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Etiópia agora diz que não abre mão de ações contra rebeldes para retomar diálogo

Secretário-geral da ONU cita pesadelo para população e pede fim imediato do conflito na região do Tigré

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Nairóbi | Reuters e AFP

O conflito entre o governo da Etiópia e as forças separatistas da região do Tigré voltou a ganhar contornos incertos nesta segunda-feira (17). Dias depois de ambas as partes acertarem uma retomada dos diálogos, as forças do primeiro-ministro Abiy Ahmed Ali anunciaram a retomada de Shire, uma das maiores cidades do norte do país, que estava sob controle da Frente de Libertação Popular do Tigré (TPLF).

Enquanto o governo noticiava o avanço, o secretário-geral da ONU, António Guterres, veio a público dizer que "a situação na Etiópia está saindo do controle" e que "a violência e a destruição alcançaram níveis alarmantes".

Tigrínios se reúnem em manifestação na sede da União Africana, em Addis Adaba, Etiópia - Amanuel Sileshi - 4.out.22/AFP

Neste domingo (16), o presidente da União Africana, Moussa Faki Mahamat, havia engrossado os pedidos por um cessar-fogo imediato e incondicional na região, com ambas as partes se dizendo dispostas a segui-lo. Adis Abeba, porém, o fez com a contradição em si da promessa de manter suas operações militares.

"Estamos determinados a encontrar uma resolução pacífica do conflito mediante negociações de paz mediadas pela UA", afirmou o governo etíope, no mesmo comunicado em que se disse "obrigado a tomar medidas defensivas para proteger a soberania e a integridade territorial do país ante repetidos ataques [dos rebeldes]".

Assim, as forças de Ahmed classificaram de "imperativo tomar o controle imediato de todos os aeroportos e infraestruturas" do Tigré.

Os separatistas, de seu lado, se disseram dispostos a um cessar-fogo imediato e exortaram a comunidade internacional a pressionar dois governos: o etíope "a se sentar à mesa de negociação" e o eritreu a remover suas forças do país vizinho. A Eritreia apoia as tropas de Adis Abeba, com soldados auxiliando nas ações militares no norte.

Com efeito, a União Europeia fez esses pedidos, estendendo às forças da TPLF o chamamento para o fim das operações. Diplomatas do Ocidente e mesmo de outros países africanos expressaram preocupação com o envolvimento eritreu, citando o risco de que nem a Etiópia tenha controle sobre o aliado.

Definindo a situação da população local de pesadelo, Guterres ressaltou que "todas as partes devem permitir e facilitar a passagem rápida e sem obstáculos da ajuda humanitária a todos os civis necessitados". Segundo o diplomata, essas entregas estão paralisadas há sete semanas, assim como a assistência em Amhara e Afar, quando 13 milhões de pessoas precisam de auxílio.

De acordo com a ONU, quase 90% das pessoas no Tigré precisam de ajuda, as taxas de desnutrição dispararam e a situação deve piorar neste mês.

A guerra civil eclodiu em novembro de 2020 e se espalhou para regiões vizinhas em meados de 2021. Uma trégua foi acordada em março deste ano, mas acabou interrompida em 24 de agosto, quando foi retomado o conflito entre forças eritreias e etíopes contra os separatistas.

Por trás do conflito estão disputas étnicas históricas. O atual premiê —o primeiro da etnia oromo a assumir o poder— é acusado de perseguir os tigrínios, que governaram a Etiópia por três décadas. Ahmed se tornou premiê em 2018 com o discurso de privilegiar o sentimento nacional em detrimento das divisões. Vencedor do Nobel da Paz, ele passou a implementar reformas liberais, mas rapidamente entrou em atrito com a TPLF, pondo em xeque seu discurso.

Para os líderes do Tigré, os projetos de Ahmed visavam à centralização do poder e, portanto, à perda de autonomia regional —um dos pilares políticos das últimas décadas.

Os enfrentamentos armados já deslocaram milhões de pessoas, empurrando porções consideráveis da região para a fome e deixando um saldo de milhares de civis mortos. A desnutrição afeta entre 16% e 28% das crianças e cerca de 50% das mulheres grávidas e lactantes.

Em setembro, a agência de direitos humanos da ONU disse haver evidências razoáveis de que crimes de guerra foram cometidos de ambos os lados —que negam abusos. A retomada dos diálogos, prometida para o começo deste mês na África do Sul, foi adiada, ainda sem confirmação de nova data.

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