Novo escândalo de abuso sexual na Igreja Católica dos EUA fez quase 2.000 vítimas

Crimes foram cometidos por mais de 450 pessoas em sete décadas nas seis dioceses de Illinois

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São Paulo

Um relatório divulgado nesta terça-feira (23) aponta que quase 2.000 menores de idade foram abusados sexualmente por mais de 450 pessoas ligadas à Igreja Católica em quase sete décadas no estado de Illinois, nos Estados Unidos. Trata-se de um número quatro vezes maior que o divulgado em 2018, quando o governo iniciou a investigação, segundo o jornal americano The New York Times.

Os crimes foram cometidos desde 1950 nas seis dioceses do estado, segundo o documento de quase 700 páginas divulgado pelo procurador-geral de Illinois, Kwame Raoul. O relatório acrescenta 149 nomes à lista de abusadores que as próprias escolas religiosas já haviam identificado na investigação.

Fachada de igreja católica na cidade de Delaware, nos EUA
Fachada de igreja católica na cidade de Delaware, nos EUA - Bonnie Cash - 15.abr.23/Reuters

O relatório acusa padres, funcionários de igrejas e os chamados irmãos religiosos, que prestam contas principalmente a ordens independentes. Os suspeitos foram identificados pelas vítimas em depoimento às autoridades. Os investigadores também revisaram mais de 100 mil páginas de arquivos que eram mantidos pelas dioceses e entrevistaram líderes das instituições e seus representantes.

Ao menos 1.997 pessoas teriam sido abusadas. Um dos casos mais notórios envolve o padre Thomas Francis Kelly, que teria cometido o crime com 15 vítimas de 11 a 17 anos em várias paróquias nas décadas de 1960 e 1970. Uma delas contou às autoridades que tinha só 11 anos quando o homem o convidou para passar a noite na casa paroquial. Na madrugada, o menino foi acordado pelo padre fazendo sexo oral.

Duas outras pessoas que tiveram contato com o mesmo religioso denunciaram experiências semelhantes. Segundo o relatório, o padre foi transferido várias vezes de paróquia, o que indica que outras pessoas sabiam dos crimes. Ele morreu em 1990, aos 53 anos.

A investigação foi iniciada por Lisa Madigan, antecessora de Kwame Raoul na Procuradoria-Geral. Ela decidiu aprofundar o inquérito após identificar diferenças significativas entre o número de pessoas ligadas à Igreja Católica que haviam sido denunciadas e o número divulgado pela instituição.

A Conferência Católica de Illinois estima que os católicos representam cerca de 27% da população do estado, acima da média nacional nos EUA.

Antes de o relatório vir à tona, as seis dioceses católicas de Illinois divulgaram declaração na semana passada sobre sua abordagem às acusações de abuso sexual de menores. O cardeal Blase J. Cupich, arcebispo de Chicago, disse em comunicado que a igreja "tem ficado na vanguarda ao lidar com o abuso sexual de menores por muitos anos".

O posicionamento, contudo, foi rechaçado por organizações que prestam solidariedade às vítimas. "O relatório nos diz claramente que ninguém sabia mais sobre os abusos, e que ninguém fez menos para coibir os crimes que essas próprias dioceses", disse Mike McDonnell, porta-voz do SNAP, grupo que atua em defesa das pessoas que sofreram abuso sexual clerical.

O escândalo nos EUA é mais um capítulo de uma série de denúncias relacionadas a crimes sexuais contra pessoas ligadas à Igreja Católica em vários países. Nesta segunda (22), autoridades da Bolívia anunciaram a abertura de uma investigação para determinar se funcionários da instituição devem ser responsabilizados também por envolvimento em casos de abuso sexual infantil.

A força-tarefa no país andino foi organizada após vir à tona o caso do padre espanhol Alfonso Pedrajas, conhecido como padre Pica. Ele coordenou escolas jesuítas em comunidades bolivianas e admitiu em um diário ter abusado sexualmente de dezenas de menores de idade na década de 1970. O líder religioso morreu de câncer aos 62 anos em 2009, e o escândalo foi revelado pelo jornal El País no mês passado.

Os casos incomodam o papa Francisco. Desde que foi eleito, em 2013, ele vem tomando medidas para tentar erradicar abusos sexuais cometidos por clérigos. Em 2019, o pontífice emitiu um decreto que tornou obrigatório que bispos e padres informem suspeitas de abusos sexuais e permitiu a qualquer pessoa submeter denúncias ao Vaticano. Caso os bispos não informem os casos de abuso, podem ser considerados corresponsáveis pelos crimes. Críticos, contudo, acusam o argentino de responder lentamente a escândalos.

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