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Colômbia enterra chance de regularizar compra e venda de maconha

Mudança na Constituição que permitiria comercialização consegue apenas 47 dos 54 votos de que precisava no Senado

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Buenos Aires

Enquanto o Brasil aguarda julgamento que pode descriminalizar o porte de drogas nesta quarta-feira (21), a Colômbia enterrou a chance de regularizar a compra e a venda de maconha nesta terça (20). O Senado local rejeitou uma mudança sobre o tema na Constituição na reta final de sua tramitação.

Por decisão judicial, o país permite hoje a posse e o consumo de até 20 gramas da erva, exceto em alguns lugares públicos, diferentemente do Brasil, onde essas atividades ainda são consideradas crime e não há limite que distinga o consumo pessoal do tráfico, que é passível de prisão. O Supremo Tribunal Federal (STF) deve retomar caso de oito anos atrás que pode impor esse limite.

Produtor de maconha protesta em frente ao Congresso da Colômbia, em Bogotá, durante último debate sobre comercialização da droga - Juan Pablo Pino - 20.jun.23/AFP

Em Bogotá, a proposta de mudança constitucional, na prática, descriminalizaria a comercialização e permitiria que se criasse um mercado legal de cânabis para adultos. A intenção era investir os impostos do setor em programas de saúde e prevenção focados em crianças e adolescentes, além de reduzir o tráfico ilegal da droga.

O projeto já havia sido apresentado pelo deputado liberal Juan Carlos Losada outras vezes, mas nunca havia chegado tão longe. Ele foi aprovado em sete debates acalorados nos últimos nove meses, incluindo no plenário da Câmara, em maio, por 98 votos a favor e 57 contra. Em uma das discussões, um deputado chegou a oferecer chocolates, chicletes e chá com maconha para convencer os colegas.

Nesta segunda (19), o Senado continuou a oitava e última discussão, mas a votação foi novamente adiada, acabando em insultos e gritos da oposição, que considerou o adiamento uma manobra para evitar a rejeição ao projeto. A sessão foi encerrada quando faltava um congressista para atingir o quórum necessário para votar.

A Casa tinha, então, até esta terça para concluir a votação, quando se encerraria o período legislativo, caso contrário se arquivaria o projeto por não cumprir os prazos estabelecidos. O texto foi finalmente colocado à prova, mas só conseguiu 47 dos 54 votos de que precisava, a maioria simples de um total de 106 senadores. Foi, no entanto, um número maior do que os presentes que votaram contra (43).

Losada, principal voz da reforma, sinalizou que deve tentar mais uma vez: "Claro que é uma derrota dura, depois de quatro anos tentando levar esse projeto de lei adiante, mas avançamos muito. Há quatro anos o projeto caiu no primeiro debate, hoje chegamos ao oitavo. [...] Acho que podemos conseguir melhores consensos no ano que vem e voltar a apresentá-lo", disse em vídeo nas redes sociais.

Se tivesse sido aprovado, o projeto ainda precisaria ser sancionado por Gustavo Petro, o primeiro presidente de esquerda da Colômbia, que teria que divulgar em 12 meses uma política de prevenção ao uso de substâncias psicoativas. Ele se mostrava favorável à descriminalização e já havia dito que "a guerra às drogas fracassou".

A terça-feira foi um dia de derrotas para o presidente. Ele foi alvo de processos massivos da direita pelo país e também não conseguiu que sua reforma trabalhista fosse para frente na última sessão legislativa, que agora depende de ser incluída em sessões extraordinárias. Por outro lado, um novo código eleitoral defendido por ele foi aprovado e agora será revisado pela Corte Constitucional.

A rejeição do projeto da maconha já era esperada, entre outros motivos, porque uma bancada do Senado queria modificar o texto que veio da Câmara para proibir a promoção e a publicidade da erva. Pelos trâmites legislativos, não se pode aprovar esse tipo mudança no mesmo dia em que o projeto é votado.

Cerca de 30 países do mundo já descriminalizaram o porte de uma ou mais drogas para uso pessoal, em diferentes modelos. Isso significa que pessoas que consomem drogas não podem ser processadas criminalmente e presas por usarem essas substâncias, mas estão sujeitas a sanções administrativas.

DESCRIMINALIZAR OU LEGALIZAR? ENTENDA A DIFERENÇA

  • Despenalizar

    Conduta não deixa de ser crime, mas não está mais sujeita a pena de prisão

  • Descriminalizar

    Conduta deixa de ser crime, mas não se torna legal e está sujeita a sanção administrativa

  • Legalizar

    Conduta deixa de ser crime e passa a ser regulada por lei

Nas Américas, segundo dados do Monitor de Políticas de Drogas do Instituto Igarapé, dos 36 países do continente, oito têm o uso de todas as drogas descriminalizado: Colômbia, Argentina, Chile, Costa Rica, México, Peru, Uruguai e Venezuela. Outros sete descriminalizam apenas o uso da maconha.

A região inclui ainda territórios que legalizaram todo o mercado de cânabis para uso medicinal, recreativo ou comercial, regulando produção, venda e consumo: Canadá, Uruguai e boa parte dos EUA.

No Brasil, a expectativa é pelo julgamento no STF da descriminalização da posse. Nesta quarta-feira, o tribunal deve analisar uma ação da Defensoria Pública de São Paulo, parada desde 2015, que pede a inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas, de 2006. O texto considera crime adquirir, guardar e transportar entorpecentes para consumo.

O caso em questão é de um mecânico condenado por portar 3 gramas de maconha enquanto estava preso em 2009. Como a decisão tem repercussão geral reconhecida, o resultado pode ser usado para anulação de penas e orientação de sentenças futuras.

Até agora, três ministros votaram a favor da descriminalização. O relator Gilmar Mendes foi favorável à descriminalização do porte de todas as drogas, enquanto Luís Roberto Barroso e Edson Fachin restringiram seus votos à maconha.

Barroso foi o único que defendeu a criação de parâmetros quantitativos para diferenciar o usuário do traficante. Em seu voto, o ministro sugeriu o limite de 25 gramas de maconha ou o cultivo de até seis plantas fêmeas para configurar uso pessoal.

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