Afastada, presidente da Suprema Corte desafia o governo da Polônia

Apoiada por atos, Malgorzata Gersdorf se nega a deixar o cargo e comparece a seu gabinete

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Manifestantes fazem ato na frente da Suprema Corte em apoio a Malgorzata Gersdorf
Manifestantes fazem ato na frente da Suprema Corte em apoio a Malgorzata Gersdorf - Wojtek Radwanski/AFP
Varsóvia | AFP e Reuters

Afastada do cargo por uma nova lei que reduziu a idade da aposentadoria compulsória, a presidente da Suprema Corte da Polônia, Malgorzata Gersdorf, compareceu nesta quarta (4) a seu gabinete, ampliando assim o confronto entre ela e o governo.

Gersdorf e outros 26 juízes seriam obrigados a deixar os cargos depois que a idade de aposentadoria foi reduzida de 70 para 65 anos, uma das medidas da reforma aprovada pelo partido governista, o nacionalista Lei e Justiça (PiS, na sigla em polonês). 

Ela, porém, já tinha anunciado que não pretendia aceitar a nova regra e que iria comparecer normalmente a seu gabinete nesta quarta, quando a mudança começou a valer. A legislação também é criticada pela União Europeia

"Eu não me meto em política. Quero defender o estado de direito e apontar o limite entre a Constituição e a violação da Constituição", disse Gersdorf aos manifestantes reunidos diante da sede da Suprema Corte. "Espero que a ordem legal seja restabelecida na Polônia."

A magistrada foi aplaudida pelos manifestantes que a acompanhavam e que gritaram palavras de ordem como "Constituição" e "Tribunais livres".

A situação da Suprema Corte é confusa: o presidente Andrzej Duda informou na terça-feira (3) a Gersdorf que ela estava aposentada por completar 65 anos e seria substituída temporariamente por outro juiz da corte, Jozef Iwulski.

Mas Gersdorf anunciou que ela indicava o mesmo juiz apenas como um substituto durante sua ausência, na prática demonstrando que pretende seguir no cargo. 

"Não sou nem substituto nem um sucessor da presidente da Suprema Corte. Sou simplesmente uma pessoa designada para substituí-la durante suas ausências", afirmou.

Gersdorf disse que sai de férias na semana que vem.

Para o cientista político Ireneusz Krzeminski, "podemos imaginar uma espécie de entente entre o juiz Iwulski e a presidente Gersdorf, que permitirá a esta última permanecer no posto até que tenha um novo desenrolar da situação e um sinal de Luxemburgo", onde fica a sede do TJUE.

A presidente da Suprema Corte polonesa, Malgorzata Gersdorf (no centro), chega ao local nesta quarta (4)
A presidente da Suprema Corte polonesa, Malgorzata Gersdorf (no centro), chega ao local nesta quarta (4) - Wojtek Radwanski/AFP

O jornal local Dziennik Gazeta Prawna resumiu a situação: "Uma Suprema Corte com dois presidentes".

A Gazeta Wyborcza, ligada à oposição, denunciou "uma violação na Suprema Corte". ​

O conflito entre a maioria dos juízes da Suprema Corte e o Poder Executivo é mais um capítulo na polêmica entre Varsóvia e Bruxelas sobre as reformas judiciais realizadas pelo governo. A oposição diz que as mudanças nas regras são um ataque à separação dos poderes e beneficiam a sigla governista. 

O projeto é criticado pela Comissão Europeia, que iniciou na segunda-feira (2) um novo procedimento de infração contra a Polônia para "proteger a independência da Suprema Corte". Esta é a primeira etapa de um processo que pode chegar à Corte de Justiça da UE e que prevê eventuais sanções financeiras ao país.

O assunto foi tema ainda de um debate no Parlamento Europeu nesta quarta. O premiê da Polônia defendeu na casa o direito de seu país de "construir seu sistema judicial de acordo com suas próprias tradições".

"Unidade na diversidade. Este lema da nossa UE não é um slogan vazio", declarou Mateusz Morawiecki diante dos eurodeputados em Estrasburgo (nordeste da França), antes de defender a necessidade de as "identidades nacionais" serem respeitadas.

"Quando acontecem ataques contra o estado de direito, não podemos simplesmente ignorar estes fatos dizendo que são questões nacionais", respondeu o vice-presidente da Comissão, Valdis Dombrovskis.

Dombrovskis disse ainda que a União Europeia continua aberta ao diálogo e reafirmou sua oposição à substituição de 40% dos juízes da Suprema Corte, uma determinação da nova lei.

Na terça-feira à noite, entre 4.000 e 5.000 pessoas se reuniram em Varsóvia para manifestar apoio à presidente da Suprema Corte. Gersdorf agradeceu o apoio e reafirmou que permanecerá no cargo até 2020, de acordo com seu mandato de seis anos, estabelecido pela Constituição.

"Uma lei não pode agir de modo retroativo", afirmou o especialista Marek Chmaj. "Então essa legislação é claramente inconstitucional e pode levar a uma paralisia da Suprema Corte." 

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