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Livro investiga as 6 matérias-primas 'invisíveis' que moldam o mundo

Escritor Ed Conway analisa minas e pedreiras por trás da economia 'etérea' de tecnologia e serviços

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John Gapper
Financial Times

No romance "Nostromo" (1904), de Joseph Conrad, Charles Gould, o proprietário britânico de uma mina de prata latino-americana, torna-se perigosamente dependente de seu tesouro. "[Ele] tinha engolido a pílula, e era como se ela fosse composta de algum veneno sutil que agisse diretamente em seu cérebro. Ele ficou imediatamente dominado por minas."

A história não acaba bem para Gould, mas seu destino costumava parecer limitado à ficção. Histórias de exploração de minerais como prata, cobre e ferro pareciam mais relíquias do passado do que partes fundamentais da economia moderna. Na era dos serviços e da tecnologia —que Ed Conway chama de "o mundo etéreo"—, essas eram matérias-primas comuns que podiam ser facilmente compradas nos mercados globais.

Mas, como Conway, o editor de economia da Sky News, aponta em "Material World" [Mundo material], hoje estamos todos dominados pelas minas. Novos recursos são necessários para produzir computadores, construir casas e escritórios e fabricar motores de combustão interna e carros elétricos. "Longe de sermos independentes do mundo físico ao nosso redor, nunca dependemos tanto dele."

Mina de lítio no Chile; mineral é usada em baterias - Martin Bernetti - 12.set.2022/AFP

Os fabricantes de baterias e as empresas que eles abastecem estão competindo para garantir o acesso ao lítio para baterias. A China e o Ocidente estão numa disputa global pelo controle dos chips de silício em milhões de dispositivos. O fracking para obtenção de gás natural deu independência energética aos Estados Unidos, enquanto a Rússia usou seus combustíveis fósseis para chantagear os países europeus.

Ninguém poderia acusar Conway de não ter alcance global em sua análise de seis materiais da nova economia. Ele cruza o mundo até muitas minas e pedreiras, bem como fábricas de alta tecnologia que precisam do que elas produzem, para chegar a uma verdade estranha. Ainda vivemos num mundo material e dependemos de perfuratrizes e explosivos para alimentá-lo.

Seus materiais são areia (para concreto), sal (fertilizante), ferro (e aço), cobre (fios elétricos), petróleo e lítio. Pode-se questionar sobre os seis –e quanto ao cobalto, níquel ou platina?–, mas eles são suficientes para afirmar a tese. Também permitiram que ele desenterrasse casos fascinantes da história.

Ele registra que um dos primeiros confrontos navais da Primeira Guerra Mundial ocorreu na costa do Pacífico do Chile, enquanto a Alemanha e a Grã-Bretanha lutavam pelo controle dos nitratos necessários para os explosivos. Mais tarde, apesar da obsessão de Mao Tse-Tung pela produção de aço na década de 1950, a China não conseguia produzir uma caneta esferográfica de aço de alta qualidade em 2015, como reclamou seu primeiro-ministro Li Keqiang.

Às vezes, em sua jornada, enquanto Conway descreve uma mina profunda ou fornalha ruidosa, sinto falta de fotos ou até de vídeos. Afinal, ele é um repórter de televisão. Faz uma boa descrição de Chuquicamata, uma vasta mina de cobre no Chile, mas achei mais fácil procurar online por sua reportagem na Sky News do ano passado e assistir à gravação.

Ele mostra lucidamente a escala do problema ambiental e a ironia da nova demanda criada pelos esforços para nos livrarmos do petróleo e investirmos em baterias. Entretanto, sem cobre e fibra ótica, "não haveria data centers, nem eletricidade". Em 2019, mais materiais foram extraídos do que em todos os anos até 1950.

A conclusão óbvia é que os vencedores do futuro serão os países que possuem ou controlam o maior número de ativos minerais: eles poderão fabricar mais carros e chips de computador com o menor custo. O foco incansável da China para garantir matérias-primas da África por meio de sua iniciativa Nova Rota da Seda recompensou em lítio.

Mas não é tão simples. Você também precisa ser capaz de fazer os wafers de silício certos e gravá-los com as máquinas mais sofisticadas, fabricadas pela ASML da Holanda. Os EUA estão prejudicando a China ao bloquear o acesso a essas ferramentas, e a fabricante de chips TSMC ("uma empresa que personifica o mundo material") fica em Taiwan.

A história de "Nostromo", com sua corrupção, violência e grande rivalidade de poder, ainda ressoa. A diferença é que a concorrência agora chega ao topo da cadeia de suprimentos, por metais e minerais. Enquanto não houver alternativa, o meio ambiente continuará sendo explorado e a terra, minerada.

Traffic: Genius, Rivalry, and Delusion in the Billion-Dollar Race to Go Viral

  • Quando mai.23
  • Autoria Ben Smith
  • Editora Penguin; 352 p.p.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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