Lula propõe a Biden órgão multilateral para o clima em visita à Casa Branca

Presidentes de Brasil e EUA ressaltaram importância da preservação ambiental e fortalecimento da democracia

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Washington

Na primeira reunião entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Joe Biden como presidentes do Brasil e dos EUA, realizada na Casa Branca, em Washington, nesta sexta-feira (10), o petista convidou o líder americano para discutir um mecanismo de governança global que force os países a acatar decisões na área climática.

Em declarações dadas na presença de jornalistas no Salão Oval, os dois líderes destacaram a importância da preservação ambiental e reforçaram a necessidade de fortalecer instituições em defesa da democracia.

"A questão climática, se não tiver uma governança global forte e que tome decisões que todos os países sejam obrigados a cumprir, não vai dar certo", afirmou o petista ao democrata. "Não sei qual é o fórum, não sei se na ONU, não sei se é no G20, não sei se é no G8, mas alguma coisa temos que fazer para obrigar os países, o nosso Congresso, os nossos empresários a acatar decisões que tomamos em nível global."

O presidente Lula cumprimenta o homólogo americano, Joe Biden, em Washington
O presidente Lula cumprimenta o homólogo americano, Joe Biden, em Washington - Jonathan Ernst/Reuters

Já Biden, na toada de retomada dos elos entre os países após dois anos dormentes, disse ver o Brasil como "parceiro natural para enfrentar os desafios atuais, globais e em especial as mudanças climáticas".

A reunião a sós entre Lula e Biden estava programada para durar apenas 15 minutos, mas a conversa levou cerca de 50. De lá, eles tiveram uma reunião ampliada, com a comitiva ministerial que acompanha o petista e parte do gabinete do democrata. Em clima caloroso, bem diferente do encontro que teve com Jair Bolsonaro (PL) no ano passado, Biden disse a Lula ser "uma honra recebê-lo de volta na Casa Branca".

Nas declarações iniciais, o presidente brasileiro, assim como já havia feito em viagem à Argentina, em janeiro, criticou Bolsonaro diversas vezes, ainda que outra vez não tenha citado o nome do rival. "Tivemos um presidente que mandava desmatar, mandava garimpeiros entrarem em áreas indígenas, mandava garimpar nas florestas que demarcávamos como reserva na Amazônia", afirmou Lula.

Ambos os presidentes foram vítimas de tentativas de golpe por parte de apoiadores de seus antecessores, que negavam os resultados das eleições —em 6 de janeiro de 2021 em Washington e em 8 de janeiro de 2023 em Brasília. Assim, a defesa da democracia virou um tema de conexão entre os dois líderes.

"Temos alguns problemas para trabalhar juntos: nunca mais permitir que haja um novo capítulo do Capitólio e que nunca mais haja o que aconteceu no Brasil", disse Lula. Biden iniciou sua fala dizendo que as "duas nações são democracias fortes que foram duramente testadas —e prevaleceram".

Quando o petista disse que o dia de Bolsonaro "começava e terminava com fake news", Biden afirmou que a descrição soava familiar, em comentário referente a Donald Trump, o que gerou risadas na sala.

Lula chegou à Casa Branca às 17h50, no horário de Brasília, e cumprimentou o presidente americano com um aperto de mãos que simbolizou a reaproximação entre Brasil e EUA após dois anos de tensões.

Ele chegou acompanhado da primeira-dama, Janja Lula da Silva, e foi recebido pelo presidente americano no jardim dos fundos da Casa Branca. Jill Biden, mulher do democrata, tomaria um chá com Janja, mas a agenda foi cancelada porque a americana não estava se sentindo bem —ela fez um teste para Covid, e o resultado foi negativo. Janja então fez um tour pela Casa Branca enquanto os presidentes se reuniam.

A visita de Lula a Washington foi cercada de expectativas, depois das relações estremecidas da Casa Branca com Brasília no período em que Biden conviveu com Bolsonaro no comando do país —apoiador de primeira hora do ex-presidente Donald Trump, o ex-presidente ainda ecoou alegações de fraude na eleição americana. Biden e Bolsonaro nunca se falaram por telefone e só se reuniram uma vez.

Pela manhã, Lula se encontrou com o senador Bernie Sanders e com parlamentares democratas na Blair House, onde está hospedado. Um dos principais líderes da esquerda nos EUA, Sanders capitaneou ações de parlamentares americanos por respeito à democracia no Brasil. Ele aprovou no Senado, no fim de 2022, uma resolução instando a Casa Branca a romper relações em caso de golpe de Estado.

Depois, Lula se reuniu com os deputados Alexandra Ocasio-Cortez, Pramila Jayapal, Sheila Jackson Lee, Brad Sherman e Ro Khanna. AOC, como a estrela da ala à esquerda do Partido Democrata é conhecida, afirmou que o presidente brasileiro "é uma inspiração" e mostrou conhecer programas sociais criados em governos petistas, como o Bolsa Família e o Minha Casa, Minha Vida, ambos citados em português.

Enquanto Lula recebia os parlamentares, três bolsonaristas apareceram próximo à Blair House para protestar, chamando-o de ladrão. Outros apoiadores, com caixa de som, gritaram a favor do petista.

O bolsonarista Alessandro Lúcio Boneares, ligado ao grupo de imigrantes Yes Brasil, dirigiu três horas do estado de Nova York até Washington para protestar contra o presidente. Com um megafone, ele gritava "Lula ladrão, seu lugar é na prisão", acompanhado de duas outras pessoas com cartazes contra os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e dizendo que a eleição brasileira havia sido roubada.

Uma das razões para Lula ter se hospedado na Blair House, não em um hotel, era evitar protestos. O local é cercado quando há autoridades estrangeiras, e a segurança é feita pelo Serviço Secreto americano.

A nova embaixadora americana no Brasil, Elizabeth Bagley, viajou a Washington para acompanhar a visita. Ao se encontrar com Lula na última semana, em Brasília, afirmou que estava "muito confiante de que os dois presidentes serão melhores amigos", pois ambos têm "personalidades muito envolventes". Disse ainda que Biden vê Lula "não apenas como líder de seu país, mas um líder regional e global".

A presença de Bagley na Casa Branca contrasta com a situação do Brasil. A visita de Lula à capital dos EUA aconteceu num momento de troca no comando da embaixada brasileira em Washington.

O novo governo indicou Maria Luiza Viotti como nova representante do governo no país, mas o nome dela ainda precisa ser aprovado pelo Senado. O embaixador atual, Nestor Forster, muito identificado com o bolsonarismo, ainda não deixou o posto, mas tirou férias durante a visita para evitar uma saia justa. No período, a embaixada está a cargo de Bernardo Paranhos Velloso, número dois na representação.

Uma visita presidencial com uma embaixada "acéfala" fez com que a viagem fosse toda organizada diretamente por Brasília, com pouca participação da representação brasileira no exterior.

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