Cidades da Europa recorrem a construções sustentáveis para aliviar onda de calor

Técnicas que incluem pintura reflexiva e fachadas de pedra branca ajudam a manter casas mais frescas

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Jenny Gross
The New York Times

Não existe nenhuma técnica arquitetônica que seja capaz de resolver por si só o problema do calor sufocante que tomou conta de grande parte da Europa neste verão do hemisfério Norte.

Mas em um continente onde o ar condicionado é relativamente limitado, técnicas de construção sustentável podem ajudar a proteger a população, dizem especialistas.

Esses elementos, que incluem pátios, persianas pesadas, pintura reflexiva e fachadas de pedra branca, podem manter as casas frescas e reduzir a necessidade de ar condicionado. O problema, especialmente para as cidades mediterrâneas que vêm enfrentando temperaturas escaldantes neste verão, é que muitas edificações mais novas foram construídas usando estilos ocidentais que retêm o calor, disse Marialena Nikolopoulou, professora de arquitetura sustentável na Universidade de Kent, na Inglaterra.

Casas com paredes brancas na ilha de Chora, na Grécia
Casas com paredes brancas na ilha de Ios, na Grécia - Maria Mavropoulou - 10.ago.22/The New York Times

"Começamos a importar a arquitetura ocidental e esquecemos as tradições locais", disse Nikolopoulou.

Ela estava em Atenas, a capital mais quente do continente –com uma temperatura máxima diária de 33,4ºC, em média, em julho— e uma das mais densamente povoadas. Edifícios altos modernos e o uso de materiais como asfalto em vias públicas retêm o calor, contribuindo para o efeito de "ilha de calor", que torna as cidades mais quentes que as áreas rurais em volta. A onda de calor na Grécia levou a condições de seca extrema que têm alimentado incêndios em partes do país.

Nos Estados Unidos, algumas pessoas e empresas estão investindo em técnicas de baixo custo para ajudar a resfriar construções, como pintar os telhados de branco ou outra cor reflexiva, que possam aumentar a eficiência energética das unidades com ar condicionado. Na Flórida, o condado de Miami-Dade obteve milhões de dólares de recursos federais para ajudar a equipar residências e imóveis comerciais e deixá-los mais frescos no verão.

Em países mediterrâneos como Grécia, Itália, Espanha e Portugal, as casas tradicionais tendem a incluir elementos que permitem a passagem da brisa. Paredes espessas ajudam a absorver o calor durante o dia e liberá-lo à noite, e elementos que fornecem sombra, como pérgolas, também ajudam a manter os moradores refrescados e reduzir a exposição ao sol, disse Catalina Spataru, professora de energia e recursos globais no Instituto de Energia do University College London. Vielas estreitas nos centros de algumas cidades e ruas arborizadas também oferecem sombra para os pedestres.

A Europa vem sofrendo ondas de calor mais frequentes e mais intensas que muitas outras partes do mundo, e muitas casas não possuem ar condicionado. Os governos de Grécia, Itália e Espanha adotaram medidas para proteger a população do calor, entre as quais direcionar as pessoas para espaços públicos em que possam se refrescar, sistemas de aviso de calor extremo e planos para a criação de parques pequenos nos bairros, nos quais a temperatura pode ficar alguns graus abaixo das ruas em volta.

Especialistas em resfriamento dizem que a dependência crescente do ar condicionado, com seu alto consumo de energia, não é uma solução sustentável. Aparelhos convencionais de resfriamento, incluindo ar condicionado e geladeiras, já são responsáveis por até 10% de todas as emissões mundiais de gases estufa, segundo relatório do Banco Mundial publicado em 2019. É o dobro das emissões geradas pela aviação e as viagens marítimas somadas, segundo o relatório.

As vendas anuais de aparelhos de ar condicionado triplicaram em todo o mundo desde 1990, segundo a AIE (Agência Internacional de Energia), organização intergovernamental que fornece recomendações de políticas públicas para o setor energético global. Em 2022, 89% das residências americanas tinham ar condicionado, contra 19% na Europa, segundo a agência.

Especialistas em esfriamento dizem que modificações de estilo de vida são imprescindíveis para a adaptação às temperaturas mais altas, especialmente em lugares onde não há ar condicionado disponível. Essas modificações incluem evitar atividades ao ar livre durante os horários mais quentes do dia, verificar como estão vizinhos vulneráveis e adotar o hábito da sesta, mesmo no norte da Europa e em lugares com climas mais frios onde as pessoas não estão acostumadas a tirar uma pausa do trabalho ou de suas atividades durante o calor da tarde.

As temperaturas no norte da Europa geralmente são mais baixas que no sul da Europa, mas um grande desafio é o fato de que muitas residências são projetadas para conservar o calor. Um exemplo disso é a Escandinávia, onde muitas casas são construídas com materiais mais leves, como madeira, que é ótima para o tempo frio, mas pode dificultar a vida sob calor extremo, disse Spataru. "Há uma consciência crescente de que precisamos projetar casas que sejam mais resilientes a condições climáticas extremas."

Um estudo da Universidade de Oxford publicado neste mês concluiu que Reino Unido, Noruega e Suíça vão sofrer o maior aumento relativo de temperatura em dias de calor incômodo se a meta global de limitar o aquecimento para 1,5ºC acima dos níveis pré-industriais for ultrapassada. (O estudo concluiu que os países da África central sofrerão as temperaturas mais extremas de todas.)

"Os edifícios e as casas do norte da Europa são impróprios para um clima cada vez mais quente", disse Radhika Khosla, professora adjunta especializada em resfriamento e desenvolvimento sustentável na Universidade de Oxford e coautora do estudo. Sem intervenções sustentáveis, a dependência crescente do ar condicionado vai contribuir para um ciclo de queima acelerada de combustíveis fósseis para manter as pessoas refrescadas enquanto o mundo externo se aquece, disse.

Tradução de Clara Allain

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