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Justiça manda Souza Cruz pagar R$ 1,2 mi de horas extras a vendedor por controlar sua jornada

Fabricante de cigarros disse à Justiça que profissional era trabalhador externo; empresa não respondeu à reportagem

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Curitiba

A Justiça do Trabalho determinou que a fabricante de cigarros Souza Cruz pague mais de R$ 1,267 milhão em horas extras e adicionais noturnos para um vendedor externo, por considerar que ele tinha sua jornada controlada por dispositivos como GPS no veículo e no celular corporativo.

O direito à indenização foi confirmado por unanimidade pelo TST (Tribunal Superior do Trabalho). O processo passou pela etapa em que não há mais possibilidade de recursos (trânsito em julgado) e o vendedor já recebeu o dinheiro, segundo o advogado que representou o funcionário.

Pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), o trabalhador externo não teria direito a horas extras, pois seria impossível controlar sua jornada. Porém, segundo a Justiça do Trabalho, o empregado comprovou, por meio de depoimentos de testemunhas, que a empresa controlava sua jornada e, portanto, ele não se enquadrava como trabalhador externo, nos termos do artigo 62, inciso I, da CLT.

Trabalhador conseguiu comprovar na Justiça, com testemunhas, que havia controle de sua jornada - Gabriel Cabral/Folhapress

O profissional já havia obtido vitória na primeira instância, em uma Vara do Trabalho no Paraná, e no TRT-9 (Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região).

Na ação, a Souza Cruz afirmou que o sindicato reconheceu a impossibilidade de fiscalização da jornada dos empregados com atividades externas.

O advogado trabalhista Ronaldo Tolentino, que atuou em favor da Souza Cruz no TST, afirmou em nota encaminhada à Folha que o Tema 1.046 (negociado sobre o legislado) é um precedente "relativamente recente" e que "a jurisprudência em torno na matéria está em processo de consolidação no que se refere a quais direitos podem ou não podem ser negociados".

"O TST já possui alguns precedentes importantes no sentido de dizer que a ausência de controle de jornada de trabalhadores externos é passível de negociação coletiva", disse Tolentino.

Em seu acórdão, o TRT-9 afirma que houve controle do início e do término da jornada do profissional durante todo o período contratual, entre dezembro de 2011 e setembro de 2018.

"Se de um lado, o controle direto da jornada de trabalho diz respeito àquele formalmente realizado —como, por exemplo, por intermédio dos cartões de ponto—, de outro, o controle indireto corresponde àquele que decorre de exigências feitas pelo empregador —como, por exemplo, de comparecimento na sua sede, de instalação de equipamento em instrumento de trabalho, de cumprimento de determinado volume de trabalho ou de determinada meta, de relatório detalhado de cada serviço realizado", diz trecho da decisão.

O advogado Denison Leandro, responsável pela defesa do trabalhador, disse que a Souza Cruz utilizou "diversos recursos para acompanhar seus roteiros, como GPS no veículo e no celular corporativo".

"O que importa para a Justiça do Trabalho é o que realmente acontece na prática entre patrão e funcionário, e não aquilo que está escrito ou assinado simplesmente", disse o advogado à reportagem.

O profissional disse, na ação, que trabalhava como vendedor da fabricante de cigarros de segunda a sexta-feira, inclusive em feriados municipais, das 6h30 às 22h, e estendia sua jornada duas vezes por semana até as 23h, sempre com 30 minutos de intervalo. Segundo o relato, ele também trabalhava em um sábado por mês, das 6h30 às 18h. Houve o relato de jornada ampliada até as 3h em cinco sábados.

Para o colegiado regional, o fato de o empregador prestar serviços de forma externa, por si só, não o enquadra na exceção da CLT. "O próprio preposto admitiu que o autor iniciava e terminava sua jornada na empresa e a testemunha trazida pela ré [a empresa] reconheceu que o autor deveria seguir um roteiro determinado pela ré", diz outro trecho.

A empresa recorreu ao TST, mas o relator do caso em Brasília, ministro Lelio Bentes Corrêa, apontou que não cabe ao TST avaliar fatos e provas, e rejeitou o recurso sem analisar o mérito. O entendimento do relator foi seguido pelos outros ministros da 6ª Turma do TST.

Segundo o juiz do trabalho Rogério Neiva, ex-juiz-auxiliar da Vice-Presidência do TST, o reconhecimento do vínculo acarreta no pagamento de horas extras e outras variáveis, mas o valor obtido é definido com base em parâmetros da jornada e do salário.

"Mas, para o trabalhador chegar a R$ 1 milhão, se ele não tem um salário muito elevado, tipo de executivo, terá de fazer um bocado de horas extras", afirmou.

Neiva faz uma simulação: "Se alguém tem reconhecida uma jornada em que há dez horas extras por semana, com salário de R$ 10 mil, no período de cinco anos, que inclusive é o limite pela prescrição, a condenação daria em torno de R$ 240 mil, com os reflexos. Se o salário fosse de R$ 20 mil, seria o dobro desse valor. E sobre isso teria ainda a repercussão tributária para a empresa, que acrescentaria mais de 20%", explica.

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