Descrição de chapéu Venezuela

Como Cuba ensinou a Venezuela a reprimir a dissidência entre os militares

Serviço de vigilância ajuda a manter o poder do ditador Nicolás Maduro

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O ditador Nicolás Maduro em base militar em Caracas, em janeiro de 2019 Palácio de Miraflores/Reuters

Angus Berwick
Caracas | Reuters

Em dezembro de 2007, o venezuelano Hugo Chávez sofreu sua primeira derrota nas urnas. Apesar de ainda ser muito popular entre a classe trabalhadora que o havia projetado ao poder quase uma década antes, os eleitores rejeitaram um referendo que lhe permitiria concorrer à reeleição repetidamente.

Chocado, Chávez voltou-se para um confidente próximo, segundo três ex-assessores: Fidel Castro. O velho líder cubano havia orientado Chávez anos antes de o venezuelano se tornar presidente, quando ainda era mais conhecido por liderar um golpe fracassado.

Agora, o aprofundamento dos laços econômicos tornava Cuba cada vez mais dependente da Venezuela, rica em petróleo, e Fidel estava ansioso para ajudar Chávez a permanecer no poder, segundo esses assessores. O conselho de Castro: garanta o controle absoluto dos militares.

É mais fácil falar do que fazer.

Os militares da Venezuela tinham uma história de revoltas, às vezes levando a golpes do tipo que Chávez, quando tenente-coronel do Exército, organizou em 1992. Uma década depois, os adversários deram um breve golpe contra o próprio Chávez.

Mas se Chávez desse os passos certos, instruiu o cubano, ele poderia se manter por tanto tempo quanto o próprio Castro, lembraram os assessores. Os militares de Cuba, com o irmão de Castro no comando, controlavam tudo, desde a segurança até os principais setores da economia.

Em poucos meses, os dois países redigiram dois acordos, recentemente analisados pela agência Reuters, que deram a Cuba amplo acesso às Forças Armadas da Venezuela —e ampla latitude para espioná-las e modificá-las.

Os acordos, cujas especificidades são relatadas aqui pela primeira vez, levaram à imposição de uma vigilância rigorosa das tropas venezuelanas através de um serviço de inteligência venezuelano hoje conhecido como Direção Geral de Contrainteligência Militar, ou DGCIM.

Sob assessores militares cubanos, a Venezuela transformou a unidade de inteligência em um serviço que espiona suas próprias Forças Armadas, incutindo medo e paranoia e reprimindo a dissidência.

Agora conhecida por suas táticas repressivas, a DGCIM é acusada por soldados, legisladores da oposição, grupos de direitos humanos e muitos governos estrangeiros de abusos, incluindo tortura e a morte recente de um capitão da Marinha detido.

De acordo com documentos analisados pela Reuters, os acordos, assinados em maio de 2008, permitiram às Forças Armadas de Cuba:

  • Treinar soldados na Venezuela
  • Rever e reestruturar partes das Forças Armadas venezuelanas
  • Treinar agentes de inteligência venezuelanos em Havana
  • E mudar a missão do serviço de inteligência de espionar rivais estrangeiros para vigiar os próprios soldados, oficiais e até mesmo comandantes seniores do país.

O primeiro acordo, segundo os documentos, prepararia os agentes de inteligência venezuelanos para "descobrir e confrontar o trabalho subversivo do inimigo". O segundo acordo autorizava as autoridades cubanas a supervisionar a "assimilação" e a "modernização" dos militares da Venezuela.

A presença de oficiais cubanos nas Forças Armadas da Venezuela é conhecida há anos. O ditador Nicolás Maduro, discípulo de Chávez e sucessor cada vez mais combatido, disse em um discurso em 2017: "Somos gratos às Forças Armadas revolucionárias de Cuba. Nós as saudamos e sempre as receberemos".

Mas nenhum dos dois países jamais reconheceu detalhes dos acordos ou a extensão do envolvimento de Cuba.

Em março, depois que o vice-presidente dos Estados Unidos, Mike Pence, denunciou a "influência maléfica" de Havana em Caracas, o ministro das Relações Exteriores cubano, Bruno Rodríguez, minimizou a relação. "Rejeito veementemente repetidas e falsas acusações", ele tuitou, "de treinamento militar cubano, 'controle' ou 'intimidação' na Venezuela."

Nem o Ministério da Defesa da Venezuela nem o Ministério da Informação, responsável pelas comunicações do governo, incluindo as de Maduro, responderam a emails e telefonemas para esta reportagem. As autoridades cubanas não responderam a pedidos da Reuters para comentar.

Onze anos depois de terem sido forjados, os acordos militares provaram ser cruciais para a sobrevivência de Maduro como presidente, segundo especialistas em segurança, pessoas familiarizadas com o governo e políticos da oposição.

Com a ajuda e o treinamento de Cuba, os militares apoiaram Maduro e o ajudaram a superar um colapso econômico, a fome e o crime generalizados e a emigração de mais de 4 milhões de pessoas —mais de 10% da população da Venezuela nos últimos anos.

Em junho, a Reuters explicou como o rearranjo das Forças Armadas e a proliferação de oficiais superiores mantiveram a liderança militar em dívida com Maduro.

Agora, os documentos que estabelecem os acordos da Venezuela com Cuba —e entrevistas com dezenas de membros atuais e antigos das Forças Armadas, funcionários do governo e pessoas familiarizadas com a relação entre Caracas e Havana—  mostram como a ajuda de Castro também foi instrumental.

A transformação da DGCIM, segundo essas pessoas, tem sido particularmente eficaz.

"A missão mais importante para o serviço de inteligência foi neutralizar qualquer ameaça à democracia", disse Raúl Salazar, ex-ministro da Defesa de Chávez, que se opõe a Maduro. "Agora, com Cuba no comando, o governo o usa para permanecer no poder."

Uma vez que Cuba começou a treinar o pessoal da DGCIM, o serviço de inteligência inseriu agentes nos quartéis, muitas vezes vestindo uniformes pretos. Lá, eles compilam dossiês sobre os revoltosos e relatam qualquer sinal de deslealdade, de acordo com mais de 20 ex-militares e oficiais da inteligência venezuelanos.

A DGCIM também começou a escutar os telefonemas de oficiais, incluindo altos comandantes militares, para ouvir conspirações.

A repressão levou a centenas de prisões. Pelo menos 200 oficiais militares estão atualmente detidos, segundo a Assembleia Nacional liderada pela oposição. A organização venezuelana Citizen Control, que estuda as Forças Armadas, diz que o número passa de 300.

Em um relatório de junho de 2017, revisado pela Reuters, a DGCIM acusou um soldado, que se matriculou em uma universidade considerada alinhada com a oposição, de "subversão ideológica e política". Falando pela primeira vez, o ex-tenente contou como foi algemado a uma cadeira em uma sala continuamente iluminada, e espancado até que duas vértebras se quebraram.

"Aqueles dias não tinham fim", lembrou. Ele revelou sua história à Reuters sob a condição de que a agência de notícias use apenas seu primeiro nome, Daniel, e não divulgue sua idade.

Desde sua reconstrução, as filiais da DGCIM aumentaram —de algumas centenas de agentes no início do governo Chávez para pelo menos 1.500 agora, de acordo com ex-oficiais militares.

Um relatório recente da ONU acusou a DGCIM de tortura —incluindo choques elétricos, sufocamento, afogamento, violência sexual e privação de água e comida. Sob Maduro, os agentes da DGCIM foram promovidos a altos cargos, incluindo o comando dos detalhes de sua segurança pessoal.

A repressão, disseram líderes da oposição, intimidou as Forças Armadas. Juan Guaidó, chefe da Assembleia Nacional, denunciou no início deste ano a reeleição de Maduro em 2018 como uma farsa e declarou, com o apoio da maioria das democracias ocidentais, que ele era o líder legítimo da Venezuela.

Mas os pedidos da oposição por uma rebelião militar foram ignorados. "Nós falhamos", disse um alto funcionário da oposição envolvido em tentativas de intermediar negociações com líderes militares. "Não temos nada a oferecer para convencê-los."

'Bastião da dignidade latino-americana'

Para Chávez, as mudanças previstas pelos dois acordos repercutiram em um nível pessoal.

Castro, a quem ele admirava havia muito tempo, foi o primeiro líder internacional a abraçar Chávez como político em ascensão nos anos 1990.

A unidade de inteligência militar da Venezuela, enquanto isso, era dirigida por oficiais aliados da elite conservadora e se opunha à visão de Chávez de transformar um país que, apesar de ter as maiores reservas de petróleo do mundo, sofria uma pobreza desenfreada.

Quando o golpe de Chávez em 1992 fracassou, os oficiais da unidade, então conhecidos como Diretoria de Inteligência Militar, ou DIM, foram encarregados de prendê-lo. Eles inicialmente o prenderam em uma das mesmas celas subterrâneas na sede da DIM em Caracas, onde Chávez mais tarde deteria alguns de seus oponentes políticos, de acordo com vários ex-funcionários.

Meses depois de ser libertado da prisão por causa de um perdão presidencial, Chávez voou em 1994 para Havana, onde Castro, em sua primeira reunião presencial, o cumprimentou no aeroporto.

Em Chávez, Castro via um líder esquerdista do tipo que se tornara raro desde o fim da Guerra Fria. Na vasta riqueza petrolífera da Venezuela, Castro enxergava uma potencial nutrição para uma economia cubana faminta pelo colapso de seu antigo patrocinador, a União Soviética.

Com Castro observando, Chávez, em um discurso na Universidade de Havana, chamou Cuba, então em sua quarta década de governo autoritário, de "um bastião da dignidade latino-americana". Ele prometeu curar a "gangrena" capitalista que afligia a Venezuela.

Após a visita, os dois homens começaram a conversar regularmente, disseram antigos assessores.

No final da década de 1990, a alta inflação, o baixo crescimento econômico e o aumento da pobreza tornaram a mensagem socialista de Chávez atraente para um número crescente de venezuelanos. Em 1998, ele foi eleito presidente. Quase imediatamente, aprofundou as ligações formais com Cuba.

Em outubro de 2000, Castro viajou para Caracas para assinar uma série de acordos econômicos. A Venezuela daria a Cuba petróleo suficiente para suprir a metade de suas necessidades energéticas.

Desde então, a Venezuela enviou pelo menos 55 mil barris por dia à ilha, ou mais de US$ 21 bilhões em petróleo, segundo dados do governo e os preços médios no período. Em troca, Cuba enviou milhares de médicos, professores e especialistas agrícolas para ajudar a diversificar a economia de base da Venezuela.

Em 2002, muitas das elites da Venezuela estavam cansadas de Chávez. Naquele mês de abril, líderes conservadores da oposição se uniram a chefes militares, incluindo altos funcionários da DIM, e detiveram o presidente. Mas o golpe, depois de uma revolta popular maciça em seu nome, fracassou em dois dias.

De volta ao poder, e com a bênção de Castro, Chávez colocou conselheiros cubanos dentro de seu círculo interno para reforçar a segurança, segundo seus antigos assessores e vários ex-oficiais militares. Ele começou um expurgo do serviço de inteligência e outros altos escalões do exército.

Ele nomeou Hugo Carvajal, um tenente-coronel que se juntou ao esforço de golpe de 1992 de Chávez e depois liderou a divisão de investigações da DIM, para ser seu subdiretor. Dentro de dois anos, Carvajal tornou-se seu diretor-geral.

Carvajal começou a modernizar a DIM. Em um email à Reuters, Carvajal disse que o Banco Central da Venezuela forneceu milhões de dólares em dinheiro à DIM para novas tecnologias, incluindo equipamentos de vigilância e um banco de dados para centralizar a inteligência.

O chefe da inteligência lideraria o serviço por quase uma década. Agora fora do escritório, ele foi sancionado pelo Departamento do Tesouro dos EUA por supostamente ajudar os guerrilheiros colombianos. Em abril passado, foi preso na Espanha e permanece detido em resposta a um mandado dos Estados Unidos por suposto tráfico de drogas.

No email, enviado através de seu advogado na Espanha, Carvajal negou as acusações.

Em julho de 2007, Chávez nomeou Gustavo Rangel, um legalista que liderava as reservas do Exército, para ministro da Defesa.

Em seu juramento, Rangel falou da necessidade de "novo pensamento militar venezuelano" para combater o "inimigo real". O "império", disse ele, usando uma abreviação comum de Caracas para os Estados Unidos, estava patrocinando "grupos subversivos" empenhados em destruir a revolução.

A Reuters não conseguiu chegar a Rangel, agora aposentado, para comentar o assunto.

Naquele dezembro, Chávez perdeu o referendo sobre limites de mandato. Na televisão, ele prometeu uma "nova ofensiva" para perseguir o objetivo.

As conversações de defesa com Cuba começaram. Em uma reunião em Caracas em 26 de maio de 2008, Rangel e o general Alvaro López, vice-ministro da Defesa de Cuba, assinaram os dois acordos.

Sob o primeiro, o Ministério da Defesa cubano supervisionaria uma reestruturação da DIM e aconselharia a criação de novas unidades dentro do serviço. A DIM também enviaria grupos de 40 oficiais a Havana por até três meses de treinamento em espionagem.

Segundo os documentos, a Venezuela enviaria currículos de treinamento de candidatos a Cuba para avaliação. Os cursos incluíam como lidar com "colaboradores secretos", como conduzir investigações criminais e como selecionar novos agentes de inteligência.

A maior parte do treinamento, de acordo com os documentos, ocorreu na Academia Militar Comandante Arides Estevez Sanchez, no oeste de Havana. Na academia, um aglomerado de prédios brancos de quatro andares e praças de desfile, instrutores cubanos disseram aos agentes da DIM que sua missão, a partir de então, seria infiltrar-se e controlar os militares, de acordo com cinco pessoas familiarizadas com os cursos.

O segundo acordo criou um comitê conhecido como o Grupo de Coordenação e Ligação da República de Cuba, ou Gruce. O Gruce, composto por oito especialistas militares cubanos, enviaria assessores cubanos à Venezuela para inspecionar unidades militares e treinar soldados.

Um ex-funcionário da inteligência venezuelana lembrou o treinamento que recebeu de instrutores cubanos em uma fazenda no estado de Anzoategui, no leste da Venezuela. Os instrutores, disse ele à Reuters, treinaram os alunos com perguntas sobre suas crenças políticas. A DIM, disseram eles, deve ser a ponta da lança na luta contra os traidores.

Chávez, fortalecido pelos maiores gastos do governo que aumentaram sua popularidade, ganhou um novo referendo para acabar com os limites do mandato. Em 2011, ele mudou o nome da DIM para incluir o termo "contrainteligência", refletindo sua missão de impedir a sabotagem interna. A nova DGCIM foi reforçada por várias centenas de agentes, disseram ex-autoridades.

Saindo do treinamento cubano, os novos agentes começaram a se infiltrar nos quartéis. "Vivemos e treinamos com as tropas para monitorá-las, mantendo os chefes informados", disse outro ex-oficial da DGCIM. "Nós tínhamos mão de ferro."

Alguns agentes fingiam ser soldados regulares. Outros vestiam uniformes da DGCIM e encorajavam regularmente os soldados a se reportarem uns aos outros. Eles vieram a ser conhecidos como "os homens de preto", segundo vários ex-soldados.

"Vou entregá-lo à DGCIM", um comandante de batalhão avisou os futuros rebeldes, lembrou um soldado.

Histórias de detenções e tortura por agentes da DGCIM, por vezes usando máscaras de esqueleto e balaclavas, espalharam-se pelas fileiras.

'Você não pode lutar contra o Estado'

Chávez, após quatro cirurgias em Cuba, morreu em 2013. Castro disse em uma coluna de jornal que ele foi "o melhor amigo que o povo cubano teve na história". Os eleitores elegeram Maduro para sucedê-lo.

Em 2014, os preços do petróleo despencaram. O esforço de Maduro para estimular a economia falhou.

A fome e a escassez atingem até as Forças Armadas. Um médico militar disse recentemente à Reuters que muitos soldados alistados estão abaixo do peso, subsistindo principalmente com massas e lentilhas.

À medida que um número crescente de soldados procurava desertar, a DGCIM tornou-se mais agressiva. Ampliou a vigilância, realizando escuta telefônica de oficiais superiores.

No último andar de sua sede, cerca de 40 agentes da Divisão de Comunicações Operacionais usavam uma plataforma chamada Genesi, segundo um ex-membro da equipe.

O sistema, projetado pela empresa de telecomunicações italiana IPS SpA, permite aos usuários "interceptar, monitorar e analisar todo tipo de fonte de informação", segundo o site da empresa.

A IPS não respondeu a ligações, emails ou cartas pedindo comentários em sua sede em Roma. A Reuters não conseguiu identificar um escritório ou pessoal da IPS que trabalha na Venezuela.

Em julho de 2017, Daniel, o tenente do Exército em Caracas, foi convocado ao escritório do comandante de seu batalhão. Um antigo apoiador de Chávez, Daniel juntou-se ao Exército em 2004, mas sob Maduro perdeu o entusiasmo e disse aos superiores que pretendia sair. Ele se matriculou em aulas de direito em uma universidade local enquanto ainda estava no Exército e participou de algumas marchas da oposição.

O comportamento de Daniel, de acordo com o relatório da inteligência visto pela Reuters, era "contrarrevolucionário". O relatório descreveu a universidade, cujo nome Daniel pediu para não divulgar, como uma escola da oposição.

Ao reportar-se ao gabinete do comandante, disse Daniel, três agentes uniformizados de contrainteligência confiscaram seu telefone e disseram que ele era necessário para uma "entrevista" na sede da DGCIM.

Daniel disse que agentes o transferiram para uma cela subterrânea e o algemaram a uma cadeira. Todos os dias, um homem entrava e lhe dava socos repetidos. Os espancamentos lhe quebraram duas vértebras, de acordo com o relatório de um médico visto pela Reuters. A cela ficava iluminada o tempo todo, fazendo com que Daniel perdesse a noção das horas.

Após 20 dias, um tribunal militar o acusou de traição, rebelião e violação do decoro militar. Enquanto aguardava julgamento, ele foi transferido para outra prisão. Seis meses depois, ao oferecer uma confissão de culpa, o tribunal libertou Daniel com a condição de que ele permanecesse no país. Ele foi expulso do Exército.

Daniel voltou às aulas de direito, mas se arrepende de ter se declarado culpado. "Não tenho certeza se foi a coisa certa a fazer", disse ele, mas observou que muitos que não entram em acordo permanecem detidos indefinidamente. "Você não pode lutar contra o Estado."

A vigilância prejudicou até oficiais superiores.

Um caso provocou indignação nacional, forçando o governo a reconhecer o abuso da DGCIM. Rafael Acosta, capitão da Marinha de 50 anos, morreu sob custódia da DGCIM em 29 de junho, oito dias depois que agentes o prenderam.

Tarek Saab, promotor-chefe da Venezuela, disse que Acosta foi detido por participar de uma conspiração de direita não especificada. A mulher de Acosta, Waleswka Perez, disse que as acusações eram falsas e acusou a DGCIM de tortura.

Em 1º de julho, Saab informou que o governo havia acusado dois agentes da DGCIM pelo homicídio. Ele não deu a causa de morte nem as circunstâncias em que ocorreu. As acusações, disse Saab em um comunicado, seguiram uma investigação "imparcial" sobre o "infeliz acontecimento".

A maioria dos "trabalhos" da DGCIM nunca vêm à luz.

Em março de 2018, cinco agentes da DGCIM convocaram o tenente-coronel Igbert Marin, comandante da 302ª Brigada Mecanizada do Exército, em Caracas. Marin, 40, pai de dois filhos pequenos, durante a maior parte de sua carreira foi uma estrela em ascensão que se destacou na principal academia militar da Venezuela.

Sua mulher, Yoselyn Carrizales, disse que os agentes levaram Marin ao Ministério da Defesa, onde ele foi recebido por autoridades, incluindo o ministro da Defesa, Vladimir Padrino, e Ivan Hernandez, atual chefe da DGCIM.

As autoridades acusaram Marin de conspirar contra o governo, disse Carrizales, que está atuando como um dos advogados de Marin. Eles disseram que tinham evidências em vídeo de Marin e outros oito policiais conspirando, ela acrescentou, mas não mostraram o vídeo.

Marin negou a denúncia, dizendo que a reunião em questão tinha sido apenas um encontro de antigos colegas da academia. Indignado, ele disse ao ministro da Defesa que tais acusações eram contraproducentes, especialmente em um momento em que a maioria dos militares estava sofrendo com a escassez de alimentos, salários e equipamentos.

O ministro deve "deixar seu escritório, abrir os olhos e ver como os soldados realmente se sentem", disse Marin a Padrino, segundo Carrizales. Outro advogado defendendo Marin, Alonso Medina Roa, confirmou seu relato.

Nem Padrino nem Hernandez puderam ser encontrados para comentar.

Os agentes levaram Marin e os outros oito policiais para a sede da DGCIM. Marin disse mais tarde a seus advogados que os agentes o algemaram a uma cadeira, colocaram um saco sobre sua cabeça e o encheram de gás lacrimogêneo. Seus advogados detalharam o suposto abuso.

Uma semana depois, numa audiência em que Carrizales compareceu, um tribunal militar acusou Marin de traição, instigação de rebelião e violação de decoro. Os agentes então levaram Marin embora. Ele permaneceu incomunicável por 78 dias.

"Eu não sabia se ele estava vivo ou morto", disse Carrizales.

Marin permanece detido e sua esposa continua a trabalhar para sua libertação. As autoridades venezuelanas não comentaram publicamente o caso ou mostraram aos advogados de Marin o suposto vídeo. A data do julgamento ainda não foi marcada.

"Eles o temem", disse Carrizales. "Ele é um líder óbvio dentro das Forças Armadas. Foi por isso que o prenderam."

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves 

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