China censura manifestações contra a invasão russa na Ucrânia

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Igor Patrick
Pequim

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Enquanto tenta se mostrar neutra na Guerra da Ucrânia, a China age para censurar manifestações contra o conflito nas redes sociais.

No domingo (27), fez barulho uma carta aberta escrita por cinco professores de prestigiadas universidades chinesas (Nanjing, Pequim, Hong Kong, Tsinghua e Fudan). Eles criticaram a Rússia e afirmaram "apoiar com firmeza os esforços do povo ucraniano em defender seu país".

"Esta demonstração de poder não apenas vai destruir as conquistas da civilização e os princípios da justiça internacional, como também trazer enorme vergonha e desastre para a nação russa", escreveram os professores.

A carta sumiu das redes sociais pouco tempo depois de divulgada, mas prints do texto continuaram circulando.

Quem também sofreu censura foi a famosa dançarina Jin Xing, ganhadora da Copa Taoli (informalmente conhecida como o "Oscar da dança chinesa'') e seguida por mais de 13 milhões de pessoas no Weibo, espécie de Twitter chinês.

Jin escreveu: "expresse seu ponto de vista pessoal, respeite todas as vidas e continue a se opor à guerra". O perfil dela foi suspenso quando ela reclamou de ser "bloqueada pelo sistema".

Embora a grande maioria dos internautas tenham passado a semana expressando consternação com o conflito, houve também reação de nacionalistas.

  • Um cartaz em chinês pendurado em frente à embaixada canadense em Pequim amanheceu na terça (2) com uma pichação em inglês dizendo "foda-se a OTAN";
Cartaz em chinês pendurado em frente à embaixada canadense em Pequim amanheceu com uma pixação em inglês dizendo 'foda-se a Otan'
Cartaz em chinês pendurado em frente à embaixada canadense em Pequim amanheceu com uma pixação em inglês dizendo 'foda-se a Otan' - Carlos Garcia Rawlings/Reuters

Publicações sexistas sobre mulheres ucranianas também viralizaram. Tudo começou com uma piada entre internautas, que se ofereceram a abrigar "jovens ucranianas de 18 a 24 anos".

Os posts foram censurados após gerarem uma enxurrada de comentários no mesmo tom e reações indignadas.

Desde 2003, quando colocou em funcionamento o chamado "Grande Firewall", o Partido Comunista tem controle praticamente absoluto sobre quais conteúdos ficam ou não disponíveis na internet do país.

Com o advento das redes sociais, o governo desenvolveu um complexo sistema de censura que inclui desde moderadores de conteúdo dedicados a apagar temas políticos sensíveis até a criação de algoritmos que já são capazes de identificar e bloquear tópicos sem interferência humana.

Empresas que não se submetem ao sistema acabam bloqueadas, caso de Facebook, Twitter, Google e, mais recentemente, a rede Clubhouse.

Por que importa: do ponto de vista estratégico, não interessa à China gerar escrutínio popular sobre o conflito neste momento. Parceiro de Moscou, Pequim tenta se cacifar como mediadora entre russos e ucranianos, motivo pelo qual tem evitado criticar abertamente a invasão.

É bastante provável que os censores continuem moderando o fluxo noticioso e as reações online à guerra por dois motivos:

  • Imagens do desastre humanitário promovido por tropas russas podem gerar clamor popular para que os chineses interfiram no conflito;
  • Reações nacionalistas de exaltação a Vladimir Putin minam o controle da narrativa de neutralidade chinesa e atrapalham as opções diplomáticas de Pequim.

o que também importa

O Comitê Paralímpico Internacional (IPC) decidiu banir atletas da Rússia e de Belarus dos Jogos Olímpicos de Inverno, marcados para começar nesta sexta (4) em Pequim. O órgão vinha sofrendo pressão do movimento Atleta Global, que advoga pelos interesses dos esportistas.

No início da semana, o movimento divulgou uma carta aberta cobrando "fortes sanções" pelo IPC aos dois países.

O presidente do IPC, o brasileiro Andrew Parsons, chegou a resistir. Ele afirmou que não tinha poder para banir os dois times sem uma assembleia geral. Com a recusa de várias delegações em participar das competições caso Rússia e Belarus fossem mantidos, Parsons teve que agir.

Anfitriã do evento, a China não se pronunciou sobre a decisão.

A China pode estar se preparando para reabrir as fronteiras do país. Pelo menos essa foi a leitura de observadores e da imprensa após o ex-cientista-chefe do Centro de Controle e Prevenção de Doenças da China, Zeng Guang, escrever sobre o tema no Weibo.

Integrante da equipe que coordenou a resposta inicial à doença no país, Zeng disse na segunda (28) que "em um futuro próximo, em momento apropriado, haverá um roteiro ao estilo chinês sobre como viver com o vírus" da Covid.

  • Segundo o portal SupChina, autoridades governamentais aprovaram o sucesso da bolha criada em torno dos Jogos Olímpicos e poderiam repetir o modelo em conferências e competições esportivas;
  • Além disso, o Paxlovid, medicamento da Pfizer para tratamento caseiro de casos leves e moderados da Covid, foi aprovado em regime emergencial na China no mês passado.


Pequim estaria agora observando como Hong Kong — que adotou a política de Covid Zero mas sofre para conter uma onda causada pela variante ômicron — se comporta no controle ao vírus.

Funcionários trabalham em instalação para isolamento de pacientes com Covid-19 em Tsing Yi, ilha ao sul de Hong Kong. O local tem capacidade para acomodar 3900 pacientes. - Xinhua/Wan Houde

fique de olho

Começa nesta sexta-feira (4) em Pequim o encontro conhecido como Duas Sessões. Mais importante data do calendário legislativo anual do país, o evento recebe políticos vindos de todas as províncias. Na tarde de quinta, um dos porta-vozes do comitê falou com jornalistas e deu indicativos sobre quais serão as prioridades em 2022: comércio exterior, pandemia, atração de investimento estrangeiro e desenvolvimento da "democracia chinesa".

Por que importa: é durante as Duas Sessões que a China vota e discute os principais projetos e planos anuais para o país.

O evento de 2022 deve preparar terreno para a escolha da nova liderança chinesa em novembro. Xi Jiping certamente será reeleito para a secretaria-geral do Partido, mas quem estará ao lado dele permanece um mistério.

para ir a fundo

  • Quer entender mais sobre as Duas Sessões e as expectativas em torno do evento deste ano? O South China Morning Post publicou uma extensa reportagem a respeito, destacando quais serão os principais projetos na pauta de legisladores chineses e o impacto político-econômico das decisões. (paywall poroso, em inglês)
  • O think tank Observa China reinicia o ciclo anual de eventos com um debate sobre empreendedorismo feminino em terras chinesas. A convidada deste sábado (5) é Mara Carneiro, coordenadora do MBA em Business Innovation da FIAP. Inscrições abertas neste link (gratuito, em português)
  • Hong Kong implementou testagem obrigatória para Covid-19 em toda a cidade e ordenou que moradores façam auto-testes em casa. Contudo, o HKFP explica neste texto por que muitos positivados estão escondendo o resultado do governo (gratuito, em inglês)
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