Diretoria do BC alerta para riscos de alta de gastos e manda recados ao governo

Para autoridade, compromisso do governo com a meta fiscal é importante para o controle da inflação

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

O Banco Central entrou no debate sobre alta de gastos públicos e meta fiscal. Integrantes da cúpula da autarquia monetária mandaram recados ao governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nos últimos dias.

Nesta quinta-feira (9), o diretor de Política Econômica, Diogo Guillen, afirmou que a manutenção da meta fiscal é tão importante quanto à meta de inflação. Alertou ainda para a elevação de despesas.

Um dia antes, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, disse que abrir mão de zerar o rombo nas contas públicas em 2024 tem um peso negativo maior do que o benefício do governo gastar mais.

Diogo Abry Guillen segura microfone em sessão da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado
Diogo Abry Guillen em sessão da CAE (Comissão de Assuntos Econômicos do Senado), em junho deste ano. Diretor do BC defende a meta fiscal e diz que política expansionista não garante mais crescimento. - Edilson Rodrigues/Agência Senado

Os alertas são emitidos após a autarquia monetária baixar a Selic —a taxa básica de juros— de 12,75% para 12,25% ao ano, em 1º de novembro. No dia 3, Lula disse que quer os ministros como os "melhores gastadores do dinheiro em obras de interesse do povo brasileiro".

Na sequência, o ministro Fernando Haddad (PT), que defende déficit zero para 2024, afirmou que o governo "pode e deve investir, gastar, mas tem que saber fazê-lo".

O BC já avisou que o compromisso com a responsabilidade fiscal é essencial para a queda da Selic.

Na ata do Copom (Comitê de Política Monetária), a autoridade alertou para o aumento da incerteza em torno do cumprimento da meta de zerar o déficit em 2024, "o que levou a um aumento do prêmio de risco", ou seja, elevou juros futuros e encareceu o custo de vida no Brasil.

Agora, integrantes do Copom passaram a endossar o teor do comunicado em falas públicas, ao defender a manutenção da meta estabelecida pelo PLDO (projeto de Lei das Diretrizes Orçamentárias) e ao alertar para possíveis consequências de seu abandono.

"A condução da política tem de ter credibilidade e a meta tem de ter credibilidade. Tem de ter compromisso fiscal. Todo mundo tem de concordar com o alvo. Ter credibilidade sobre o alvo e saber o que você está fazendo para atingir o alvo", disse Guillen, em evento do Itaú.

O diretor do BC ainda ponderou que um aumento de gastos do governo federal não necessariamente geraria uma melhora na atividade econômica.

"Nem sempre uma política fiscal mais expansionista gera mais crescimento. Acho que esse talvez seja um ponto que seja menos discutido. Mas políticas fiscais expansionistas, dependendo de como vai ser a reação, por exemplo, sobre condições financeiras, podem levar a uma redução de atividade", afirmou.

Haddad defende equalizar as contas públicas no próximo ano. No entanto, a ala política do governo Lula quer um déficit de 0,5% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2024 para evitar bloqueios orçamentários.

A mudança na meta passou a ser debatida nas últimas semanas após o presidente dizer que "dificilmente" o país iria atingir o objetivo de zerar o déficit.

Nesta quarta-feira (8), Campos Neto fez análise semelhante a Guillen. "Mudar a meta agora gera muita incerteza porque, sem meta, as pessoas podem interpretar que o fiscal foi abandonado e será muito mais difícil prever qual será a despesa fiscal em 2025 e em 2026."

As autoridades do BC apontam que a mudança na meta pode gerar mais inflação, seja por meio da alta no dólar, seja pelo aumento de gastos federais, além da alta na curva de juros futuros e no risco-país.

Esses efeitos, por sua vez, colocam em xeque o atual ciclo de cortes na Selic. O consenso do mercado é de um juro final em 2024 de 9,25% ao ano, mas ele já está em revisão. Na semana passada, era menor, de 9%.

Para especialistas, o BC está cumprindo o seu papel de controlar a inflação.

"Uma política fiscal com credibilidade ajuda o BC a levar a inflação para dentro da meta, mas é claro que pode haver exagero e pressão implícita", disse Guilherme Tinoco, pesquisador associado do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas).

Mesmo assim, Tinoco é a favor da manutenção da meta fiscal estabelecida pelo PLDO.

"Como as metas acabaram de ser desenhadas, é muito ruim para a credibilidade do novo regime fiscal se elas forem alteradas. Por mais que ela seja inalcançável, o governo deveria persegui-la ao máximo para ter força nas negociações do Congresso", disse Tinoco.

O momento de alteração e o tamanho da mudança são vistos como chave.

"Se a mudança vier depois da entrega de questões importantes, como a Reforma Tributária completa e projetos de lei associados ao aumento da receita, os efeitos no mercado seriam menores", afirmou Tinoco.

Já Murilo Viana, consultor sênior da GO Associados, defende mudar a meta. "O mercado nunca acreditou nela. As expectativas já estão descoladas. Do jeito que está, ela não vai ser cumprida", afirmou.

"É preferível revê-la de modo a chegar a um meio-termo. Se governo chegar a um déficit de 0,15% a 0,5% , não descredibiliza tanto a regra fiscal", disse Viana.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.