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De casa, fotógrafo captura imagens em tablet para projetar mundo em quarentena

Carlos Donaduzzi percorre ruas do Google Street View a partir das letras da palavra 'isolamento'

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São Paulo

O que as ruas de Oslo e de Nairóbi têm em comum com as de St. Louis durante a pandemia? A julgar pelo trabalho do fotógrafo gaúcho Carlos Donaduzzi, pessoas solitárias que vagam sem rumo em espaços urbanos esvaziados.

Por meio do Google Street View —ferramenta que permite ao usuário visitar virtualmente cidades do mundo—, o artista compilou, de sua casa, em Santa Maria, imagens que projetam o mundo em quarentena.

Na barra de procura do aplicativo, o fotógrafo digitou, uma de cada vez, as letras da palavra “isolamento”.

Clicou no primeiro país ou cidade que apareceu nos resultados e, em seguida, na primeira imagem sugerida pelo Street View. Depois, “caminhou” virtualmente pelos lugares, capturando cenas que o interessavam.

O resultado foi uma série de dez fotografias feitas a distância, realizada durante três dias por meio de um tablet, em um trabalho intitulado “ISOLAMENTO”.

Imagem de rua dos Emirados Árabes capturada no Google Street View
Imagem de rua dos Emirados Árabes capturada no Google Street View - Carlos Donaduzzi

Donaduzzi compara as reproduções que fez das telas com a tradição de fotografia de rua, na qual um fotógrafo flana por uma cidade em busca de imagens —ou do “instante decisivo” tão difundido pelo fotógafo francês Henri Cartier-Bresson.

“Acabei andando, circulando e procurando pelas ruas. Se for pensar nessa lógica da fotografia de rua, desse caçador de imagens, não deixa de ser muito diferente", afirma.

"Claro, estou usando um tablet, é outro tipo de contato. E as imagens ali [no Street View] são fixas, não estou capturando um instante, mas acho que não deixa de ser fotografia.”

Há um quê de solidão em todas os registros, como se as pinturas do americano Edward Hopper se transformassem em fotos.

Em Israel, um homem de camisa branca anda no meio de uma avenida sem carros; em Malta, uma mulher toma sol sentada no degrau de uma escadaria; em Oslo, uma senhora cabisbaixa carrega sacolas.

A inspiração para as fotografias —que dialogam com obras anteriores do artista, também sobre pessoas em situações solitárias— foi a série “New Portraits” (novos retratos), de Richard Prince. Embora diferente no tema, a obra do americano também se vale de capturas de telas da Internet.

Em 2014, Prince se apropriou de retratos publicados no Instagram por celebridades e modelos, sobretudo mulheres. Ele então ampliou as imagens e vendeu cada uma por US$ 100 mil (cerca de R$ 520 mil). A atitude gerou um debate sobre direitos autorais de fotos publicadas em redes sociais.

No caso de Donaduzzi, contudo, essa questão não deve existir, pois o rosto das pessoas nas fotos do Street View são sempre borrados, um padrão para proteger a identidade de quem é fotografado enquanto os carros da empresa captam as imagens das ruas.

As imagens do gaúcho seguem a linha do fotógrafo alemão Michael Wolf. Em 2011, ele registrou a tela de seu computador, em que as ruas de Paris eram exibidas a partir do Google Street View. Ao cortar e reinterpretar cenas cotidianas, Wolf ajudou a recriar a fotografia de rua.

Como Donaduzzi se limitou ao que o algoritmo do Google oferece, há duas imagens de Oslo no conjunto final. Ao digitar a letra “o”, o primeiro país que apareceu na busca foi Omã, mas não é possível visitar as ruas do reinado pelo Street View —há apenas algumas fotos disponibilizadas na plataforma por usuários.

Depois de Omã, a capital da Noruega era a primeira opção disponível, e foi lá que o artista clicou.

Questionado, o Google não explicou à reportagem por que as ruas Omã não estão disponíveis, limitando-se a dizer que o Street View cobre atualmente 87 países.​

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