Xi reafirma aliança com Putin, mas deixa palavras duras para o russo

No Uzbequistão, líderes se reúnem pela primeira vez desde o início da Guerra da Ucrânia

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São Paulo

Como era previsto, China e Rússia renovaram sua aliança contra o Ocidente liderado pelos Estados Unidos durante o primeiro encontro entre os líderes Xi Jinping e Vladimir Putin desde que o russo invadiu a Ucrânia, 20 dias após a cúpula de 4 de fevereiro que formalizou a entrada de Moscou na Guerra Fria 2.0 entre Pequim e Washington.

De forma significativa, foi o pressionado Putin quem deu nome aos bois na parte aberta do encontro desta quinta (15): agradeceu pela "posição equilibrada dos nossos amigos chineses quando o assunto é a crise na Ucrânia e entendemos suas questões e preocupações sobre o tema".

O dirigente da China, Xi Jinping, e o presidente da Rússia, Vladimir Putin, durante encontro no Uzbequistão - Alexandr Demianchuk/Sputnik - 15.set.22/AFP

O russo também repetiu o que já havia dito após a visita da presidente da Câmara dos Representantes dos EUA, Nancy Pelosi, a Taiwan. Putin disse que os EUA provocam Pequim e que a Rússia apoia o princípio de "uma só China" —ou seja, que a ilha tem de ser absorvida pela ditadura continental.

Afirmou que as Marinhas dos dois países deverão aprofundar sua coordenação no Pacífico, como fazem com exercícios conjuntos iniciados nesta quinta em oposição às articulações dos EUA com aliados como Japão e Austrália. Nenhuma palavra na frente das câmeras sobre o segundo calo atual de Putin, o renovado conflito entre sua aliada Armênia e o Azerbaijão, apoiado pela ambígua Turquia, que ameaça outra fronteira estratégica russa.

Xi, claramente satisfeito, respondeu tocando música para Putin. "A China está disposta a fazer esforços com a Rússia para assumir sua responsabilidade de grandes potências e assumir o papel de guia para injetar estabilidade e energia positiva em um mundo caótico", afirmou.

Música, mas com acordes meticulosamente escolhidos. Isso havia ocorrido há duas semanas, quando Putin encontrou-se com o número 3 do regime chinês, Li Zhanshu, em Vladivostok. O político falou em "ajuda coordenada" da China aos russos na guerra, só para ver esse trecho da fala omitido do comunicado da chancelaria de Pequim.

Tal cuidado expressa o dilema de Xi, que de todo modo tem aberto uma linha de oxigênio econômico ao aumentar as importações energéticas dos russos. Ele pode ter vantagens econômicas com os hidrocarbonetos abundantes e mais baratos que Putin oferta, já que o mercado europeu está se fechando devido à guerra. Além disso, os russos têm o maior arsenal nuclear do mundo.

Mas o prolongamento da guerra, que agora expõe Putin a críticas devido à contraofensiva ucraniana em Kharkiv, dificulta a vida do chinês, que depende de sua relação com o Ocidente. Prestes a cristalizar seu poder pessoal com um inaudito terceiro mandato em outubro, Xi tem uma crise econômica enorme para lidar, cortesia do solavanco de seu mercado imobiliário e as travas dos lockdowns de sua política de Covid zero.

Assim, medir as palavras públicas e deixar os tambores da guerra nas mãos que já estão afundando no conflito é o equilíbrio possível. Naturalmente, ainda há de transparecer algum detalhe do que foi falado a portas fechadas.

A agência chinesa Xinhua disse que Xi prometeu "estender seu forte apoio mútuo em questões relativas aos respectivos interesses centrais", por exemplo.

A reunião ocorreu às margens do encontro da Organização de Cooperação de Xangai, uma entidade criada em 2001 para debater interesses mútuos na Eurásia —nesta reunião, no Uzbequistão, outro adversário dos EUA, o Irã, anunciou que será o nono membro pleno do grupo.

O local do encontro, a mítica Samarcanda que marcava ponto central da antiga Rota da Seda entre a China e o Ocidente, foi palco simbólico das pretensões de Xi. Sua Iniciativa Cinturão e Rota é o maior projeto multinacional de infraestrutura do mundo, apesar de ter perdido o ímpeto inicial.

E Pequim busca maior interlocução e influência na Ásia Central, um território geopolítico que costumava ser russo, pela herança soviética. Com uma economia dez vezes maior do que a russa, tem musculatura para tal, mas o faz com jeitinho: Putin e Xi se reuniram com o líder da Mongólia para anunciar planos de projetos energéticos conjuntos, com o russo enaltecendo a união com a China para a segurança global.

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