Descrição de chapéu União Europeia

Homenagem militar a Merkel tem canção de Nina Hagen e rosas vermelhas

Em cerimônia solene com origem no século 16, primeira-ministra escolhe três músicas tocadas por banda marcial

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Bruxelas

"Aos 16 anos, eu disse baixinho / quero, quero tudo ou nada", diz a primeira estrofe de uma canção que músicos militares tocaram na noite desta quinta-feira (2) para a primeira-ministra Angela Merkel, na homenagem mais solene que um civil pode receber das Forças Armadas da Alemanha.

Chamada de Grosser Zapfenstreich —em referência ao "grande toque" que lhe deu origem, no século 16—, a cerimônia marca a saída de Merkel, 16 anos após ser eleita pela primeira vez como líder da Alemanha.

A primeira-ministra da Alemanha, Angela Merkel, ao lado da ministra da Defesa, Annegret Kramp-Karrenbauer, e de Eberhard Zorn, inspetor-geral das Forças Armadas, em cerimônia em Berlim
A primeira-ministra da Alemanha, Angela Merkel, ao lado da ministra da Defesa, Annegret Kramp-Karrenbauer, e de Eberhard Zorn, inspetor-geral das Forças Armadas, em cerimônia em Berlim - Stefanie Loos/AFP

Mencionado pela primeira vez em 1596, o termo Zapfenstreich descrevia o toque de recolher para que os soldados deixassem a noitada e voltassem ao acampamento. Um oficial ou sargento percorria as estalagens com um baterista e um flautista e batia nas pontas dos barris com seu bastão ou sabre.

Após esse toque, nem mais um trago de cerveja, vinho ou aguardente era permitido, todos os soldados deveriam se recolher, e a desobediência levava a punições severas. O costume militar foi descrito no manual "O Perfeito Soldado Alemão", de 1726.

Transformada na mais solene cerimônia militar, é sempre realizada à noite, e todos os oficiais com patente de general, tenente-general, almirante ou vice-almirante têm direito a ela quando saem da ativa.

Sua forma atual foi criada em 1813, quando um rei prussiano incluiu uma apresentação de armas, uma oração e uma canção militar. A apresentação é rigorosamente coreografada e executada por duas formações de soldados, segurando rifles e tochas acesas, e uma banda marcial. Dura 20 minutos.

O ritual militar começa com um toque da banda marcial, chamadas para os soldados feridos e dispersos durante a batalha e uma saudação aos que tombaram mortos. Soldados tiram os capacetes, seguram-no em frente ao peito com a mão esquerda e ouvem uma oração musical. O hino alemão é tocado depois.

No começo da cerimônia acontece a "serenata", em que a banda marcial toca as músicas escolhidas pelos homenageados —momento que não faz parte da celebração militar. A Grande Zapfenstreich passou a ser feita também para autoridades civis em 1998, na despedida do premiê Helmut Kohl.

Entre os civis, só presidentes, primeiros-ministros e ministros da Defesa podem ser homenageados por essa cerimônia militar, que acontece no pátio da sede do Ministério da Defesa, em Berlim.

Merkel deve se aposentar da política na próxima quarta (8), quando o provável novo premiê, Olaf Scholz, for confirmado no cargo pelos deputados. Ao menos uma das três escolhas de música feitas pela primeira-ministra representou um desafio para a banda militar, além de uma surpresa para os alemães.

Apelidada de "mamãe" em seu país, política conservadora e dona de um estilo tradicional, Merkel, 67, incluiu uma obra da roqueira Nina Hagen, da mesma geração de alemães orientais da qual faz parte.

Hagen se transformou em ícone do punk depois de partir para a Alemanha Ocidental, mas a música escolhida pela líder alemã é de sua fase pop anterior: "Du hast den Farbfilm Vergessen" (você esqueceu o filme colorido) foi lançada em 1974 e, segundo amigos de Merkel, ela a sabia de cor.

A canção é a queixa de uma garota a seu namorado por ele ter esquecido o filme colorido, fazendo apenas fotos em preto e branco dos passeios de fim de semana. Para a mídia alemã, a letra faz uma alusão ao estereótipo de que a vida na Alemanha Oriental era em tons de cinza, quando tinha momentos coloridos.

Enquanto os militares tocavam a melodia, Merkel acompanhou discretamente o ritmo com a cabeça.

A segunda música executada pela banda foi a que fala do "tudo ou nada" aos 16 anos: "Für mich soll's rote Rosen regnen" (deve chover rosas vermelhas para mim), de Hildegard Knef, que termina prevendo: "Devo conhecer milagres completamente novos /Devo desenvolver-me de novo longe do antigo". A terceira escolha é "Grande Deus, Nós Te Louvamos", de Ignaz Franz, uma referência à sua educação protestante.

Na cerimônia, Merkel fez também um discurso, no qual pediu a defesa da democracia contra o ódio, a violência e a desinformação, segundo divulgou o jornal alemão Zeit. "Nossa democracia também vive do fato de que, onde quer que o ódio e a violência sejam vistos como meios legítimos de buscar nossos próprios interesses, nossa tolerância como democratas deve encontrar seu limite."

A primeira-ministra também falou sobre seus 16 anos no comando da Alemanha, período que classificou como "agitado e desafiador". "Ao mesmo tempo, sempre me senti muito realizada." Merkel também disse ter feito seu trabalho com alegria no coração. "É essa felicidade no coração que desejo a todos nós e, em sentido figurado, ao nosso país para o futuro."

Devido à pandemia de coronavírus, que tem provocado números recordes de novos casos da doença no país, o número de convidados foi reduzido e não houve recepção após a homenagem. Merkel, que ficou séria durante quase toda a cerimônia, sorriu no final.

Na partida, pegou para si uma rosa vermelha de um grande ramo e entregou outra a Annegret Kramp-Karrenbauer, sua ministra da Defesa, que também deixa o cargo e assistiu à homenagem a seu lado.

Pacifistas criticam o evento e pedem sua abolição, em razão do destaque dado a ele durante o nazismo.

Com Reuters

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