Descrição de chapéu The New York Times

Racista, 'teoria da substituição' inspirou massacres como o de Buffalo

Ideia de que brancos serão extintos foi cunhada por autor francês e aparece em manifestos de atiradores

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The New York Times

Um tema em comum emergiu das 180 páginas de escritos cheios de ódio que Payton S. Gendron, o jovem que matou dez pessoas neste sábado (14) em um supermercado na cidade de Buffalo, postou online: a ideia de que os americanos brancos correm o risco de serem substituídos por pessoas não brancas.

Atiradores vêm citando a ideia racista, conhecida como "a grande substituição" ou "teoria da substituição", em uma série de chacinas e outros atos de violência cometidos nos últimos anos. Associada no passado à extrema direita, a ideia vem se tornando cada vez mais difundida, defendida por políticos e programas de televisão de grande audiência.

Mulheres se abraçam em uma vigília pelas vítimas do massacre em supermercado de Buffalo, nos EUA - Brendan McDermid/Reuters

A teoria tem sido a motivação de vários ataques nos Estados Unidos e em outros países, do massacre de 2019 numa sinagoga em Poway, Califórnia, ao atentado que matou 51 fiéis em duas mesquitas em Christchurch, na Nova Zelândia, no mesmo ano.

A teoria racista foi citada diretamente em um texto de quatro páginas escrito pelo acusado de matar mais de 20 pessoas em El Paso, Texas, em 2019, que disse que o ataque foi lançado em resposta à "invasão hispânica" no estado e explicitou o medo de os hispânicos chegarem ao poder nos Estados Unidos.

Um ano antes, quando 11 pessoas morreram em um ataque a tiros à sinagoga Tree of Life, em Pittsburgh, o acusado havia declarado posições racistas semelhantes, descrevendo como "invasoras" as pessoas auxiliadas por uma agência judaica que dá assistência a refugiados.

Autor francês concebeu teoria

A teoria da substituição foi concebida no início da década de 2010 por Renaud Camus, autor francês que escreveu sobre o medo de um genocídio de brancos, argumentando que imigrantes que têm mais filhos representam uma ameaça a essas pessoas.

Camus vem procurando se distanciar de supremacistas brancos violentos, criticando os massacres, apesar de suas ideias terem sido citadas em vários ataques. Mas ele disse ao New York Times, em 2019, que ainda defende essa teoria.

A ideia de que pessoas brancas devam temer ser substituídas por "outras" vem se alastrando por plataformas online de extrema direita, como o New York Times vem noticiando, e influenciando discussões de nacionalistas brancos americanos.

A teoria também tem estado em evidência em alguns atos de violência. Segundo a organização judaica internacional Liga Antidifamação, cerca de 60% dos homicídios extremistas cometidos nos Estados Unidos entre 2009 e 2019 foram perpetrados por pessoas que defendiam ideologias supremacistas brancas como a teoria da substituição.

"Hoje essa é a ideia que mais inspira violência em massa nos círculos supremacistas brancos", afirma Heidi Beirich, co-fundadora do Projeto Global Contra o Ódio e o Extremismo. "Esse conceito particular superou praticamente todo o restante nos círculos supremacistas brancos, tornando-se a ideia unificadora que atravessa fronteiras."

Especialistas dizem que a crença representa uma mudança no discurso desses grupos. Algumas décadas atrás, os supremacistas frequentemente se proclamavam superiores devido à sua raça. Embora isso ainda aconteça, muitos agora enfatizam que temem ser extintos por pessoas não brancas.

Num ato público racista em Charlottesville, Virgínia, em 2017, os participantes gritaram o slogan "os judeus não tomarão nosso lugar".

Gendron, que é branco e tem 18 anos, expressou pontos de vista semelhantes em seu manifesto, aludindo diretamente à "substituição racial" e ao "genocídio branco".

A primeira página de seu texto continha um símbolo conhecido como "sonnenrad", ou sol negro –dois círculos concêntricos com raios irregulares emanando do centro. A Liga Antidifamação diz que o símbolo era comum na Alemanha nazista e agora foi adotado por supremacistas brancos e neonazistas.

Gendron elogiou o nacionalismo e criticou homens europeus por se deixarem ser "etnicamente substituídos". Ele lamentou a diversidade na América, escrevendo que as pessoas não brancas "deveriam ir embora enquanto ainda podem". Também criticou os progressistas, dizendo que só o que conseguiram fazer foi "ensinar crianças brancas a se odiarem".

Beirich, que leu o manifesto no sábado, disse que o texto parece conter "uma mistureba de todas as ideias supremacistas brancas malucas".

Tradução de Clara Allain 

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