Consumo consciente se torna aliado da venda de cosméticos em barra

Xampus, hidratantes e maquiagens são produzidos com matéria-prima orgânica e redução do uso de plástico

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São Paulo

Usar matéria-prima orgânica, diminuir a quantidade de água e embalagens plásticas estão por trás do apelo dos cosméticos sólidos, que incluem desodorantes, xampus, condicionadores, esfoliantes e maquiagens.

A popularização do nicho vem, portanto, na esteira da preocupação do consumidor com sustentabilidade e cuidado pessoal. "É uma tendência que veio para ficar", diz Ana Claudia Barbosa, engenheira biomédica e professora do curso de tecnologia em estética e cosmética da Fasm (Faculdade Santa Marcelina).

Fundo cinza com maquiagens de diversos tons lado a lado
Itens da linha multifuncional de maquiagem da Amokarité, que podem ser usados como batom, blush, sombra ou delineador - Divulgação

Segundo ela, cerca de 90% da composição de um xampu convencional, líquido, é água. A engenheira diz que usar menos água também traz benefícios durante o processo de formulação dos cosméticos, por causa da diminuição da proliferação de microorganismos, o que exige menos conservantes.

Conservantes sintéticos usados na indústria da beleza, como os parabenos, podem ser nocivos ao meio ambiente, aos cabelos e à pele.

A paulistana B.O.B não usa esse componente, diz Victor Lichtenberg, 35, cofundador.

Aberta em 2019, a empresa vende mais de mil unidades por dia, entre xampus, condicionadores, hidratantes e desodorantes. Os preços variam entre R$ 45 e R$ 55.

Victor afirma que cada barra de xampu de 80 g equivale a aproximadamente duas embalagens de 200 ml de um xampu líquido.

Em uma cesta bege produtos como sabonete, shampoo e condicionador em cima de uma mesa
Manteiga de murumuru, azeite de dendê e óleo de copaíba são alguns dos ingredientes usados na produção dos cosméticos da Kurandé, marca fluminense - Divulgação

O empreendedor conta ter iniciado a comunicação online antes mesmo das primeiras vendas. O objetivo era criar uma comunidade interessada em diminuir o número de embalagens geradas pelo setor, para que, após o lançamento, já houvesse consumidores em potencial.

Para Rafaela Dias Brugnatti, analista de negócios do Sebrae, quem quer investir nesse ramo precisa ter atenção com a comunicação.

"O produto rende mais, tem redução do uso de água, embalagem com menos plástico e é fácil de carregar em viagens. Todos esses são diferenciais que o empreendedor precisa explicar ao público."

Até 2024, o mercado global de beleza natural, que inclui esses produtos em barra, deve atingir o equivalente a R$ 127 bilhões, aponta relatório do British Beauty Council, instituição britânica que representa empresas do ramo.

Ana Claudia, da Fasm, vê na beleza natural uma oportunidade de movimentar o mercado nacional, com o comércio de itens como manteiga de karité e de murumuru, plantas que produzem óleos com propriedades hidratantes.

Segundo ela, a matéria-prima brasileira é uma opção para pequenos e médios do nicho evitarem custos elevados de fabricação, pois elimina gastos com importação.

É o caso da Kurandé, marca fluminense que faz xampus, condicionadores e sabonetes usando urucum, azeite de dendê e óleo de copaíba.

A ancestralidade negra foi inspiração da marca, da fabricação até a escolha de insumos, afirmam, em chamada de vídeo, Felipe Garcia, 25, e Cláudio Marques, 28, casal à frente da empresa.

"Queríamos valorizar produtos que têm ligação com a cultura negra e com a nossa própria história", diz Felipe. Ele conta ter crescido vendo as práticas de saboaria natural da bisavó, curandeira.

As vendas começaram em 2019, como forma de aumentar a renda durante a graduação, conta Cláudio, aluno de história da arte na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Felipe cursa biologia na mesma instituição.

O produto rende mais, tem redução do uso de água, embalagem com menos plástico. Isso precisa ser explicado ao público

Rafaela Dias Brugnatti

analista de negócios do Sebrae

Os principais clientes da Kurandé são pessoas negras das periferias do Rio e de São Paulo. A sede fica em Japeri, baixada fluminense, onde trabalham outras cinco pessoas.

Para evitar o plástico, as embalagens são feitas principalmente de papel e vidro. As vendas são online e o valor dos itens varia entre R$ 15 e R$ 46.

Estephanie Racy, 32, sócia-fundadora da Amokarité, de maquiagens sólidas, diz ter começado a estudar cosmetologia com o intuito de fazer produtos para uso próprio. O lixo gerado com embalagens e a composição dos produtos disponíveis no mercado, com pigmentos e conservantes sintéticos, a incomodavam.

O carro-chefe é a linha multifuncional, disponível em 28 tons que podem ser usados como batom, blush, sombra ou delineador —todos têm formato de frutas.

A marca foi aberta em 2019, com investimento inicial da própria Estephanie. Em 2020, quando as vendas online aumentaram, a Amokarité faturou R$ 400 mil, e dobrou o valor em 2021, diz. Os preços variam entre R$ 26 e R$ 96.

A empreendedora conta que, desde o começo, contratou farmacêuticas e químicas para formular a maquiagem e reinvestiu todo o lucro inicial. Hoje, ela mantém uma fábrica em Gonçalves, no sul de Minas Gerais.

É um desafio para o empreendedor sair do perfil de artesão e se tornar uma empresa, diz Rafaela, do Sebrae. "É importante entender que, mesmo com produtos orgânicos, a empresa é uma indústria de cosméticos. O investimento para se adequar à legislação não é pequeno." A Anvisa faz a fiscalização do setor.

Uma alternativa é fazer parcerias e terceirizar processos, como testes e uso de maquinário, para fabricar em larga escala, afirma Ana Claudia, da Fasm.

Essa foi a opção escolhida pelos donos da Kurandé. Com o aumento das vendas, parte da produção foi terceirizada. Apenas alguns itens, como o sabão da costa, usado em rituais de religiões de matriz africana, são feitos de forma artesanal.

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