Falta de peças faz motoristas esperarem até oito meses para consertar carro

Anfavea e vendedora dizem não ter identificado gargalos, e indústria de funilaria culpa setor de seguros

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São Paulo

Motoristas, oficinas e seguradoras têm reclamado da demora na entrega de peças de carros nos últimos meses. A causa, porém, divide quem está no mercado: alguns culpam as montadoras e outros as próprias seguradoras.

Levantamento da FenSeg (Federação Nacional de Seguros Gerais) apontou que dos 40.700 itens encomendados entre janeiro e março, 7.100 ainda precisavam ser entregues pelas montadoras em agosto.

Além disso, dos 235 mil sinistros de automóveis neste período, 7% sofreram com o atraso de peças.

Produção de veículos na fábrica da Fiat, em Betim (MG)
Produção de veículos na fábrica da Fiat, em Betim (MG) - Pedro Silveira/Folhapress

Os dados foram divulgados pela entidade na semana passada. De acordo com a FenSeg, neste ano os motoristas precisaram ficar em média 25 dias com carros reservas alugados pelas seguradoras enquanto as oficinas credenciadas aguardavam a entrega de peças. Em 2019, último ano antes da pandemia de Covid-19, foram 11 dias.

A maior parte das peças (60%) com atraso na entrega é de funilaria. São itens como para-choques, faróis, portas e painéis. Componentes mecânicos como microchips representam 25% dos atrasos, vidros e iluminação, 8%, e segurança, 6%.

Ainda segundo a FenSeg, 87% do total de peças pendentes são de dez montadoras, e 15% de uma única. A entidade não nomeou essas empresas, mas fontes do mercado apontam que várias peças da Fiat estão em falta, principalmente aquelas relacionadas a carros grandes como Toro e Freemont.

Por meio de nota, a Stellantis, controladora da Fiat, disse que não há proplmeas no fornecimento de peças de funilaria dos dois modelos. "No caso do Fiat Freemont, que foi descontinuado em 2017, eventualmente a concessionária pode não ter peças em estoque para pronta entrega, mas garantimos o fornecimento através do armazém de peças Mopar, cujo prazo de entrega será informado pela concessionária e pode variar dependendo da localidade", afirmou.

Relatório da federação divulgado no mês passado aponta que ao menos três fatores estariam prejudicando a produção dessas peças: 1) escassez de componentes ainda motivada pela pandemia; 2) desaquecimento das vendas de veículos; 3) suspensão ou paralisação da produção pelas montadoras no Brasil.

As seguradoras dizem já ter comunicado várias vezes às montadoras sobre a necessidade de reposição das peças. Em todas elas, porém, não teriam recebido respostas.

À Folha a Anfavea, associação que representa as fabricantes no Brasil, disse que não foi comunicada sobre problemas ou gargalos na produção.

"Pode ser que esteja ocorrendo com alguma montadora específica, mas, de uma maneira conjuntural, nós não recebemos nada sobre falta de peças", afirmou, em nota.

Para o presidente da comissão de seguro de automóvel da FenSeg, Marcelo Sebastião, se o cenário for mantido como está, o consumidor pode ter de pagar mais pelos seguros.

"Esses atrasos agravam as despesas com o sinistro, uma vez que o veículo segurado fica mais tempo parado nas oficinas e o consumo de carro reserva aumenta. Essa diferença vai impactar na precificação do seguro. É inevitável", afirmou.

Um eventual aumento de preço nos seguros é um dos argumentos do Sindifupi-SP (Sindicato da Indústria de Funilaria e Pintura do Estado de São Paulo) para contrapor as críticas da FenSeg.

Segundo o presidente do sindicato, Angelo Coelho, a demora na entrega de peças não passa pela lentidão das montadoras, mas pelas operações de compra das seguradoras.

"As seguradoras incentivam os consumidores a enviarem seus veículos para oficinas credenciadas, mas essas oficinas trabalham com volume muito acima da capacidade. Além disso, essas seguradoras não deixam as oficinas comprarem as peças; elas próprias vão ao mercado e fazem leilões reversos para encontrar peças mais baratas. Aí elas ficam esperando surgir ofertas", disse.

"O atraso existe, mas não devido às montadoras. O objetivo das seguradoras com isso é aumentar o preço dos seguros", afirmou.

Coelho também preside a Associação Brasileira da Indústria, Comércio e Serviços para Excelência da Reparação Automotiva, que auxilia consumidores de seguradoras de automóveis.

Ao ser questionado sobre as acusações do Sindifupi-SP, Sebastião, da FenSeg, reiterou as informações do estudo.

"Monitoramos as entregas periodicamente, em atendimento às seguradoras, que são as maiores interessadas de que os reparos sejam feitos no menor prazo possível, para facilitar a vida do segurado, e porque quanto mais rápida a resolução, menos gasto as seguradoras terão com aluguel de carro reserva", disse.

A Folha ligou para uma importante vendedora de peças de São Paulo e ouviu de um responsável que a entrega pelas montadoras não se alterou nos últimos meses.

Antonio Fiola, presidente do Sindicato da Indústria de Reparação de Veículos e Acessórios, também questionou os atrasos e culpou as montadoras.

"Claro que as seguradoras sempre vão querer economizar, mas o atraso não é por conta delas, mas por conta da falta de peças", disse. Ele citou que as peças de funilaria só podem ser produzidas pelas próprias montadoras, por estarem relacionadas ao design dos veículos.

"Quem paga essa conta no final é o consumidor, que fica sem o carro. E o consumidor muitas vezes não entende e culpa a oficina", afirmou.

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