IBGE compete com empresas estrangeiras, diz Pochmann

Declaração ocorreu em evento sobre as diretrizes de atuação do instituto até 2026

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Rio de Janeiro

O presidente do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), Marcio Pochmann, afirmou nesta quinta-feira (16) que o mundo passa por uma "revolução informacional", destacando a existência de grandes empresas de tecnologia e redes sociais. Na visão dele, o instituto acaba competindo com essas companhias.

Segundo o economista, a concorrência ocorre porque as empresas de tecnologia e as redes sociais recebem os dados de usuários de maneira espontânea, enquanto o instituto precisa entrevistar os brasileiros para realizar suas pesquisas.

"Essa mudança de época faz com que o IBGE não esteja mais sozinho. Ele faz parte de uma competição de empresas e instituições, muitas delas estrangeiras, que dominam os dados e que permitem inclusive conhecer mais do Brasil do que o próprio IBGE", afirmou.

A declaração ocorreu durante a abertura de um encontro no Rio de Janeiro para definir 12 diretrizes de atuação do órgão nos próximos três anos. Ou seja, até 2026, quando a instituição completará 90 anos.

Marcio Pochmann sorri durante a cerimônia em Brasília que marcou sua posse como presidente do IBGE - Gabriela Biló - 18.ago.2023/Folhapress

"Nós [IBGE] temos de fazer o trabalho de ir até os brasileiros, consultar os brasileiros. Vamos continuar fazendo isso, mas precisamos fazer mais. Precisamos entrar de fato nessa nova fase", disse Pochmann.

"Conversamos com o presidente da Anatel, estamos fazendo uma série de diálogos para construir um sistema nacional de autonomia estatística, geografia e dados. Autônomo, é importante dizer, porque não basta integrar se as informações serão mantidas não em nossa propriedade."

O economista ainda citou um episódio envolvendo a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) como exemplo dessa mudança enxergada por ele, marcada pelo compartilhamento de dados com empresas estrangeiras. A "presidenta Dilma", afirmou Pochmann, teve informações de email "usurpadas".

O evento no Rio marca o primeiro encontro do projeto Diálogos IBGE 90 Anos, que irá até esta sexta-feira (17). A agenda ocorre em meio a uma polêmica causada por declarações recentes do presidente do instituto.

Na reta final de outubro, Pochmann elogiou a produção de estatísticas no Oriente, em locais como a China, o que acendeu alerta entre ex-técnicos do órgão e outros pesquisadores que veem falta de transparência do país asiático nessa área.

A China, lembram, suspendeu a divulgação de dados sobre desemprego de jovens –faixa etária que costuma registrar altos índices de desocupação.

Indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Pochmann também causou preocupação ao dizer em outubro que a comunicação adotada pelo IBGE é "do passado" e "ficou para trás".

Ele se referia ao modelo de entrevistas coletivas, que segue em vigor para a divulgação de pesquisas e que permite à imprensa questionar os técnicos responsáveis pelos dados. O economista ainda não participou de coletivas desde que assumiu a presidência do órgão, em agosto.

Cerimônia tem elogios a Pochmann

Na abertura do evento desta quinta, Pochmann fez um discurso com a promessa de valorização dos servidores do IBGE e convidou para o palco uma representante sindical. Diante do público, ela elogiou o economista, dizendo que "pela primeira vez uma presidência está interagindo com os funcionários".

Outra voz a sair em defesa do presidente do instituto durante a cerimônia foi Luis Manuel Rebelo Fernandes, secretário-executivo do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Em tom de ironia, ele rebateu as críticas direcionadas a Pochmann após sua indicação para o comando do instituto.

"Entender o IBGE como uma criação da Revolução de 1930 [ano em que Getúlio Vargas chegou ao poder] ajuda a entender também a reação negativa que houve em determinados setores à indicação do Marcio Pochmann", disse Fernandes.

"A elite financeira paulista olhou para o Marcio Pochmann, gaúcho, achou que era a encarnação do Getúlio Vargas. Resolveu abrir baterias e dirigiu seu inconformismo para o nosso querido Marcio. São vozes que foram derrotadas no passado e que voltarão a ser derrotadas no presente", acrescentou.

Uma ala de pesquisadores e economistas criticou a escolha de Pochmann para o IBGE em razão da passagem dele pelo comando do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), de 2007 a 2012. À época, o órgão conviveu com acusações de aparelhamento político.

Em nota, o IBGE afirmou que o encontro iniciado nesta quinta deve reunir mais de 400 participantes, entre servidores ativos, aposentados, sindicalistas e colaboradores do órgão, além de autoridades e representações diplomáticas.

Ao fim das atividades, na sexta, um documento com as 12 orientações deve ser encaminhado por Pochmann a Lula, à ministra Simone Tebet (Planejamento e Orçamento) e a autoridades presentes na cerimônia final.

O projeto Diálogos IBGE 90 anos é uma aposta da nova direção que envolve a criação de 12 grupos de trabalho em diferentes áreas.

Um deles é chamado de "Revitalização do IBGE: estruturas físicas (riscos e oportunidades de uso), tecnológicas (equipamentos) e virtuais (sistemas e servidores)".

Outro foi batizado como "O novo IBGE: estrutura organizacional e funcionamento nacional e descentralização, gestão, carreiras, concursos, ouvidoria, integração, compras, entre outros".

Pochmann chegou ao instituto depois do início das divulgações do Censo Demográfico 2022, a principal pesquisa do órgão. O trabalho sofreu atrasos em razão do corte de verba no governo Jair Bolsonaro (PL) e das restrições sanitárias da pandemia.

Bolsonaro, inclusive, atacou a metodologia usada pelo IBGE em pesquisas como a de desemprego. O trabalho, contudo, é reconhecido por seguir padrões internacionais de qualidade.

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