Instabilidade na Síria faz com que ajuda externa vire desafio 4 dias após tremor

Ditador Bashar al-Assad faz primeira aparição pública desde desastre ao visitar locais atingidos e vítimas em hospitais

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São Paulo

Não bastasse a dimensão do terremoto de magnitude 7,8 que atingiu parte da Síria no início desta semana, matando mais de 3.500 pessoas no país, a instabilidade política local tem tornado o envio de ajuda humanitária e os resgates de vítimas ainda mais desafiadores.

Uma série de fatores contribui para agravar a situação. Um deles é o isolamento internacional do regime de Bashar al-Assad —ditador que só nesta sexta-feira (10), quatro dias após o desastre, fez sua primeira aparição pública em alguns dos locais atingidos, ao visitar a cidade de Aleppo.

O ditador sírio Bashar al-Assad visita locais afetados pelo terremoto em Aleppo - AFP

Enquanto várias nações enviaram tropas para as operações de assistência na também arrasada Turquia, onde a contagem de mortes ultrapassou 20 mil, a mesma abundância não foi vista no território sírio.

Os EUA, por exemplo, afirmaram que se fariam presentes nas áreas afetadas por meio de organizações humanitárias, mas reiterou que não pretende dialogar com o regime de Assad. "Seria bastante irônico, se não contraprodutivo, recorrer a um governo que brutalizou seu povo no curso dos últimos 12 anos", disse Ned Price, porta-voz do Departamento de Estado, citando o período de guerra civil no país.

A tática de doar recursos a ONGs, sem intervir diretamente, também foi usada por Reino Unido, França e outros. A exceção foi a Rússia, um dos poucos aliados da ditadura, que prometeu o envio imediato de equipes de emergência e disponibilizou 300 militares acampados na região para ajudar nos resgates.

O fato de o embaixador sírio na ONU, Bassam Sabbagh, a princípio exigir que os socorros enviados ao país fossem distribuídos pelo próprio regime para então serem partilhados com "todos os sírios, em todo o território", não colaborou para aliviar a tensão.

Foi só nesta sexta que o regime aprovou a chegada de remessas de ajuda a áreas fora do controle da ditadura, em cooperação com as Nações Unidas, o Crescente Vermelho turco e a Cruz Vermelha internacional. Até agora, o único ponto de acesso a Idlib, área dominada por rebeldes no nordeste do país e uma das mais afetadas pelos tremores, era o Bab al Hawa, na fronteira com a Turquia, passagem criada após resolução da ONU —e que Damasco e Moscou enxergam como uma violação da soberania síria.

Uma das soluções para melhorar o fluxo seria reabrir as fronteiras entre Turquia e Síria, fechadas desde que os países romperam relações diplomáticas, em 2011, com a explosão da guerra civil sob Assad.

Sob anonimato, um membro do governo turco afirmou que está sendo estudada a possibilidade de reabrir um ponto de acesso entre as províncias de Hatay, na parte turca, e Latakia, controlada pelo regime sírio, ambas muito afetadas pelo sismo. Mas não houve, até agora, anúncios oficiais nesse sentido.

Enquanto as negociações se arrastam, ONGs que atuam em áreas controladas por rebeldes se queixam não só da demora na ajuda, como da escassez do envio de equipamentos especializados. Socorristas têm recorrido a ferramentas simples e guindastes antigos, inadequados para desastres dessa magnitude.

Raed Al Saleh, líder dos Capacetes Brancos, grupo formado por voluntários da Defesa Civil Síria, organização acostumada a realizar resgates de sobreviventes em edifícios atingidos por ataques aéreos durante a guerra civil, descreveu a atuação das Nações Unidas em Idlib como catastrófica e disse que a organização deveria "pedir desculpas ao povo sírio pela falta de ajuda prestada" após o terremoto.

"Até agora, nenhuma ajuda da ONU chegou ao noroeste da Síria como uma resposta ao terremoto", afirmou Saleh. Ele ainda disse que os primeiros seis caminhões enviados pela entidade à região, na quinta-feira, integravam um comboio regular adiado em razão dos tremores.

Questionado se os 14 caminhões da OIM, agência das Nações Unidas para a migração, que cruzaram a fronteira nesta sexta tinham equipamentos apropriados, o porta-voz da entidade, Paul Dillon, tergiversou. "A questão é que a ajuda humanitária, absolutamente necessária e apropriada para refugiados, incluindo tendas, cobertores e outros materiais, está sendo entregue", disse.

Outro órgão ligado à ONU, o Programa Mundial de Alimentos, alegou estar ficando sem estoques na área. "Ao menos 90% da população regional depende de assistência humanitária, mas precisamos reabastecer", disse a diretora regional Corinne Fleischer.

Os poucos esforços entre grupos opositores na região também não têm surtido efeito. Nesta sexta, por exemplo, um comboio liderado pelas Forças Democráticas Sírias, grupo majoritariamente formado por curdos, alegou não conseguir passar por uma área sob controle de facções rebeldes apoiadas por Ancara.

Líderes de ambos os lados trocaram acusações de politização em torno da ajuda. O comboio, que incluía caminhões-tanque, esperou por horas no ponto de passagem acordado. O porta-voz Jawan Ibrahim disse que a Turquia e alguns setores rebeldes impediram que eles cruzassem a área. Ancara nega.

Com AFP e Reuters

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