Israel tem escalada de violência em protestos contra reforma judicial

Governo chama manifestantes de anarquistas; disputa interna se dá em momento de tensão com palestinos

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São Paulo

Milhares de israelenses voltaram a tomar as ruas do país nesta quarta-feira (1º) em novos protestos contra um projeto de lei que ameaça a autonomia do Judiciário.

Se atos anteriores, iniciados há mais de dois meses, já haviam sido palco de embates entre os manifestantes e a polícia, desta vez os confrontos chegaram a um novo patamar com o uso de granadas de efeito moral e canhões de água para dispersar as concentrações.

Na capital Tel Aviv, agentes intervieram para impedir que manifestantes construíssem barricadas nas rodovias. Filmagens mostraram agentes arrastando participantes para fora da pista sob gritos de "vergonha" e "nós somos maioria e estamos ocupando as ruas".

Polícia detém manifestante durante protesto contra proposta de reforma judicial em Jerusalém
Polícia detém manifestante durante protesto contra proposta de reforma judicial em Jerusalém - Ammar Awad/Reuters

De acordo com o jornal Times of Israel, ao menos 50 manifestantes foram detidos. Onze pessoas deram entrada em hospitais, entre as quais um homem que teria perdido a orelha ao ser atingido por uma granada de atordoamento.

A causa que mobiliza o país há semanas é uma polêmica reforma judicial proposta pelo governo do primeiro-ministro Binyamin Netanyahu. Ela permitiria, entre outras medidas, que o Parlamento derrubasse decisões da Suprema Corte por meio de votações com maioria simples —vantagem numérica que a coalizão que sustenta a atual administração, a mais à direita da história de Israel, já possui.

Bibi, como o premiê é conhecido, argumenta que a mudança é necessária para tirar a Justiça das mãos de "magistrados elitistas e tendenciosos". Na prática, porém, ela daria superpoderes ao primeiro-ministro. Além disso, segundo opositores, o plano minaria a independência do Judiciário, enfraquecendo assim o equilíbrio de Poderes, um dos pilares do Estado de Direito.

O projeto ainda não saiu do papel, embora o Comitê Constitucional de Lei e Justiça tenha aprovado partes da legislação em meados de fevereiro. A proposta será enviada para votação em três sessões no Knesset, o Parlamento israelense.

O governo, que havia adiantado que a polícia usaria todos os meios à sua disposição para impedir tumultos, chamou os participantes de "anarquistas". "Não vamos aceitar violência contra a polícia, bloqueio de vias ou infrações da lei. O direito à manifestação não significa direito à anarquia", disse Netanyahu.

Bibi também aproveitou a ocasião para atribuir a Yair Lapid a responsabilidade por semear a discórdia no país. O atual líder da oposição era chanceler e número 2 do governo anterior ao retorno de Netanyahu e chegou a assumir o cargo de premiê quando Naftali Bennett anunciou a renúncia, em junho de 2022.

O opositor reagiu à acusação em uma publicação no Twitter. "Netanyahu, a única anarquia aqui está sendo criada pelo governo que perdeu a capacidade de governar. Qualquer um que deixe Ben-Gvir brincar com explosivos sabe que vai acabar com uma explosão", acrescentou ele, referindo-se ao ministro de Segurança Nacional, Itamar Ben-Gvir, um dos nomes mais radicais da atual gestão.

A disputa política interna se dá ainda em momento de tensão crescente entre o país e a Palestina. No início da semana, Huwara, uma cidade no norte da Cisjordânia, amanheceu em chamas depois que um grupo de colonos israelenses invadiu a área. A ação havia sido uma represália ao assassinato de dois israelenses horas antes, no que o governo havia tachado de um ato de terrorismo —e foi respondida com ainda mais violência, quando um grupo de palestinos matou um cidadão americano-israelense ao abrir fogo contra carros que passavam em uma rodovia próxima à cidade de Jericó.

Nesta quarta-feira, as forças de segurança de Israel mataram um dos palestinos suspeitos de envolvimento no caso do americano-israelense e prenderam outros seis. A operação se deu em uma incursão ao campo de refugiados de Aqabat Jabr, do lado de Jericó.

Israel ainda investiga o ataque de colonos à Huwara —que teve a participação de dezenas de criminosos, de acordo com o major-general Yehuda Fuchs, chefe do Exército na área. Ecoando a fala de organizações humanitárias dias antes, ele descreveu o episódio como um pogrom —o termo designa ataques contra judeus no Leste Europeu comuns nos séculos 19 e 20.

Outro dos membros extremistas do gabinete de Netanyahu, Bezalel Smotrich, disse em entrevista nesta quarta que Israel deveria eliminar a cidade de Huwara —uma solução radical que, na prática, implicaria em um destino potencialmente violento para 7.000 habitantes e que foi descrita pelo Departamento de Estado americano como "irresponsável e repugnante"

Vários dos membros do governo são colonos na Cisjordânia. Ben-Gvir, um deles, defende a anexação do território por Israel e a expulsão de árabes israelenses, isto é, os descendentes de palestinos que permaneceram em suas terras após a fundação do país, em 1948.

Na terça, o ministro, dono de um longo histórico de declarações inflamadas sobre o tema, afirmou que a polícia prendeu um palestino que planejava assassiná-lo. O suspeito, que morava em Jerusalém, teria recebido dinheiro de "elementos terroristas de um Estado vizinho" para cometer o crime, segundo comunicado de Ben-Gvir à imprensa.

Com AFP e Reuters

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