Nicarágua prendeu crianças e demitiu médicos, aponta comissão

Relatório menciona aumento da repressão, de detenções arbitrárias e de fuga para países vizinhos

Estudantes e médicos demitidos de hospitais públicos por tratar feridos em atos antigoverno fazem manifestação em Manágua, na Nicarágua - Inti Ocon - 31.jul.18/AFP
Washington | AFP

A onda de violência na Nicarágua deixou 317 mortos de 18 de abril a 30 de julho, incluindo 12 policiais e 23 civis menores de idade, informou nesta quinta-feira (2) a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).

De acordo com o organismo, ao menos 80 médicos e enfermeiros de dois hospitais públicos que atenderam manifestantes feridos ou manifestaram apoio às manifestações foram demitidos.

Em nota, a CIDH insta o governo do presidente Daniel Ortega "a cumprir efetivamente suas obrigações internacionais em matéria de direitos humanos".

“A comissão condena todos os assassinatos registrados e insta o Estado da Nicarágua a investigar com prontidão e seriedade cada um desses crimes. O Estado deve realizar um registro atualizado, confiável e transparente de todas as mortes", escreveu a relatora do organismo para a Nicarágua, Antonia Urrejola.

A cifra foi verificada pelo Mecanismo Especial de Seguimento para a Nicarágua (Meseni), que está no país centro-americano. Segundo a CIDH, o Meseni "constatou e documentou" a "intensificação da repressão e dos operativos empregados por agentes da polícia nacional e grupos parapoliciais no contexto da chamada 'operação pela paz'".

O Meseni, diz a nota, "recebeu informação alarmante sobre a ativação de práticas de perseguição judicial e de criminalização de pessoas opositoras ao regime de governo, manifestantes, estudantes, ativistas e defensores dos direitos humanos".

"As autoridades teriam realizado numerosas detenções arbitrárias, efetuadas com violência por grupos encapuzados e armados, que teriam mantido pessoas detidas contra sua vontade." 

Segundo a CIDH, essa perseguição se dá num "contexto de declarações estigmatizantes e intimidatórias por partes das autoridades estatais", como qualificar as pessoas de terroristas, golpistas ou delinquentes.

 

Joel Hernández, membro da comissão e relator sobre os direitos das pessoas privadas de liberdade, manifestou ter tomado conhecimento "com suma preocupação do aumento vertiginoso de pessoas detidas sem as garantias do devido processo". A nota chama a atenção para a detenção de duas crianças, de 14 anos e 15 anos, durante cinco dias.

"Fazemos um chamado urgente ao Estado para assegurar o estrito cumprimento da lei e demais garantias processuais de todas as pessoas detidas", escreveu Hernádez. "O Estado deve dar a pronta liberação de todas as pessoas detidas arbitrariamente sob acusações infundadas." 

O organismo chama atenção ainda para a fuga de nicaraguenses do país em consequência da violência, com destino principalmente a Costa Rica, Honduras, Panamá e EUA. Segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur), a Costa Rica registra em média 200 pedidos de asilo por dia e, desde abril, já recebeu cerca de 8.000 solicitações do tipo.

Nesta quinta, o Conselho Permanente da Organização dos Estados Americanos (OEA) se reúne para discutir uma proposta de criação de uma comissão especial para acompanhar a situação da Nicarágua. 

Na quarta, o secretário-geral da OEA, Luis Almagro, defendeu nas redes sociais a "obrigação" do organismo de atuar na Nicarágua.

"A defesa da democracia NÃO é ingerência, é uma obrigação que os países assumiram ao assinar a Carta Democrática", afirmou.

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