Mudança da embaixada dos EUA preocupa vizinhos em Jerusalém

Moradores do bairro de Arnona, onde ficará representação provisória, temem atentados

Bandeira dos EUA tremula no consulado do país no bairro de Arnona, em Jerusalém, onde ficará a nova embaixada
Bandeira dos EUA tremula no consulado do país no bairro de Arnona, em Jerusalém, onde ficará a nova embaixada - Ahmad Gharabli/AFP
Jerusalém

Na pracinha da rua Kfar Etzion, no tradicional e calmo bairro de Arnona, em Jerusalém, os netos de Ruth Kahn, 78, brincam ao ar livre. Há 12 anos morando no perímetro de classe média longe da aglomeração do centro, a parisiense não esconde a apreensão.

Ela aponta para o outro lado da rua, onde fica o consulado dos EUA que mudará temporariamente de status para embaixada após o reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel pelo presidente americano, Donald Trump. A mudança deve ser em 14 de maio, aniversário de 70 anos de Israel.

“Vai ser uma confusão. Meu maior medo é a segurança. Nossa vida no bairro vai mudar para pior. Será que vai haver atentados por aqui?”

Não que a aposentada seja contra a decisão de Trump. Para ela, assim como para a maioria dos israelenses, o americano fez a coisa certa. 

Desde sua criação, Israel considera Jerusalém sua capital, diferentemente da comunidade internacional, para quem ela é Tel Aviv. É lá que ficam todas as embaixadas, incluindo a do Brasil.

Depois da decisão dos EUA, a Guatemala, presidida pelo pastor evangélico Jimmy Morales desde 2016, também mudará sua embaixada para Jerusalém (em 16 de maio).

Por ora, o Brasil não planeja fazer a mudança. “O status de Jerusalém será definido por meio de negociações entre israelenses e palestinos. Achamos que fazer uma transferência dessas é um passo antes do tempo”, diz o embaixador em Israel, Paulo César Meira de Vasconcellos.

Apesar do apoio à decisão, os moradores de Arnona acreditam que Trump não levou em consideração a confusão que o gesto pode causar para os vizinhos do prédio.

“É fácil tomar decisões a milhares de quilômetros de distância. Ele fica na Casa Branca, nós é que vamos sofrer as consequências”, diz a secretária Zohar Ohayon, cujo escritório fica perto dali.

De fato, o presidente americano já avisou que não vai à cerimônia de transferência. Na prática, quase nada vai mudar. Só o embaixador americano, David Friedman, passará a despachar de lá, deslocando-se todos os dias de Tel Aviv a Jerusalém.

Mas o plano é eventualmente construir um prédio —em localização ainda não escolhida— para abrigar as dezenas de funcionários da atual embaixada americana, uma construção maciça e altamente protegida.

A proteção da embaixada interina é o que, para os moradores de Arnona, falta. Desde 6 de dezembro, quando Trump reconheceu Jerusalém como capital de Israel, uma viatura policial circula dia e noite em torno do consulado.

“É pouco. A segurança terá que ser mais séria. A cerca em volta do prédio é muito simples”, diz Itai Ben Dror, 18, nascido e criado no bairro e funcionário de um mercado a metros do consulado. 

Já o diretor-geral do Ministério das Relações Exteriores de Israel, Yuval Rotem, exige que os EUA construam um muro de três metros em volta da embaixada.

Os americanos têm dois consulados em Jerusalém. O outro fica no centro, a um quilômetro da Cidade Velha (onde ficam pontos religiosos como o Muro das Lamentações, a Esplanada das Mesquitas e a Igreja do Santo Sepulcro).

O de Arnona está situado em um complexo que mais parece uma fortaleza. De fora, só é possível ver o topo do mastro com a bandeira americana. A representação fica em Jerusalém Ocidental, mas a menos de um quilômetro de duas aldeias palestinas.

Na área do consulado também funciona um antigo hotel, o Diplomat (hoje uma espécie de asilo com 500 imigrantes russos idosos), e a sede de uma rede de fast food. 

Os moradores do Diplomat já foram avisados de que precisam começar a procurar outra casa. Os americanos vão cancelar o contrato com o antigo hotel a partir de 2020.

Mas nem todos estão preocupados com a novidade em Arnona. A manicure Anastácia Nissikovsky acha que a mudança vai dar vida ao bairro e, quem sabe, trazer clientes: “A mudança será boa para os negócios. Quanto mais gente por aqui, melhor”.

O mesmo acredita o contador Yossi Bensimchon, 46: “Já vivemos em constante tensão, então nada vai mudar realmente. O mais importante é que todos saibam que Jerusalém é a nossa capital e que estamos felizes com a decisão americana.”

CRONOLOGIA

Transferência da embaixada americana para Jerusalém

6.dez.2017

O presidente americano, Donald Trump, anuncia o reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel, ordenando a transferência da embaixada de Tel  Aviv para Jerusalém

11.dez.2017

A União Europeia rejeita o anúncio americano e afirma que nenhum de seus países transferirá embaixadas para Jerusalém

13.dez.2017

Mais de 50 países da Organização para Cooperação Islâmica aprovam moção rejeitando a decisão de Trump

21.dez.2017

A Assembleia Geral das Nações Unidas aprova resolução declarando nulo o status de Jerusalém como capital de Israel: 128 países votam a favor, 9 contra e 35 se abstêm

24.dez.2017

O governo de Guatemala anuncia que será o segundo país a transferir a embaixada de Tel Aviv para Jerusalém

23.fev.2018

O Departamento de Estado americano anuncia que a transferência da embaixada acontecerá em maio

4.mar.2018

O presidente da Guatemala, Jimmy Morales, anuncia que a embaixada de seu país em Israel também será transferida em maio

27.mar.2018

Israel aprova a mudança temporária de status do consulado americano localizado no bairro de Arnona, em Jerusalém, para embaixada

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