Kofi Annan, secretário-geral da ONU por uma década, morre aos 80 anos

Primeiro negro a liderar as Nações Unidas, o ganense ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 2001

O ex-secretário-geral da ONU Kofi Annan, que morreu neste sábado (18) - Leonhard Foeger/Reuters
Genebra e Accra | Reuters, AFP e Associated Press

Kofi Annan, mediador da paz em alguns dos conflitos mais importantes da virada deste século e o primeiro africano negro a ser secretário-geral da Organização das Nações Unidas, morreu na madrugada deste sábado (18). Ele tinha 80 anos.

A morte foi confirmada pela fundação que leva o nome do prêmio do Nobel da Paz de 2001. Segundo o anúncio, ele morreu em um hospital de Berna, Suíça, após uma curta doença não especificada.

“Onde quer que houvesse sofrimento ou necessidade, ele estendeu a mão e tocou muitas pessoas com sua profunda compaixão e empatia”, declarou a fundação.

Kofi Atta Annan, nasceu em  8 de abril de 1938, em uma família de elite em Kumasi (Gana), filho de um governador da província e neto de dois chefes tribais. Fluente em inglês, francês e várias línguas africanas, passou quase toda a carreira nas Nações Unidas, onde ingressou em 1962 como funcionário do departamento de orçamento da Organização Mundial da Saúde (OMS). 

Sua trajetória na ONU inclui passagens por postos na África e na Europa e em quase todas as áreas da organização, da administração do orçamento à manutenção da paz. Como secretário-geral, cumpriu dois mandatos, máximo permitido, de 1º de janeiro de 1997 a 31 de dezembro de 2006.

Annan era casado com a sueca Nane, sobrinha de Raoul Wallenberg, o diplomata que salvou milhares de judeus dos nazistas na Segunda Guerra Mundial (1939-45). Deixa os filhos Ama e Kojo do primeiro casamento, com a nigeriana Titi Alakija, e Nina.

Kojo, consultor de uma empresa suíça que atuava no programa Petróleo por Comida no Iraque sob sanções, foi o pivô de uma investigação de tráfico de influência e corrupção em 2005 envolvendo o pai.

Embora Kofi Annan tenha sido exonerado em inquérito independente, o episódio mancharia seu legado e municiaria pedidos de renúncia. Em 2005, ele aceitou a crítica e admitiu falhas.

Mas o secretário-geral que tentou reformar a ONU e tornou o organismo fundado em 1945 mais proeminente também recebeu reconhecimento em vida. Em 2001, ele e a instituição que comandava receberam o Nobel da Paz.

Seu mandato cobriu um período turbulento nas relações internacionais, que incluiu fracassos, escândalos e guerras cuja saída ele buscou mediar, nem sempre com sucesso. 

Acho que meu momento mais sombrio foi a guerra do Iraque [2003] e o fato de não termos podido impedi-la”, disse em fevereiro de 2013 à revista Time, quando publicado seu livro “Intervenções: uma vida em guerra e paz”, lembrando que a decisão dos EUA e de seus aliados de invadir o país de Saddam Hussein atropelou a instituição.

“Eu trabalhei duro. Estava conversando com líderes de todo o mundo. Os EUA não tiveram apoio no Conselho de Segurança”, disse. “Então eles decidiram ir sem o conselho. Você imagina se a ONU endossasse a Guerra no Iraque, como seria nossa reputação?”

O temperamento de diplomata nunca inibiu Annan de ser franco, qualidade rara em seu posto. Grande parte de seu segundo mandato foi gasta na tentativa de reformar o organismo e convencer os EUA, o maior contribuinte da ONU, a quitar quase US$ 2 bilhões (cerca de R$ 7,8 bilhões) em pagamentos atrasados.

Em seu livro, Annan trata do ônus do principal cargo do sistema multilateral global.​

Pouco antes de se tornar secretário-geral, ele serviu como chefe das forças de manutenção da paz da ONU. Foi nesse  período que as operações enfrentaram dois fracassos: o genocídio de Ruanda, em 1994, e o massacre na cidade bósnia de Srebrenica, em 1995.

Em ambos os casos, a ONU enviara tropas sob o comando de Annan, mas elas não impediram os massacres; no caso de Ruanda, ele admitiu depois que houve demora em agir.

Se atraiu críticas pela limitação nas ações pela paz, Annan também fez da ONU um ator político mais proeminente. Foi na sua gestão que a entidade lançou os Objetivos do Milênio, conjunto de medidas de desenvolvimento ousado para reduzir a desigualdade global, uma das iniciativas mais importantes do organismo em seus 73 anos.

O ganense continuou envolvido em atividades de mediação da paz e promoção do desenvolvimento após deixar o cargo, criando a fundação que leva seu nome, em 2007, instalada em Genebra.

No ano passado, os maiores projetos de sua fundação incluíram a promoção de eleições justas e pacíficas, o trabalho com Mianmar no conflituosos estado de Rakhine, e a luta contra o extremismo e o recrutamento de jovens. 

Ele também se manteve atuante diante de problemas como a crise dos refugiados, além de promover a boa governança, medidas anticorrupção e agricultura sustentável na África. Outra de suas frentes de trabalho inclui esforços na luta contra o tráfico de drogas.

Durante esse período, Annan manteve conexões com muitas organizações internacionais. Ele foi chanceler da Universidade de Gana, membro da Universidade de Columbia, em Nova York, e professor da Escola de Políticas Públicas Lee Kuan Yew, em Cingapura.

 

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