Eleição da Suécia leva Estado de bem-estar social, sob pressão, ao divã

Percepção de crise imposta por entrada de imigrantes leva a ascensão da direita nacionalista

Lucas Neves
Paris

A Suécia que vai neste domingo (9) às urnas escolher a nova composição de seu Parlamento combina indicadores econômicos sadios, tensões ligadas à integração das centenas de milhares de imigrantes que ali se radicaram nos últimos cinco anos e, para alguns, crise social aguda.

Os últimos dois ingredientes desse coquetel podem catapultar o partido de direita populista SD (Democratas Suecos, na sigla original), de retórica nacionalista e xenófoba, à posição de segunda força política do país.

A ascensão espelha outras no continente. Na Itália e na Áustria, legendas com essa orientação hoje integram os governos centrais. Na Alemanha e na França, tiveram bom desempenho nas últimas eleições majoritárias.

Homem sentado em frente a cartazes do Partido Social-Democratra da Suécia em Estocolmo
Homem sentado em frente a cartazes do Partido Social-Democratra da Suécia em Estocolmo - Ints Kalnins/Reuters

As últimas sondagens apontam um empate técnico entre SD e Moderados (establishment conservador) na vice-liderança, ambos na cola dos sociais-democratas, pontas de lança de um governo minoritário e prestes a amargar uma possível vitória de Pirro, com o encolhimento em relação a quatro anos atrás.

A decadência acusada por certos setores está ligada à percepção sobre o Estado de bem-estar social, sistema que garante acesso gratuito (ou fortemente subsidiado) a serviços como educação e saúde.

Conhecido mundialmente por preconizar (e obter, ao menos temporariamente) o equilíbrio entre justiça social e eficiência econômica, o modelo sueco foi implantado ao longo da segunda metade do século 20, sobretudo em governos social-democratas.

A crise econômica que o país atravessou no começo dos anos 1990 marcou uma inflexão no alcance do braço estatal. “A dívida pública era equivalente a 75% do PIB [hoje, está na casa dos 40%]. Houve cortes na proteção social, ajustes de viés liberal”, explica o sociólogo Wojtek Kalinowski. “A desigualdade, que havia sido reduzida nas décadas anteriores, voltou a crescer.”

Desde então, a contração do gasto público teve repercussões na seguridade (o seguro-desemprego deixou de corresponder a quase 100% do salário prévio), na saúde (a fila para receber atendimento médico por vezes é longa) e na educação (queda do desempenho dos alunos).

“Como os impostos não aumentaram neste período, mas, por outro lado, a população envelheceu, pressionando a demanda, o sistema hoje apresenta fissuras”, diz Kalinowski, autor de “O Modelo Sueco – E se a Social-Democracia não Estivesse Morta?” (tradução literal), lançado na França em 2017. “Apesar disso, ele resiste. A batalha atual é para restaurá-lo.”

Para o sociólogo, os sociais-democratas tentaram fazer isso ao retomar o comando, em 2014, pois tinham margem de manobra: dívida pública baixa, desemprego em queda, agora em torno dos 6,5%, e PIB crescendo mais de 3% na média do último quadriênio.

Mas, para uma parcela expressiva do eleitorado, não parece ter sido suficiente, um ressentimento que o desafio socioeconômico imposto pela entrada maciça de estrangeiros (163 mil apenas em 2015, mais em relação à população do país do que qualquer outra nação europeia) só fez acirrar.

“Os Democratas Suecos não teriam atingido o patamar atual [18% das intenções de voto] se não fosse por essa percepção de crise. Valendo-se dela, qualquer que seja o assunto, educação, saúde, previdência, dizem que ‘não há dinheiro, e a culpa é dos imigrantes’”, afirma Kalinowski.

O premiê Stefan Löfven, que tenta emplacar um segundo mandato, percebeu a extensão dessa animosidade. De 2015 para cá, trocou a política de portas abertas por acenos a quem torce o nariz para a presença de imigrantes.

Novos vistos concedidos passaram a ser temporários e foram impostos limites à vinda de parentes. Nada que chegue perto, porém, da plataforma do SD contra a imigração ilegal: incentivo à delação às autoridades de suecos que protejam, abriguem ou empreguem indocumentados.

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