30% dos combustíveis continuarão sendo importados porque a demanda é maior do que a oferta da Petrobras. Então, esses dois fatores influenciam a dinâmica de preços.

Agora, a Petrobras adotando uma política mais cautelosa justamente nesse sentido de atenuar volatilidade excessiva, eu acho que é bom para o mercado. Traz um pouco mais de previsibilidade, estabilidade para o mercado. Acho bom.


Raio-X | Pedro Wongtschowski

Formado engenheiro químico, com mestrado e doutorado pela USP, Wongtschowski se tornou diretor da Ultrapar em 1985 e foi CEO da empresa entre 2007 e 2012. No mês passado, deixou a presidência do conselho de administração da companhia. Atualmente, é presidente do conselho superior de Inovação e Competitividade da Fiesp

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