Descrição de chapéu Banco Central greve

Servidores do BC aumentam pressão com início de operação-padrão

Há dez anos sem concursos públicos, autoridade monetária está com quase metade dos cargos vagos

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Brasília

Sem avanço nas tratativas com o governo Lula (PT) e há dez anos sem novos concursos públicos, os servidores do Banco Central deram início nesta segunda-feira (3) a uma operação-padrão, com a promessa de maior lentidão na prestação de serviços e paralisações parciais diárias.

A mobilização com prazo indeterminado inclui em um primeiro momento a possibilidade de atrasos ou entregas incompletas, bem como cancelamento de reuniões e eventos externos. De acordo com o Sinal (Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central), a adesão inicial foi de cerca de 50% do corpo funcional da autoridade monetária.

Os funcionários da instituição reivindicam medidas de reestruturação de carreira e a criação de um bônus de produtividade semelhante à gratificação que foi regulamentada para os auditores fiscais da Receita Federal. Eles reclamam da falta de isonomia entre as carreiras de Estado e cobram uma equiparação de tratamento.

Fachada da sede do Banco Central em Brasília - Gabriela Biló - 14.abr.23/Folhapress

"É inaceitável o descaso dado pelo atual Ministério da Gestão e Inovação, o qual está com o projeto de reestruturação de carreira do BC parado há seis meses", diz Fábio Faiad, presidente do Sinal, em nota.

Procurado, o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos disse que vai assinar no próximo dia 11 com representantes sindicais o protocolo de funcionamento da mesa permanente de negociação com os servidores. "A partir de então, haverá um calendário de diálogo com os servidores por meio da Secretaria de Relações do Trabalho", afirmou a pasta.

O BC, por sua vez, disse que não iria comentar o assunto quando foi questionado sobre os potenciais impactos da operação-padrão dos servidores sobre as atividades rotineiras da autarquia.

Na última quinta-feira (29), o presidente do BC, Roberto Campos Neto, afirmou que a instituição passa por um "momento difícil". "A gente tem funcionários saindo todo ano, está há muito tempo sem concurso, algumas áreas estão estranguladas", disse.

"A gente vê que tiveram algumas iniciativas para a Receita Federal, isso sempre gera insatisfação porque o BC está pedindo melhorias há bastante tempo. A gente entende que é importante manter o corpo do BC funcionando, trabalhando, e fazendo as entregas com o afinco que tem feito, mas com satisfação", acrescentou.

No ano passado, os funcionários cruzaram os braços durante cerca de três meses, quando o então presidente Jair Bolsonaro (PL) queria dar reajuste apenas a policiais –o que acabou não se concretizando.

Campos Neto diz ter conversado com a ministra Esther Dweck (Gestão) algumas vezes e ressalta que uma parcela das demandas é não pecuniária, ou seja, não tem impacto orçamentário imediato.

Diogo Guillen, diretor de Política Econômica do BC, lembra que já são dez anos sem novos concursos para a autoridade monetária, enquanto se veem profissionais deixando a instituição para trabalhar em outros órgãos do governo ou em empresas do setor privado.

Segundo dados de maio, o BC conta com quase metade de cargos vagos, sendo 3.350 servidores na ativa e 3.120 vagas desocupadas. Apesar disso, a autoridade monetária não foi contemplada no pacote de novos concursos públicos anunciado pelo governo Lula em 16 de junho. Ao todo, serão 4.436 vagas, divididas em 20 órgãos ligados a 14 ministérios.

Segundo Dweck, os quantitativos foram decididos com base em critérios como número de cargos vagos, aposentadorias projetadas para os próximos anos, estrutura do órgão (se ganhou ou perdeu atribuições) e impacto na prestação de serviços à população.

A manifestação dos funcionários tem ganhado respaldo de diretores e chefes de departamento do BC, que vêm se manifestando publicamente em uma ação coordenada.

Fernando Rocha, chefe do departamento de Estatísticas do BC, falou em mais de uma ocasião sobre o "verdadeiro desmonte" da instituição nos últimos anos, argumentando que o quadro de funcionários está "chegando perigosamente perto do seu limite".

"Temos uma crescente e inaceitável assimetria remuneratória", disse Rocha antes de apresentar as estatísticas de crédito em 28 de junho. "Esse tratamento é desigual e injusto e precisa ser corrigido o mais rápido possível."

"O BC está no limite de suas capacidades de entregas para a sociedade, mesmo assim vem assumindo novas atribuições a cada dia enquanto perde servidores de forma constante e sem reposição", acrescentou.

Dias antes, ele havia jogado luz sobre as equipes reduzidas que ficam encarregadas do boletim Focus, que coleta as projeções do mercado financeiro e serve de subsídio para a atuação do Copom (Comitê de Política Monetária), e de outras bases de dados.

Diante desse quadro, Rocha pediu que as autoridades "olhem com bastante atenção" para os riscos e "ajam prontamente" para correção das assimetrias e para a recomposição dos quadros do BC.

Para Mauricio Moura, diretor de Relacionamento, Cidadania e Supervisão de Conduta, a mobilização coletiva se trata da valorização da carreira dos funcionários do BC.

Ele ressalta que as atribuições do órgão têm crescido e muitas entregas foram feitas nos últimos tempos, como o Pix e o SVR (Sistema Valores a Receber).

"Se a gente perde nossos talentos para outras carreiras dos serviços públicos por conta de assimetria, ou se não atrairmos esse tipo de pessoa nos próximos concursos, a produtividade do BC vai cair, vai ser prejudicada. Quem vai perder no final é o cidadão", disse ele durante live semanal da autarquia que, no dia 19, discutia formas de se proteger de golpes de fraudes.

Otavio Damaso, diretor de Regulação, também usou o canal para se expressar publicamente sobre o tema. Ao falar sobre o Open Finance na live do dia 26, ele exaltou o "trabalho muito árduo" do BC ao longo das últimas décadas.

"Mais recentemente, o corpo funcional do BC tem se sentido um pouco desmotivado, principalmente pela ampliação da assimetria salarial com outras carreiras do funcionalismo público", afirmou.

Durante as transmissões ao vivo, os funcionários se manifestaram pelo chat com as hashtags #valorizaBC #RPBCJá, reivindicando a criação do bônus de retribuição por produtividade.

Alguns citavam também falta de motivação, sentimento de desprestígio, clima interno deteriorado e a necessidade de discutir valorização de carreira.

Os servidores do BC compõem a elite do funcionalismo público. Os salários dos analistas, com exigência de nível superior, variam de R$ 20.924,80 a R$ 29.832,94, sem bônus. Já os técnicos, com nível médio, recebem por mês de R$ 7.938,81 a R$ 13.640,89. Neste ano, o governo concedeu a partir de maio um reajuste linear de 9% para servidores públicos federais.

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