Descrição de chapéu Financial Times mudança climática

Aquisições de Chevron e Exxon mostram 'corrida armamentista' por petróleo

Petrolíferas compram concorrentes em acordos bilionários, enquanto o mundo discute a descarbonização

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Londres, Nova York e Houston (EUA) | Financial Times

As duas maiores empresas de petróleo dos Estados Unidos iniciaram uma corrida para garantir reservas de petróleo para as próximas décadas, fechando transações multibilionárias para adquirir locais de produção promissores, apesar das previsões de que a demanda atingirá o pico até 2030.

A Chevron anunciou na segunda-feira (23) sua maior aquisição de todos os tempos: um acordo de US$ 53 bilhões com a operadora americana Hess, dando-lhe uma posição na produção de petróleo na costa da Guiana, a descoberta mais significativa da indústria na última década.

O acordo foi fechado menos de duas semanas depois que a ExxonMobil, a outra gigante americana do setor, revelou uma aquisição de US$ 60 bilhões da Pioneer Natural Resources, a maior operadora do campo de petróleo mais prolífico do mundo, a Bacia do Permiano, no Texas e Novo México (ambos nos EUA).

Petróleo é extraído na Bacia de Permiano, nos Estados Unidos, local que foi adquirido pela Exxon
Petróleo é extraído na Bacia de Permiano, nos Estados Unidos, local que foi adquirido pela Exxon - Paul Ratje - 24.abr.2020 / AFP

Os dois acordos estão em uma escala raramente vista desde as megafusões do final dos anos 1990 e início dos anos 2000 —BP-Amoco, Exxon-Mobil e Chevron-Texaco— que formaram as gigantes modernas. Analistas e negociadores de acordos dizem que mais fusões provavelmente ocorrerão em breve, à medida que outras empresas busquem ganhar importância e garantir os melhores locais de perfuração restantes na tentativa de produzir barris com o menor custo.

É uma aposta na longevidade da demanda por combustíveis fósseis em um momento em que órgãos como a AIE (Agência Internacional de Energia) preveem que a demanda atingirá o pico antes de 2030.

"Vivemos no mundo real e temos que alocar capital para atender às demandas do mundo real", avaliou o CEO da Chevron, Mike Wirth, em uma entrevista recente ao Financial Times, prevendo que a demanda por petróleo "continuará a crescer até 2030 e além".

Em todo o mundo, foram anunciados US$ 254 bilhões em acordos de fusões e aquisições no setor de petróleo e gás neste ano, de acordo com a LSEG, o maior total até o momento desde 2014.

"É uma corrida armamentista", disse um negociador de acordos envolvido na recente onda de fusões da área. "Na maioria dos setores, o acordo um não necessariamente leva ao acordo dois e ao acordo três. Acredito que, neste caso, levará, porque o tempo é essencial e os dois maiores jogadores já fizeram suas aquisições".

Analistas afirmam que uma das fusões mais atraentes poderá ser entre BP e Shell, embora tenham alertado que vários obstáculos se colocam no caminho de qualquer acordo desse tipo e que não têm conhecimento de tais discussões. Grandes produtores independentes em regiões abundantes de xisto nos Estados Unidos também podem buscar a combinação ou aquisição de concorrentes menores.

A BP e a Shell, com sede no Reino Unido, reclamaram que suas avaliações ficaram para trás em relação à Exxon e Chevron, acreditando que isso se deve em parte à maior pressão sobre as empresas de energia na Europa para adotar a transição para energia limpa— incluindo suas incertezas.

As gigantes petrolíferas dos EUA adotaram uma postura mais agressiva em relação à produção futura de petróleo, apesar dos crescentes esforços para descarbonizar a economia global. Nem a Exxon nem a Chevron migraram para energias renováveis, como eólica e solar, preferindo "moléculas em vez de elétrons", nas palavras de Wirth. Isso contrasta com seus concorrentes europeus, cujo impulso verde pode dificultar um acordo significativo de petróleo.

"As grandes empresas europeias traçaram um caminho muito diferente quando se trata do futuro da demanda por petróleo, então seria uma grande mudança para a BP ou a Shell fazerem um grande acordo de petróleo e gás agora", avaliou Alex Beeker, analista da Wood Mackenzie.

No entanto, um analista de um banco de investimento com sede em Londres, que pediu para não ser identificado, disse que a BP e a Shell correm o risco de ficarem para trás.

"Já havia uma lacuna de avaliação [em relação às gigantes dos EUA], mas com esses acordos recentes, a lacuna de produção também está se tornando mais evidente, o que aumentará a pressão sobre as duas empresas para encontrar uma solução", disse o analista.

Combustíveis fósseis x descarbonização

Mas eles também alertaram que o momento pode não ser adequado para um acordo. Embora alguns analistas acreditem que a BP possa parecer propensa a uma aquisição, dada a queda de seu preço das ações e a renúncia do CEO Bernard Looney no mês passado, a Shell pode não estar no melhor momento para agir.

O CEO da Shell, Wael Sawan, assumiu o cargo em 1º de janeiro deste ano, e embora seu foco na lucratividade e na produção de petróleo e gás tenha rapidamente conquistado muitos investidores, eles acreditam que fusões podem ser uma aposta muito ousada tão cedo em seu mandato.

Arjun Murti, analista da empresa de consultoria e investimento em energia Veriten, com sede em Houston, afirmou que uma fusão entre BP e Shell poderia ser "lógica".

"Você precisa de tamanho e escala para competir e eles podem ver a ExxonMobil e a Chevron ficando maiores com seus acordos recentes", disse Murti, que é conhecido por ter previsto o preço do barril de petróleo acima de US$ 100 em 2008, quando era analista de ações do Goldman Sachs.

"Eles estão correndo o risco de ficarem para trás, então uma fusão poderia fazer muito sentido se eles puderem lidar com quaisquer preocupações antitruste, especialmente porque as principais empresas europeias estão, sem dúvida, em uma situação difícil devido à pressão crescente que enfrentam em relação às mudanças climáticas."

A BP disse que não comentaria "especulações". A Shell se recusou a comentar.

Murti comentou que as outras principais empresas europeias, a francesa TotalEnergies e a italiana Eni, também estariam avaliando alternativas, mas alertou que as pressões nacionais tornariam qualquer grande acordo mais desafiador: a Eni é 30% de propriedade do governo italiano, enquanto a TotalEnergies, embora não seja mais estatal, continua próxima do governo francês.

Entre as especialistas em exploração e produção de xisto dos EUA, os analistas disseram que as empresas maiores restantes buscariam se unir para ganhar importância e se tornar um alvo atraente para uma aquisição de uma gigante no futuro. Negociadores disseram que grupos como Occidental Petroleum, ConocoPhilips e Marathon Oil poderiam ser os próximos da lista.

"De forma alguma as (movimentações da) Exxon ou a Chevron acabaram", disse Andrew Dittmar, analista da Enverus. "[Mas] vimos suas movimentações para essa onda específica. Acho que damos um passo atrás e vemos algumas dessas empresas independentes se consolidando entre si no resto de 2023 e 2024."

Wirth disse na segunda-feira (23) que o setor de xisto estava "pronto" para novos negócios. "Quando e onde é mais difícil prever, mas vimos algumas transações e talvez veremos outras", disse ele.

Mas ele insistiu que o anúncio da Chevron não foi influenciado por negociações em outros lugares. "Essas discussões começaram e estavam em andamento muito antes do anúncio ou dos rumores da transação Exxon-Pioneer", disse Wirth ao FT. "Estávamos trabalhando nisso independentemente disso (negociação da Exxon) e o movimento teria acontecido mesmo se aquilo não tivesse acontecido."

No entanto, o acordo acirrará ainda mais a disputa entre Exxon e a Chevron, deixando ambas controlando conjuntamente o bloco de Stabroek na costa da Guiana, no qual a Hess tinha uma participação de 30% e a Exxon mantém uma participação operacional de 45%.

Stabroek é a maior descoberta de petróleo da última década e tem potencial para produzir até 1,5 milhão de barris de petróleo por dia quando atingir a produção total. Peter McNally, analista da Third Bridge, disse que ela era "o maior prêmio" no portfólio da Hess.

Poucos ativos com perspectivas semelhantes existem em qualquer lugar do mundo, afirmaram os analistas, deixando concorrentes otimistas em relação à demanda futura em busca das melhores perspectivas restantes antes que sejam adquiridas por outros.

"Quando a demanda por petróleo se mostrar muito mais resiliente do que a sabedoria convencional de hoje sugere, esperamos que essas aquisições sejam vistas como oportunas", afirmou Clay Seigle, analista da Rapidan Energy em Houston.

Com reportagem adicional de Amanda Chu em Nova York

Myles McCormick , David Sheppard , Jamie Smyth e James Fontanella-Khan
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