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Uruguai vai de modelo no combate à pandemia a líder em mortes na região

Especialistas culpam variante brasileira e relaxamento dos cuidados pessoais e de distanciamento

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Buenos Aires

Considerado modelo no combate à pandemia do coronavírus na América do Sul, o Uruguai se tornou, em menos de um mês, o recordista de mortos por milhão de habitantes —superando o Brasil e se estabelecendo na terceira posição no ranking mundial da média móvel de novas mortes.

Ao mesmo tempo em que acompanha a subida dos números, o país vê desmoronar a coesão que se estabeleceu no começo da crise sanitária entre o governo nacional, comandado pelo presidente de centro-direita, Luis Lacalle Pou, e a oposição, liderada pela esquerdista Frente Ampla.

Enfermeiras aguardam para aplicar injeções em centro de vacinação no aeroporto de Ciudad de la Costa, no Uruguai
Enfermeiras aguardam para aplicar injeções em centro de vacinação no aeroporto de Ciudad de la Costa, no Uruguai - Pablo Porciuncula - 8.abr.21/AFP

Nesta terça-feira (20), o mandatário deve se reunir com líderes políticos regionais que pedem mais medidas restritivas para enfrentar a pandemia. Na mesma linha, o presidente recebeu uma carta assinada por médicos e cientistas de várias regiões do país cobrando ações mais duras. Com 3,4 milhões de habitantes, o Uruguai registrou neste domingo (18) uma média móvel de 2.872 casos nos últimos sete dias, somando 164.744 infectados e 1.908 mortos, segundo dados do site Our World in Data.

Sem estabelecer regras rígidas de quarentena nem suspender aulas durante todo o ano passado, Lacalle Pou apostou na "consciência cidadã" e fez um apelo para que a população permanecesse em casa e que tomasse as precauções necessárias. Houve interrupções apenas temporárias em alguns setores do comércio, nos restaurantes e nas obras de construção civil, além das atividades que geram grandes aglomerações como shows e espetáculos ao ar livre.

Com as fronteiras fechadas para estrangeiros não residentes, o país conseguiu ter uma boa performance na primeira etapa da pandemia. "Creio que isso ajudou a instalar o clima de 'já ganhou' entre as pessoas", diz o infectologista Julio Medina, que integra o Grupo Assessor Científico Honorário (GACH), que aconselha a Presidência em relação à Covid-19.

Ele lista como possíveis causas da disparada de casos: o relaxamento dos cuidados pessoais, o aumento de reuniões sociais e familiares no fim de ano e no verão, a mobilidade das pessoas pelo país no período de férias e a chegada da variante brasileira P.1, mais contagiosa. Segundo dados do Ministério da Saúde uruguaio, a P.1 já circula em 16 departamentos do país e é dominante em alguns deles, como Rivera, Rio Negro e Artigas (em 80% dos casos de contágio), e em Montevidéu (59%).

O fechamento das fronteiras, que teve função importante na primeira fase da pandemia, não conseguiu frear as variantes. Em parte porque muitos argentinos com residência no Uruguai puderam viajar, num momento em que a pandemia está em situação crítica do outro lado do Rio da Prata.

Além disso, a fronteira com o Brasil é muito porosa —e não conseguiu parar o espalhamento do vírus, apesar do aumento do controle e da vacinação na região de Rivera.

"É hora de adotar medidas mais duras, fechar mais a circulação para dar tempo de vacinar mais gente, mesmo que isso seja algo impopular", afirma Oscar Ventura, professor da Universidade da República.

A vacinação no país, embora esteja sendo realizada com rapidez, demorou muito a começar. Apenas em fevereiro chegaram os primeiros lotes de imunizantes, enquanto o Brasil e a Argentina já haviam começado suas campanhas.

Também houve muita hesitação na hora de comprar vacinas, e o governo alegou que esperava receber antes os imunizantes do consórcio Covax —algo que acabou não acontecendo. Com o aumento da pressão sobre Lacalle Pou, ele foi atrás de contatos de emergência com laboratórios.

Uma das negociações aproveitou a brecha de um contrato frustrado da Argentina com a Pfizer —que não foi adiante porque o presidente Alberto Fernández considerou que a russa Sputnik V tinha melhor custo-benefício, além de não precisar de ultracongeladores. Assim, a Argentina perdeu a posição de preferência para comprar imunizantes do laboratório americano, embora tenha sediado ensaios clínicos em seu território. Assim, o Uruguai conseguiu garantir 2 milhões de doses desse imunizante.

Além disso, mesmo negociados às pressas, chegaram rapidamente ao país imunizantes da Sinovac e da AstraZeneca. Até agora, o país já aplicou ao menos uma dose da vacina em 30,6%% de sua população, ultrapassando a Argentina, que vacinou 12,1%. Em números absolutos, o Uruguai aplicou uma dose em 1.063.228 pessoas e duas em 294.461.

Em seu último pronunciamento na TV, Lacalle Pou anunciou que as aulas presenciais não seriam retomadas no início do ano letivo e que continuariam assim pelo menos até maio. Mostrou-se irritado e fez críticas aos integrantes do GACH, que tinham se pronunciado publicamente pedindo mais ações do governo. "O GACH não faz política, as decisões políticas quem toma sou eu", afirmou.

Um dos integrantes da comissão, Rafael Radi afirmou que existe no grupo um setor que crê que o governo deveria endurecer as restrições, mas que, por enquanto, o que eles podem é apenas "apresentar um menu de opções" ao governo. "O presidente é quem aceita ou não, acata de forma parcial ou total", disse.

Nas últimas semanas, Lacalle Pou também recebeu críticas por ajudar a mediar a doação de 50 mil doses da Coronavac pelo laboratório chinês à Conmebol, para que sejam imunizados os jogadores que participam de torneios como a Copa Libertadores e a Sul-Americana.

Esse será um dos pontos a serem discutidos pelos prefeitos no encontro com o presidente.

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