Taiwan acusa China de bloqueio aeronaval devido à visita de Pelosi

Chefe do Legislativo americano visita presidente da ilha; Pequim reage com exercício com munição real

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São Paulo

O governo de Taiwan afirmou nesta quarta-feira (3) que os exercícios militares que a China irá fazer em torno da ilha como resposta à visita da americana Nancy Pelosi a Taipé equivalem a um bloqueio aeronaval de seu território.

Pelosi, uma longeva crítica de Pequim, encontrou-se na manhã desta quarta (3), ainda noite de terça no Brasil, com a presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen, na primeira visita de uma política com seu cargo, o segundo na linha sucessória americana, em 25 anos a Taipé. Ela deixou a ilha por volta das 7h, no horário de Brasília, rumo à Coreia do Sul.

A deputada Nancy Pelosi e a presidente taiwanesa, Tsai Ing-wen, durante encontro em Taipé
A deputada Nancy Pelosi e a presidente taiwanesa, Tsai Ing-wen, durante encontro em Taipé - Escritório Presidencial de Taiwan/AFP

Pequim considerou a viagem, iniciada na terça (2) e que ainda incluirá o Japão, uma provocação e passou dias advertindo os EUA e Taiwan sobre ela, inclusive em um telefonema entre o presidente Joe Biden e o líder Xi Jinping. Pelosi, disse a Casa Branca, viajou por vontade própria e não foi impedida pelo princípio de separação dos Poderes vigentes em Washington, apesar de ter sido advertida de que não seria o melhor momento para tal ação.

Em resposta, a China avisou que fará exercícios militares em seis pontos ao redor da ilha que considera uma província rebelde. Serão simulações aeronavais com uso de tiro com munição real, obrigando grandes áreas de fechamento de espaço para evitar acidentes.

Na prática, como acusa o ministério, isso pode equivaler a um bloqueio, e esse foi o recado de Pequim acerca da capacidade da ditadura comunista de isolar a ilha se assim desejar. Isso já havia sido expresso pela Defesa de Taiwan no fim de 2021, ao avaliar como a China poderia tentar submeter Taipé a sua vontade de integração territorial.

O governo taiwanês diz que ao menos 18 rotas aéreas internacionais serão afetadas pela ações, mas ao mesmo tempo disse trabalhar para evitar atrasos. Tudo dependerá da intensidade e do escopo das manobras chinesas: ao fim, a sinalização da capacidade poderá ser maior do que o dano em si.

Em 1995, após a visita do então presidente taiwanês a Washington, Pequim também lançou mão do mesmo expediente: fez vários exercícios com disparos reais de mísseis em áreas em torno de Taiwan. Só que ali as quatro áreas atingidas ficavam concentradas no norte e no leste da ilha, e não em todo o seu entorno.

De forma calculada, o Comando Militar do Teatro Oriental do Exército de Libertação Popular informou que os exercícios vão durar de quinta (4) a sábado (6), dando assim tempo suficiente para o avião que trouxe Pelosi decolar. Ela havia visitado Singapura e Malásia, e depois da Coreia do Sul irá ao Japão.

Assim, a resposta militar fica aquém de algo mais agressivo e passível de criar um embate armado entre os rivais da Guerra Fria 2.0. A tensão em torno da visita de Pelosi é a pior nos últimos anos entre as potências, e ocorre no contexto do conflito na Ucrânia, no qual a aliada de Pequim Rússia invadiu também um vizinho.

Para todos os efeitos, as Forças Armadas de Taipé disseram que "a soberania de Taiwan foi violada" com os exercícios e que "se manterá em alerta". Mas, salvo outros movimentos chineses como uma até aqui esperada incursão aérea para teste de defesas ou um acidente na área de tiro real, a crise em tese deve ser contida do ponto de vista militar.

Aliados americanos na região não gostaram nem um pouco da provocação. Japão e Austrália pediram que todos os lados moderassem o tom de confronto, e o Strait Times, jornal que reflete a visão do governo de Singapura, acusou Pelosi de exibicionismo. Aos 82 anos, ela deverá deixar a vida pública após provavelmente sair do posto que ocupa, já que o Partido Republicano é favorito para assumir o controle da Câmara nas eleições de novembro.

Mesmo nos EUA as opiniões se dividiram, com observadores democratas criticando a deputada, posto que os esforços do governo de Joe Biden de construir uma aliança na região contra a China ficaram expostos. Seus rivais republicanos, por outro lado, aplaudiram Pelosi.

No encontro com Tsai, Pelosi reiterou o apoio americano à ilha. "Nossa delegação veio a Taiwan para deixar inequivocadamente claro que nós não iremos abandonar Taiwan", disse ela, para quem "a determinação dos EUA em preservar a democracia em Taiwan e no resto do mundo permanece férrea".

A americana afirmou que a China "não pode ficar no caminho de pessoas que venham a Taiwan", ao ser questionada por repórteres se haveria outras viagens de alto nível de autoridades dos EUA à ilha.

A presidente taiwanesa agradeceu a americana "por tomar ações concretas para mostrar seu apoio decidido nesse momento crítico.

Tsai condecorou Pelosi, mais alta autoridade americana a visitar a ilha desde que seu antecessor Newt Gingrich o fez em 1997. Naquela ocasião, os chineses protestaram, mas a presença de um porta-aviões americano na região e sua fraqueza político-militar relativa não levaram a consequências mais sérias.

Agora, com o governo de Xi Jinping em plena reiteração de sua assertividade iniciada em 2012 e às vésperas da recondução do líder a um inédito terceiro mandato em novembro em meio a uma crise econômica, para não falar no ambiente mundial conflagrado, a história é outra.

Antes do encontro com a presidente, Pelosi esteve no Parlamento taiwanês, onde ouviu elogios à sua visita e discutiu temas como o combate à Covid-19 e questões econômicas, como a produção de semicondutores, campo vital da tecnologia no qual Taiwan é líder mundial.

Ela também se encontrou com ativistas pró-democracia, incluindo um veterando do massacre da praça da Paz Celestial, em 1989 na China, e um fugitivo da repressão de Pequim em Hong Kong.

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