Descrição de chapéu Banco Central Selic juros

Intensidade do primeiro corte de juros deve dividir Copom em estreia de indicados por Lula

Economistas esperam divergência nos votos entre redução de 0,25 ou de 0,5 ponto percentual na Selic

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Brasília

O Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central deve dar início nesta quarta-feira (2) ao ciclo de cortes de juros após ter mantido durante um ano a taxa básica (Selic) inalterada no patamar de 13,75%. A intensidade do primeiro movimento –redução de 0,25 ou de 0,5 ponto percentual– tende a ser motivo de divergência entre os membros do colegiado.

A divisão do grupo, que já havia sido esboçada na ata da reunião de junho, deve ganhar um novo impulso com a chegada dos primeiros diretores indicados pelo governo Lula (PT) –Gabriel Galípolo (Política Monetária) e Ailton Aquino (Fiscalização).

Enquanto a gestão petista pressiona por uma queda mais acentuada dos juros, em meio ao avanço da pauta econômica no Congresso Nacional e à melhora da nota de crédito do Brasil pela Fitch, o Copom vinha até então defendendo "parcimônia" e "cautela" na condução da política monetária.

Fachada da sede do Banco Central, em Brasília - Gabriela Biló - 14.abr.2023/Folhapress

Alberto Ramos, diretor de pesquisa macroeconômica do Goldman Sachs para América Latina, diz que provavelmente haverá uma "decisão dividida", mas que o BC tende a começar o ciclo de afrouxamento monetário com um corte de 0,25 ponto percentual, levando a Selic a 13,50% ao ano.

O economista projeta que, se o Copom optar de fato por esse movimento mais suave, deixará aberta a possibilidade de acelerar o ritmo de cortes. No entanto, caso a queda inicial seja de 0,50 ponto percentual, o comitê pode sinalizar a manutenção dessa mesma magnitude no próximo encontro, em setembro.

"O que se quer é não queimar a largada, porque isso pode ter depois consequências para frente", diz. "Se o primeiro passo for sólido, ele [BC] pode eventualmente ir mais longe no processo de distensão monetária."

Além da sinalização dada pelo Copom no último encontro, ele considera que os dados ainda justificam alguma cautela e vê riscos inflacionários à frente.

Ramos ressalta que as expectativas de inflação para 2025 e 2026 estacionaram em 3,5% –acima do centro da meta de 3%– depois de uma melhora impulsionada pela definição do CMN (Conselho Monetário Nacional) pela manutenção do objetivo de 3%, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos, no modelo de alvo contínuo.

Para o economista, isso pode refletir uma visão do mercado de que o governo está inclinado a ser mais tolerante a uma inflação mais elevada e um entendimento que as mudanças na composição do Copom possam torná-lo mais permissivo.

De junho para cá, segundo o boletim Focus, a projeção para o IPCA deste ano foi revisada de 5,12% para 4,84%. Para o ano que vem, a expectativa caiu de 4% para 3,89%. Para 2025, a estimativa dos economistas baixou para 3,5%, ante 3,8%.

Ramos também cita potencial impacto do El Niño (fenômeno de aquecimento das águas do Pacífico), a defasagem dos preços de combustíveis em relação aos valores internacionais, a inflação de serviços pressionada e a atividade econômica resiliente, além de uma "certa deterioração" da política fiscal.

O corte de 0,25 ponto percentual também é a aposta do Itaú Unibanco, mesmo que a curva de juros do mercado financeiro já contemple a possibilidade de um movimento mais intenso.

A economista Julia Gottlieb argumenta que a dinâmica de núcleos –que medem o comportamento dos preços desconsiderando ou reduzindo o peso de fatores temporários sobre os índices– e expectativas de inflação ainda estão acima da meta. Diz também que a atividade econômica e o mercado de trabalho continuam resilientes e aquecidos.

"Pode ter alguma divergência [entre os membros do Copom], mas o ponto principal é olhar o que a conjuntura econômica prescreve em termos de política monetária", afirma.

Um estudo do banco obtido pela Folha, assinado por Gottlieb e Julia Passabom, mostra que ciclos anteriores que começaram com cautela foram bem-sucedidos em levar a inflação para perto da meta, possibilitando um equilíbrio final de juros mais baixos por mais tempo.

No estudo, o Itaú analisou cinco episódios de cortes de juros. Em duas ocasiões (2005 e 2016), o BC iniciou o afrouxamento monetário com corte de 0,25 ponto percentual e uma vez (2009) em ritmo mais intenso, de 1 ponto percentual. Nos anos de 2011 e 2019, o ciclo teve início com cortes de 0,50 ponto percentual.

"Esse [corte] de ritmo mais intenso foi em um contexto de crise global, de 2008, houve uma redução coordenada de juros globais porque teve uma contração muito forte da atividade econômica em todo o mundo. Então, o início dele não é 100% comparável porque foi uma situação atípica, o mundo estava em crise", pondera. "A comparação é menos justa."

De acordo com o relatório, cortes de juros mais agressivos já na largada podem levar a uma eventual depreciação cambial. "O real tende a se desvalorizar após o primeiro corte de juros do Copom. Um início de corte mais cauteloso pode atenuar esse efeito", diz o texto.

Outro potencial reflexo seria uma eventual piora nas expectativas dos agentes do mercado financeiro –o que poderia até interromper o processo de desinflação em curso.

Diferentemente de reuniões anteriores, dessa vez não há unanimidade no mercado financeiro.

Rafaela Vitória, economista-chefe do banco Inter, argumenta que o BC já esperou tempo demais para começar a cortar os juros e chega nesse momento com espaço suficiente para ser mais agressivo no primeiro movimento. Ela cita a desaceleração do crédito e arrefecimento da inflação corrente e de núcleos.

Sinalizando uma tendência para os preços, o IPCA-15 (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15) teve queda de 0,07% em julho, com recuo dos preços de energia elétrica e alimentos. O índice oficial de inflação do Brasil (IPCA) será conhecido apenas no dia 11 de agosto.

Apesar da melhora na conjuntura econômica, Vitória não descarta que a autoridade monetária opte por ser mais conservadora, caso queira ser mais "literal" na tentativa de trazer as expectativas do mercado em direção às metas de inflação e busque colocar freio nas projeções à frente.

"Se vier um corte de 0,25 [p.p.] não será uma grande surpresa. Existe uma divisão nessa leitura do cenário atual. Vejo 60% de chance em um corte de 0,50 p.p. e 40% de chance de um corte de 0,25 p.p..", afirma.

"Não vai ser uma decisão consensual, nossa aposta é de [corte de] 0,50 [ponto percentual], mas a gente espera que tenham inclusive votos por [corte de] 0,25 [p.p.]", acrescenta.

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