Um casal na Nova Zelândia se recusa a permitir que seu bebê de quatro meses seja submetido a uma cirurgia cardíaca usando sangue de doadores vacinados contra a Covid. O caso tem chamado a atenção da imprensa internacional por ilustrar os riscos do crescimento do movimento antivax pelo mundo.
O recém-nascido tem um caso grave de Estenose Pulmonar Valvar (EPV), o que significa que sua válvula pulmonar é estreita demais para permitir que o sangue flua do coração para os pulmões normalmente.
A mãe da criança diz desejar que a operação seja feita urgentemente, mas exige a utilização do que chama de "sangue seguro", livre de vestígios de vacinas que usam RNA mensageiro, ou mRNA.
A tecnologia é um dos principais alvos das teorias da conspiração antivacina, que alegam erroneamente que imunizantes do tipo podem modificar o DNA, causar inúmeras doenças ou provocar as mesmas enfermidades que deveriam combater, entre outros supostos problemas.
O banco de sangue da Nova Zelândia afirma que não faz distinção entre materiais de doadores vacinados e não vacinados, enquanto o serviço de saúde pública do Estado atesta que imunizantes não representam qualquer risco para a criança.
Na semana passada, o serviço entrou com uma ação pedindo a guarda temporária do bebê para a realização da cirurgia —o Tribunal Superior de Auckland decide se concede a ele a tutela do recém-nascido nesta terça-feira (6).
A família —representada por uma advogada conhecida pelas posições antivacina— insiste que a intervenção do Estado é desnecessária, já que há doadores não vacinados dispostos a fornecer sangue.
A disputa legal expôs o tamanho do ceticismo em relação ao imunizante contra a Covid em algumas comunidades da Nova Zelândia, país que chegou a liderar a luta contra o coronavírus durante a pandemia.
E chegou à política, com o apoio de Winston Peters —líder do partido populista minoritário Nova Zelândia Primeiro e ex-vice-primeiro-ministro— à família.
"Temos um contexto em que os pais dizem que querem que a doação para o seu filho venha de indivíduos não vacinados, e não consigo entender por que isso não pode ser feito e por que estamos perdendo tempo diante de uma corte", afirmou Peters ao New York Times em reportagem publicada nesta segunda (5).
"A questão não tem a ver com ser a favor ou contra a vacina, ou negar a ciência: está ligada à liberdade, à verdade e a decisões baseadas em fatos."
O caso ainda tem sido apontado por especialistas como particularmente ilustrativo dos perigos do movimento antivax. Segundo eles, os argumentos pseudocientíficos usados pela família exemplificam o alcance das narrativas conspiracionistas e dos fluxos contínuos de desinformação.
Também ao New York Times Sanjana Hattotuwa, da organização neozelandesa Disinformation Project, afirmou que vídeos e textos sobre o caso foram vistos por dezenas de milhares de pessoas no Telegram e em sites que hospedam conteúdos de ultradireita, muitos dos quais incitando os leitores à violência.
Neste mês, um homem de 62 anos foi preso por planejar a derrubada do sistema de energia elétrica do país para chamar a atenção para suas convicções antivacina, naquela que foi a primeira condenação judicial por sabotagem da história neozelandeza.
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