Descrição de chapéu The New York Times

Forças de paz da ONU no Haiti teriam deixado centenas de filhos

Mais de 200 mulheres relatam ter tido filhos de soldados do Brasil, Uruguai e outros países

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The New York Times

As forças de paz das Nações Unidas no Haiti geraram centenas de filhos e os deixaram para trás, segundo descobriram pesquisadoras em um estudo recém-divulgado. As mães solteiras tiveram de lutar com o estigma e a pobreza depois que os soldados partiram do país.

Enquanto a ONU admitiu numerosos casos de exploração e abuso sexual por parte das forças de paz no Haiti e em outros lugares, o estudo sobre vítimas haitianas foi mais longe, documentando o âmbito do problema no país —o mais pobre do Hemisfério Ocidental— além do que se sabia anteriormente.

Soldados brasileiros durante patrulha em Les Cayes, Haiti, em outubro de 2016 - Hector Retamal/AFP

"Meninas de 11 anos foram abusadas sexualmente e engravidadas" por forças de manutenção da paz, que estiveram no Haiti de 2004 a 2017. Algumas das mulheres foram "deixadas na miséria" para criar seus filhos sozinhas, segundo o estudo.

"Eles punham algumas moedas em suas mãos para deixar um bebê em você", disse uma haitiana citada pelas pesquisadoras, cujo trabalho foi publicado na terça-feira (17) no site acadêmico The Conversation, mantido por um consórcio de universidades.

A pesquisa, baseada em entrevistas feitas no verão de 2017 com 2.500 haitianas que moravam perto de bases das forças de paz, descreve um rastro de abuso e exploração deixado por alguns dos soldados e civis que serviram na missão da ONU no Haiti, conhecida como Minustah, sigla de seu nome em francês.

As crianças resultantes são conhecidas como "petits minustahs".

Realizado por Sabine Lee, professora de história na Universidade de Birmingham, e Susan Bartels, cientista clínica na Universidade Queen's em Ontário, o estudo é o mais recente a documentar a má conduta sexual das forças internacionais de paz, incluindo as baseadas em Moçambique, na Bósnia, na República Democrática do Congo e na República Centro-Africana.

Das pessoas entrevistadas pelas autoras, 265 relataram ter filhos de membros das forças de paz, que vieram de pelo menos 13 países, mas principalmente do Uruguai e do Brasil.

"O fato de 10% das entrevistadas terem mencionado essas crianças destaca como essas histórias realmente são comuns", escreveram eles. As pesquisadoras observaram que, ao longo dos anos, as organizações noticiosas relataram casos esparsos no Haiti em que "menores recebiam ofertas de alimentos e pequenas quantias em dinheiro para fazer sexo com o pessoal da ONU".

Enquanto algumas mães contaram aos pesquisadores sobre violência sexual praticada por equipes da organização, a maioria das histórias incluía formas mais sutis de coerção, com as forças de paz trocando pequenas quantias em dinheiro ou comida por sexo com mulheres e meninas que eram extremamente pobres. Em outros casos, as mulheres e seus parentes descreveram relacionamentos consensuais que terminaram quando as forças de paz deixaram o Haiti.

As autoras disseram que as haitianas que residem em comunidades em torno de dez bases da ONU foram questionadas sobre "como é ser uma mulher ou uma menina vivendo em uma comunidade que hospeda uma missão de manutenção da paz". As haitianas não foram questionadas especificamente sobre possíveis abusos ou relações sexuais com as forças de manutenção da paz, mas as próprias participantes levantaram esse tema.

"Comecei a conversar com ele, então ele me disse que me amava e eu concordei em namorá-lo", uma mulher citada teria dito sobre seu relacionamento vários anos antes com um pacificador. "Três meses depois eu estava grávida, e em setembro ele foi enviado a seu país." Ela acrescentou que não podia pagar as taxas para mandar o filho à escola.

Lee, a principal autora do estudo, disse que os Estados membros que contribuem com tropas para os esforços de manutenção da paz da ONU também têm a responsabilidade direta de ajudar a apoiar mães e filhos.

"Não é um problema da ONU, é um problema militar brasileiro ou um problema militar uruguaio", disse. "A ONU, porém, não encontrou uma maneira de responsabilizar as tropas dos países membros."

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