Descrição de chapéu The New York Times

Direita populista avança em cidade acolhedora de imigrantes na Suécia

Expectativa é que o partido ganhe um quinto dos votos em boa parte do país nas eleições deste domingo (9)

FLEN (SUÉCIA) | The New York Times

A entrada da pequena mesquita é bloqueada por um portão. Uma janela está rachada em volta de um buraco feito por uma pedra ou um projétil de arma de pressão. Uma porta metálica de segurança foi pintada com uma suástica, que foi apenas parcialmente removida.

Mas Yusuf Abdi, membro da mesquita —abrigada num prédio que foi no passado uma igreja evangélica— diz que não está muito preocupado.  “A Suécia é um país democrático. Há leis e regras”, ele explica.

Hussein Omar, de origem somali, concorda. “Fazemos parte da sociedade, com os mesmos direitos e deveres.”

Pode ser, mas a Suécia do passado está mudando. A imigração e a criminalidade são os temas mais candentes das eleições nacionais no país, neste domingo (9), em que esses direitos e regras serão postos à prova.

A onda de candidatos a asilo que desembarcou na Europa em 2015 foi sentida mais fortemente na Alemanha e na Suécia.

A Suécia recebeu 163 mil refugiados —aproximadamente 1,6% de sua população. Seria o equivalente aproximado aos Estados Unidos acolherem 5,2 milhões de pessoas.

Desde então as atitudes mudaram, e hoje a Suécia está menos acolhedora que antes. Isso pode ser visto até em um lugar como Flen, pequena cidade de 7.000 habitantes situada a duas horas a sudoeste de Estocolmo. As vozes dos moradores da cidade refletem a ansiedade gerada pela nova realidade.

Um dos primeiros campos de refugiados do país foi erguido em Flen nos anos 1970 para acolher refugiados do Vietnã.

No passado um centro ferroviário importante e coração de uma região municipal maior de 17 mil habitantes, Flen conserva uma proporção grande de imigrantes, embora hoje muitos deles sejam originários da Somália e Síria.

Mas o partido de extrema direita Democratas Suecos, abertamente anti-imigração e antieuropeu, passou de uma cadeira na Câmara municipal em 2006 para nove em 2014 (de um total de 45), tornando-se o segundo maior partido na cidade. A expectativa é que ele se saia ainda melhor neste domingo (9).

Mesmo a pequena Flen, com o seu longo histórico de acolher imigrantes, está seguindo a tendência vista em boa parte do país, onde a expectativa é que a extrema direita ganhe um quinto dos votos.

Kicki Johansson, 68 anos, encara as consequências da eleição com muito menos otimismo que seus vizinhos imigrantes.

“Hoje temos camisas marrons demais”, ela falou em um café na praça central de Flen, cercado por lojas que vendem mercadorias baratas.

“O que me assusta são os nazistas.” Segundo ela, muitos suecos estão insatisfeitos com a situação atual. “Não são todos racistas, mas querem que alguma coisa mude. Muitos dos imigrantes também votam dos Democratas Suecos —também eles querem fechar as portas”, ela comentou, indignada. “É ignorância.”

Gote Nilsson é lider dos Democratas Suecos em Flen. “A impressão que temos é que há ventos positivos soprando a nosso favor”, ele disse.

“Estamos sendo recebidos de outra maneira, as pessoas estão mais positivas em relação ao partido, isso é bom. Apesar das campanhas de calúnias e mentiras da mídia, muitas pessoas não se deixam enganar.”

Antes Nillson, 73 anos, votava no Partido Moderado, de centro-direita, mas cinco anos atrás ele se filiou ao Democratas Suecos, farto da criminalidade e da redução da ajuda dada a aposentados.

“Acho que há muita gente em Flen que não se reconhece mais, que considera que gente demais de países não europeus está vindo para cá”, ele comentou.

“É demais, simplesmente. Desse jeito você afasta as pessoas normais, fica difícil conseguir moradia. As pessoas estão vivendo em espaços apertados.”

Nilsson disse que o outro problema principal em Flen é “ordem e segurança. Muitas pessoas não sentem tanta segurança quanto antes. Precisamos de mais polícia nas ruas. Lei e ordem, simplesmente.”

As pessoas “se preocupam muito com o futuro”, ele comentou. “Por sorte, sou velho, então não preciso pensar nisso.” 

Gunnar Sunnarberg diz que é esquerdista “de coração”, mas, aos 80 anos, está preocupado com o que vê. “Muitas pessoas não querem se integrar —querem construir seus próprios califados”, ele disse.

O líder dos Democratas Suecos, Jimmie Akesson, faz campanha em Landskrona, Suécia
O líder dos Democratas Suecos, Jimmie Akesson, faz campanha em Landskrona, Suécia - Johan Nilsson - 31.ago.18/TT News Agency/AFP

“Falar sobre os imigrantes é permitido. Mas não somos autorizados a descrever a situação tal como ela é, com arrombamentos, drogas, trocas de tiros.”

Como em outros países da Europa, o partido populista de extrema direita arrastou todo o espectro político sueco mais para a direita, ao mesmo tempo em que vem tentando suavizar sua imagem e promover a defesa do Estado de bem-estar social sueco.

O Partido Social-Democrata, de centro-esquerda, ainda é o maior do país. Desde a década de 1990, porém, sua parcela dos votos caiu pela metade, e é possível que no domingo o partido acabe com apenas 25% dos votos. O Partido Moderado também vem perdendo espaço.

Os Democratas Suecos, de extrema direita, pode acabar se tornando o segundo maior partido do país, complicando a formação de um novo governo.

Tudo isso preocupa muitas pessoas em Flen, que, além de seu grande contingente de imigrantes, também tem o maior índice de desemprego do país.

O desemprego atinge mais de 40% dos nascidos no exterior e 6% dos nascidos na  Suécia. No âmbito nacional, as cifras são respectivamente 15,1% e 4,4%.

Duas semanas atrás representantes dos principais partidos políticos aceitaram um convite para ir à mesquita de Flen e responder a perguntas.

Todos os partidos estiveram presentes, disse Yusuf Abdi, menos o Democratas Suecos e o pequeno partido Iniciativa Feminista.

“Convidei todos. Todas as vezes, os partidos políticos vêm, querem nossos votos e fazem um discurso atraente, mas depois das eleições não acontece nada”, ele disse com um suspiro.

“É claro que falaram que desta vez vão cumprir o que prometeram.”Anders Jansson, 64, que trabalha numa fábrica de manutenção da Volvo em Flen, falou que seu voto vai para o Partido da Esquerda, previsto para conseguir 10% ou mais dos votos.

Ele gosta da ênfase do partido sobre a igualdade e seu compromisso com os trabalhadores. Jansson criticou o que descreveu como a “normalização” dos Democratas Suecos.

“Isso cria um espaço para os partidos nazistas de verdade conquistarem mais terreno”, ele explicou.

“Parece que as pessoas esqueceram a história. Como Hitler chegou ao poder? Ele começou como um sujeito simpático que defendia a classe trabalhadora.”

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