Com nova CEO, Levi's adota estratégia para ir além das calças

Sob Michele Glass, marca de 171 anos quer se tornar uma 'verdadeira varejista', com mais lojas e maior presença virtual

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Jordyn Holman
San Francisco | The New York Times

A coleção recém-ampliada da Levi's é exibida em uma loja da marca na Market Street, em San Francisco. Seus manequins estão vestidos da cabeça aos pés com sua especialidade. Um macacão jeans preto é combinado com uma blusa de manga comprida jeans azul-claro, complementada por um boné jeans.

Outro veste uma bolsa transversal jeans. Já uma parede repleta de jaquetas jeans azuis dá aos compradores a opção de se sentirem como hippies, fazendeiros ou estrelas do rock —dependendo de qual escolherem.

"Não são apenas paredes e mais paredes de calças", disse Michelle Gass enquanto observava a loja em fevereiro, dias após se tornar CEO da Levi Strauss & Co. A variedade desses outros produtos, que a Levi’s tem produzido em um ritmo mais acelerado do que no passado, era igual ao do estoque de calças jeans da loja.

Manequins de loja da Levi's em San Francisco
Manequins de loja da Levi's em San Francisco - Marissa Leshnov - 1.fev.2024/The New York Times

Naquele dia, o traje de Gass também serviu como um exemplo do que a empresa estava buscando. Ela trocou sua jaqueta de couro preta característica, seu visual preferido durante o tempo como CEO da Kohl’s, por uma jaqueta trucker Levi’s de lavagem escura e uma saia midi de denim inspirada nos anos 1990 para combinar.

Gass, 55 anos, quer fazer com que a Levi’s não seja apenas uma marca em que você pensa quando quer calças jeans, mas também um lugar para onde você vai para comprar camisas, macacões e jaquetas acolchoadas.

Seu objetivo é fazer com que os clientes voltem mais às lojas —já que as pessoas geralmente compram esses produtos com mais frequência do que calças— e acessem também o site e o aplicativo da marca.

"Quando você está construindo lojas, quando está criando um ecommerce, o consumidor quer explorar e comprar mais do que apenas um par de calças", disse Gass.

Essa abordagem é um elemento-chave para transformar a empresa de 171 anos de idade em uma verdadeira varejista, em vez de uma marca que vende seus produtos principalmente nas lojas de terceiros.

As vendas por meio de seus canais diretos ao consumidor, conhecidos no setor como DTC, aumentaram 11% em seu trimestre mais recente, enquanto as vendas por meio de varejistas como Macy’s, Kohl’s e Amazon diminuíram 2%. As vendas totais da empresa ficaram estáveis em 2023 em comparação com o ano anterior.

Este é o desafio que a Levi’s enfrenta, já que os investidores continuam a esperar crescimento dela. No ano passado, a receita foi de US$ 6,2 bilhões.

Em janeiro, a empresa disse aos investidores que planejava aumentar as vendas totais para US$ 9 bilhões a US$ 10 bilhões em algum momento. Não estabeleceu uma data específica para isso.

O que Gass e sua equipe de líderes deixaram bem claro é que suas lojas e a variedade de produtos que podem colocar lá desempenharão um papel significativo na conquista desse objetivo. Em seis anos, ela quer que 55% de sua receita venha de seu negócio direto ao consumidor, acima dos atuais 42%.

"Isso realmente está levando a empresa a se tornar, como eu diria, uma varejista de lifestyle em jeans", disse Gass. "Essa é a grande mudança."

As lojas da Levi’s não são novas. A primeira loja de varejo foi aberta em 1983, na Espanha; a primeira nos Estados Unidos foi aberta em Columbus, Ohio, em 1991.

Michelle Gass, CEO da Levi Strauss & Co, no laboratório de inovação da Levi's em San Francisco
Michelle Gass, CEO da Levi Strauss & Co, no laboratório de inovação da Levi's em San Francisco - Marissa Leshnov - 1º.fev.2024/The New York Times

Mas a maioria das vendas da empresa ainda vinha de cadeias como Macy’s ou Nordstrom. As formas como os compradores adquirem coisas mudaram drasticamente desde então.

À medida que lojas de departamento e shoppings lutavam com a ascensão do ecommerce, marcas como Levi’s e Nike responderam reforçando seus próprios canais diretos ao consumidor para fortalecer os laços com consumidores e controlar sua marca mais de perto.

"É possível mostrar a marca e a direção em que se deseja que ela evolua", disse Jim Duffy, analista de varejo da Stifel, sobre as lojas físicas. "Isso pode ser mais difícil de fazer em um ambiente de atacado, onde muitas vezes eles tendem a vender marcas como itens, em vez de coleções."

A Levi’s agora tem quase 2.300 lojas em todo o mundo, incluindo 244 nos Estados Unidos. No ano passado, teve um número recorde de aberturas de lojas: 105.

"O consumidor vai comprar diretamente das marcas", disse Gass. "Existe a tendência geral do consumidor que está gravitando para querer uma experiência direta, e depois temos esse próximo capítulo para nós, no qual ainda estamos pouco desenvolvidos no quesito presença direta ao consumidor."

Para se transformar em uma empresa que pensa como varejista, a Levi’s terá que passar por algumas dores do crescimento. Gass identificou algumas.

No ano passado, enquanto era presidente da Levi’s e se preparava para suceder o CEO de longa data, Chip Bergh, ela visitou as lojas da empresa em 15 mercados. Ela fez seis viagens à Ásia.

Nessas viagens, ela viu maneiras como o negócio da Levi’s estava mais desenvolvido em outras partes do mundo. Por exemplo, na Índia, a empresa vende uma camisa para cada duas calças. Nos Estados Unidos, é uma camisa para cada quatro. Ela quer paridade nessa proporção.

Ela também concluiu que as decisões poderiam ser tomadas muito mais rapidamente. Foram necessários 15 meses para desenvolver e entregar camisas —quase o tempo que levou para as calças, ainda assim muito lento para atrair constantemente compradores e motivá-los a retornar. A empresa contratou novos fornecedores e está acelerando esse cronograma.

Também está fazendo mudanças aparentemente pequenas. As calças jeans da Levi's eram dobradas para envio para se adequarem à forma como são exibidas por outros varejistas —mas as próprias lojas da Levi's as exibem de forma diferente.

Isso deixava os funcionários das lojas da Levi's refazendo arduamente a dobra das calças jeans. Agora, os pedidos para as lojas da Levi's são enviados para refletir a forma como a loja as exibirá.

A Levi's está focando na capacitação e no engajamento de seus funcionários usando vídeos curtos de treinamento semelhantes ao TikTok, e está experimentando maneiras de como a inteligência artificial pode ajudar os funcionários da loja a responder mais facilmente às perguntas dos clientes ("Qual é a vantagem do denim selvedge japonês?").

Funcionário da Levi's compara duas peças de calças jeans no laboratório da empresa em San Francisco
Funcionário da Levi's compara duas peças de calças jeans no laboratório da empresa em San Francisco - Marissa Leshnov - 1º.fev.2024/The New York Times

Também está melhorando os sistemas que permitem aos centros de distribuição saber quando os produtos mais vendidos estão acabando nas lojas —uma grande frustração para os compradores que esperam encontrar seu tamanho. O processo de levar produtos dos centros de distribuição para as lojas também foi otimizado para corresponder ao estoque da estação.

Tais práticas são essenciais para uma varejista nos dias de hoje. Mas é a próxima evolução para uma marca que por um tempo perdeu o rumo. Uma década atrás, a Levi's enfrentou a crise existencial de tornar seu jeans relevante enquanto os jovens optavam por leggings.

A empresa descobriu como fazer. Eles criaram jeans mais elásticos, abriram lojas em bairros chiques e capitalizaram momentos como Beyoncé usando shorts cortados no estilo 501 durante sua apresentação de 2018 no Coachella.

Tornou-se uma empresa de capital aberto pela segunda vez em 2019, levando-a ainda mais para o centro das atenções. No ano passado, a Levi's foi a marca de jeans mais vendida nos Estados Unidos e no mundo, de acordo com dados da Euromonitor.

Dentro de sua sede em San Francisco, uma variedade de calças, jaquetas e camisas jeans estão penduradas em araras. Dawn Vitale, diretora de merchandising da Levi's, descreve a última coleção como "lifestyle em jeans", com a qual é possível se vestir com um traje completo de jeans.

Os preços dos jeans variam de cerca de US$ 60 a mais de US$ 400, sendo alguns produtos de colaborações especiais mais caros.

A lógica é que, quando a Levi's introduz um novo corte de jeans, há uma blusa ou jaqueta próxima que podem apresentar aos compradores que combinaria bem com ele. "Na verdade, é uma estratégia de combinação de roupas", disse Vitale.

Ainda assim, à medida que expande suas ofertas para preencher suas lojas, o negócio direto ao consumidor da Levi's é menos lucrativo do que seu negócio de atacado. Gass disse que tem uma "visão clara" para aumentar a lucratividade de suas lojas e plataformas de ecommerce.

A Levi's está tentando cortar gastos onde pode. Durante a reunião de ganhos trimestrais no final de janeiro, a empresa disse que cortaria de 10% a 15% de sua força de trabalho, uma medida que economizaria US$ 100 milhões neste ano.

Gass não quis compartilhar quais funções estavam sendo cortadas, mas disse que a empresa estava procurando "reduzir camadas na organização". Também disse que deixaria de fabricar 15% de seus itens de menor venda.

"Estamos mudando a forma como estamos trabalhando", disse. "Esse modelo operacional vai buscar todas as oportunidades em que a nossa cultura corporativa poderá ser decisiva."

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