Descrição de chapéu África

Herói retratado em 'Hotel Ruanda' é libertado após mais de 900 dias preso

Paul Rusesabagina, que ajudou 1.200 pessoas a escaparem do genocídio no país, estava detido acusado de terrorismo

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Washington | AFP e Reuters

Detido por mais de 900 dias por críticas ao governo de Ruanda, Paul Rusesabagina, que inspirou o herói do filme "Hotel Ruanda", foi solto na noite desta sexta-feira (24), após meses de negociação entre os Estados Unidos e o governo local.

Rusesabagina foi transferido para a residência do embaixador catariano na capital Kigali. Segundo um oficial americano, ele deve permanecer por alguns dias no local antes de viajar ao Qatar, país que ajudou a negociar sua libertação, para então seguir rumo aos EUA.

O presidente americano, Joe Biden, saudou a libertação e a descreveu como um "final feliz". "A família de Paul está ansiosa para recebê-lo de volta aos Estados Unidos, e compartilho sua alegria com as boas notícias de hoje", disse ele, em comunicado emitido pela Casa Branca.

Paul Rusesabagina chega em corte judicial em Kigali - Simon Wohlfahrt - 20.out.20/AFP

Ex-gerente de um hotel de luxo em Kigali, Rusesabagina ajudou 1.200 pessoas a escaparem do genocídio de Ruanda em 1994. Naquele ano, defensores da ideologia extremista Hutu Power tomaram o poder e iniciaram uma onda de violência contra a etnia minoritária tutsi.

Em três meses, um décimo da população do pequeno país, do tamanho do estado de Alagoas, foi assassinada, boa parte a golpes de machete. Hutus que se negassem a participar também eram alvos. Cerca de 800 mil pessoas morreram no total, a maioria da etnia tutsi.

A história de Rusesabagina, 68, inspirou o longa metragem "Hotel Ruanda", indicado ao Oscar em 2005, o que lhe deu notoriedade.

Ele foi preso em 2020 por apoiar a Frente de Libertação Nacional (FLN), um grupo insurgente responsável por ataques em Ruanda nos dois anos anteriores. Rusesabagina foi convidado a viajar para o exterior no que pensou ser uma viagem para palestras, mas então foi sequestrado pelo governo de Ruanda e levado a julgamento.

Pessoas próximas e ele afirmam que o processo foi uma farsa e disseram que o julgamento, que o condenou por oito acusações de terrorismo, estava repleto de irregularidades.

Ele nega qualquer envolvimento nos ataques, mas é um dos fundadores do Movimento Ruandês pela Mudança Democrática, um grupo de oposição ao presidente Paul Kagame do qual a FLN é considerada seu braço armado. Sua sentença inicial era de 25 anos de prisão.

Em uma carta ao presidente Kagame, datada de outubro e divulgada na sexta-feira pelo Ministério da Justiça, Rusesabagina escreveu: "Lamento não ter tomado mais cuidado para garantir que os membros da coalizão MRCD aderissem totalmente aos princípios da não violência".

Ele disse ainda que, se fosse perdoado e libertado, passaria o resto de seus dias nos EUA, onde já morava, "em silenciosa reflexão".

A família de Rusesabagina alertou há tempos que sua saúde estava se deteriorando e temia que ele morresse na prisão. "Ficamos felizes com a notícia de sua libertação. A família espera poder se reunir com ele em breve", declararam em comunicado pessoas próximas a ele.

Em outro comunicado cauteloso, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, refutou a violência política, sem apoiar as acusações de Ruanda contra Rusesabagina. "Os Estados Unidos acreditam em uma Ruanda pacífica e próspera", afirmou Blinken.

"Nós reafirmamos o princípio de buscar uma mudança política em Ruanda por meios pacíficos. Simplesmente não há espaço para a violência política", acrescentou.

A libertação de Rusesabagina foi o resultado de meses de negociações entre Washington e Kigali, com ambos os lados ansiosos para colocar um fim no que descreveram como um fator irritante em sua relação de décadas. Sua prisão havia estremecido as relações entre os dois países.

Os EUA disseram que Rusesabagina foi detido ilegalmente, mas o governo de Ruanda se irritou com as críticas e disse que não seria intimidado. Os EUA alocaram mais de US$ 147 milhões em assistência externa a Ruanda em 2021, tornando-se o maior doador bilateral do país.

Ruanda é governada por Paul Kagame, ex-líder rebelde que derrubou o regime responsável pelo genocídio, de forma incontestável desde a primeira metade dos anos 1990, seja como presidente, vice ou ministro.

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