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Incerteza sobre meta fiscal elevou risco de investimentos, diz Copom em ata

Na última quarta (1º), BC cortou a taxa básica de juros em 0,5 ponto, a 12,25% ao ano

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Brasília

O recente aumento da incerteza em torno da meta fiscal elevou o risco de investimentos no país, afirmou o Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central em ata publicada nesta terça-feira (7).

O colegiado alertou também que o enfraquecimento da disciplina fiscal pode impactar negativamente a potência da política de juros e trazer, assim, mais prejuízos para economia brasileira no processo de queda da inflação.

"O comitê vinha avaliando que a incerteza fiscal se detinha sobre a execução das metas que haviam sido apresentadas, mas nota que, no período mais recente, cresceu a incerteza em torno da própria meta estabelecida para o resultado fiscal, o que levou a um aumento do prêmio de risco", disse.

Servidores do Banco Central fazem protesto em frente à sede da instituição, em Brasília, em dia de reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) - Pedro Ladeira - 1.nov.2023/Folhapress

Na sequência, o colegiado do BC repetiu textualmente a mesma mensagem do encontro anterior, em setembro, sobre a importância de perseguir os alvos já estabelecidos para que as expectativas de inflação dos economistas caminhem em direção aos objetivos traçados.

O debate sobre o risco fiscal voltou a ganhar força no fim de outubro, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou que "dificilmente" o país iria atingir o objetivo de zerar o déficit no próximo ano, conforme prometido pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda).

O Copom disse que as expectativas de inflação dos agentes de mercado continuam distantes dos alvos perseguidos e são um fator de preocupação. De acordo com os membros do comitê, a redução das expectativas requer atuação firme da autoridade monetária, bem como contínuo fortalecimento da credibilidade e da reputação das instituições e dos arcabouços fiscal e monetário.

"O comitê reforçou a visão de que o esmorecimento no esforço de reformas estruturais e disciplina fiscal, o aumento de crédito direcionado e as incertezas sobre a estabilização da dívida pública têm o potencial de elevar a taxa de juros neutra da economia, com impactos deletérios sobre a potência da política monetária e, consequentemente, sobre o custo de desinflação em termos de atividade", disse.

Entre os motivos para que as projeções estejam acima da meta nos próximos anos, os membros do comitê mencionaram a alteração dos preços administrados [cuja sensibilidade a fatores de oferta e demanda é menor] projetados para 2024.

Também citaram as trajetórias da atividade econômica, da capacidade ociosa e do mercado de trabalho, que sugerem um hiato do produto [margem que a atividade tem para crescer até atingir sua capacidade máxima] mais apertado.

No próximo ano, a meta de inflação definida pelo CMN (Conselho Monetário Nacional) é de 3%, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos. Isso significa que o objetivo será considerado cumprido se oscilar de 1,5% (piso) a 4,5% (teto).

Na última quarta-feira (1º), o Copom (Comitê de Política Monetária) do BC decidiu de forma unânime reduzir a taxa básica de juros (Selic) em 0,5 ponto percentual, de 12,75% para 12,25% ao ano.

A autoridade monetária manteve sua estratégia, apesar dos ruídos provocados pela discussão sobre uma possível revisão da meta fiscal de 2024.

Foi o terceiro corte de juros consecutivo na mesma magnitude e o segundo com decisão unânime entre os membros do colegiado do BC. O ciclo de afrouxamento monetário teve início em agosto.

Quanto aos próximos passos, voltou a antecipar que prevê novos cortes de 0,5 ponto percentual nas próximas reuniões. O último encontro do ano está marcado para os dias 12 e 13 de dezembro.

O Copom analisou diferentes trajetórias nos ambientes doméstico e internacional e debateu a estratégia e a extensão de ciclo apropriados em cada um dos cenários. Apesar da discussão, optou por manter a estratégia inicial.

Na ata, enfatizou que os riscos em torno do cenário global cresceram e que esse aumento de incerteza exige cautela.

O colegiado ressaltou também que a elevação das taxas de juros de longo prazo nos Estados Unidos restringe as condições financeiras. No entanto, ponderou que é incerta a defasagem e a magnitude desse impacto sobre a atividade econômica norte-americana.

"Há múltiplos mecanismos de transmissão da economia internacional para a economia doméstica, financeiros e econômicos, que devem ser incorporados na tomada de decisão", disse.

Foram debatidos os diversos canais de transmissão da taxa de juros dos EUA para a economia brasileira. A discussão englobou, entre outros elementos, os efeitos via diferencial de juros, câmbio, taxa neutra de juros, preço das commodities.

O comitê observou que, apesar da gravidade dos acontecimentos, citando como exemplo o conflito no Oriente Médio, a taxa de câmbio e o preço do petróleo tiveram variações até o momento moderadas.

Para um membro do Copom, o cenário externo introduz um viés de alta para inflação no balanço de riscos. Na avaliação dos demais participantes, o ambiente internacional afeta sobretudo o grau de incerteza.

Em seu balanço de riscos para a inflação, o colegiado do BC continuou com a avaliação de que permanecem fatores em ambas as direções.

INFLAÇÃO EM QUEDA

Na ata, o comitê reconheceu que houve um progresso relevante no processo de desinflação. Apesar da observação, ponderou que ainda há um longo caminho a ser percorrido para o retorno da inflação à meta e que o atual estágio do processo desinflacionário tende a ser mais lento.

Segundo o BC, isso exige "serenidade e moderação" na condução da política de juros. Na avaliação do comitê, se esgotaram algumas fontes que contribuíram para o primeiro estágio de desaceleração da inflação. Ele cita os preços de atacado de bens industriais, os preços de commodities agrícolas internacionais e os preços domésticos de alimentos.

O Copom manteve sua hipótese de incorporar um impacto relativamente pequeno do fenômeno climático El Niño em suas projeções de inflação de alimentos. Alguns membros, contudo, enfatizaram os impactos inflacionários no caso de que ele seja mais extremo.

"O comitê segue avaliando que a volatilidade inerente aos componentes ligados a alimentos e bens industriais sugere a possibilidade de reversões abruptas, recomendando cautela."

No cenário de referência do Copom, a projeção de inflação para este ano caiu de 5% para 4,7% —dentro do intervalo de tolerância da meta (4,75%). Para 2024, a estimativa subiu de 3,5% para 3,6%. Houve alta também para 2025, a 3,2%, ante 3,1% no encontro anterior.

ANÁLISE DOS ECONOMISTAS

Alberto Ramos, diretor de pesquisa macroeconômica do Goldman Sachs para a América Latina, vê uma comunicação mais conservadora e "hawkish" (dura) por parte do Copom, que demonstrou preocupação com o cenário externo "adverso", "desafiador" e "incerto".

Também pelo desconforto do colegiado com as expectativas de inflação acima do centro da meta, os riscos subjacentes para os preços de alimentos e bens industriais, além dos riscos relacionados à questão fiscal e às metas fiscais estabelecidas.

"De particular relevância e em um tom hawkish, o Copom excluiu a frase que mencionava a ‘baixa probabilidade de uma intensificação adicional no ritmo de ajustes’ e o conjunto de condições que seriam necessárias para eventualmente acelerar o ritmo dos cortes", disse Ramos em relatório.

Na projeção do Goldman Sachs, o Copom deve reduzir a Selic em 0,5 ponto percentual nas duas próximas reuniões, em alinhamento com o discurso do presidente do BC, Roberto Campos Neto. Para os encontros subsequentes, considera a possibilidade de uma desaceleração do ritmo de cortes para 0,25 ponto.

Rafaela Vitória, economista-chefe do banco Inter, afirma que a ata do Copom reconhece o dinâmica mais benigna da inflação, o que reforça a expectativa de manutenção do atual ritmo de queda da taxa básica. No entanto, diz que o canal das expectativas de inflação pode afetar os cortes de juros mais à frente.

Para o fim do próximo ano, projeta a Selic em 9%. Na visão dela, esse patamar é "compatível com a queda da inflação esperada, principalmente com a atividade mais fraca, já considerando um cenário de risco de maior incerteza lá fora, e juros mais altos por mais tempo nos EUA."

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