Brics confirma entrada de Argentina, Arábia Saudita, Emirados, Irã, Egito e Etiópia

Anúncio foi feito pelo presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, ao lado de Lula e de outros líderes do bloco

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Joanesburgo

O presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, anunciou nesta quinta-feira (23) a maior ampliação do Brics, bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, desde a criação do grupo, em 2009.

Foram convidados a ingressar no clube a Argentina, a Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos, o Egito, o Irã e a Etiópia. Assim, o bloco passa a ter 11 membros, com forte presença no Oriente Médio e reforço nas representações da África e da América Latina. De acordo com o líder sul-africano, os novos sócios do Brics entrarão oficialmente no grupo a partir de 1º de janeiro de 2024.

Da esq. para a dir., o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, o dirigente da China, Xi Jinping, o líder da África do Sul, Cyril Ramaphosa, o premiê da Índia, Narendra Modi, e o chanceler da Rússia, Serguei Lavrov, durante a cúpula do Brics, em Joanesburgo
Da esq. para a dir., o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, o dirigente da China, Xi Jinping, o líder da África do Sul, Cyril Ramaphosa, o premiê da Índia, Narendra Modi, e o chanceler da Rússia, Serguei Lavrov, durante a cúpula do Brics, em Joanesburgo - Gianluigi Guercia/AFP

Após o anúncio, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) destacou que o Brics passará a ter um alcance combinado de 35% do PIB mundial em paridade do poder de compra —a participação do G7, grupo das economias mais industrializadas, é de 33%—, além de 46% da população do globo. Também afirmou que o bloco permanecerá aberto para ampliações futuras. "Nossa diversidade fortalece a luta por uma nova ordem, que acomoda a pluralidade econômica, geográfica e política do século 21", disse o petista.

A nova composição é resultado de uma intensa negociação que dominou a cúpula do bloco em Joanesburgo. Além de Lula, participaram das reuniões na capital financeira da África do Sul os líderes Xi Jinping (China), Narendra Modi (Índia) e Ramaphosa. Vladimir Putin, da Rússia, participou virtualmente.

Ele não viajou a Joanesburgo devido a um mandado de prisão emitido pelo TPI (Tribunal Penal Internacional) por supostos crimes de guerra na Ucrânia. A África do Sul é signatária do tratado que criou a corte e, em tese, seria obrigada a prender o russo caso ele desembarcasse em território sul-africano.

Nas negociações sobre a expansão, a China atuou para abrir o Brics a praticamente todos os países que manifestaram interesse em ingressar no bloco. Nessa demanda, Pequim teve apoio da Rússia e da África do Sul. Brasil e Índia, do outro lado, defenderam uma expansão controlada, sob o argumento de que era preciso estabelecer critérios para a escolha das nações que seriam admitidas.

Para concordar com a ampliação, o principal esforço da diplomacia brasileira foi tentar arrancar algum tipo de compromisso da China de apoio à reforma do Conselho de Segurança da ONU. Pequim resistia a endossar mudanças no colegiado porque tem rivais regionais entre os candidatos: Japão e a própria Índia.

Brasil, Índia e África do Sul conseguiram progressos com Pequim. Nesse sentido, a declaração final da cúpula trouxe um reconhecimento mais forte às aspirações desses países de assumirem papéis mais relevantes nas Nações Unidas. No texto negociado, os membros do Brics apoiam uma reforma da ONU, inclusive do Conselho de Segurança, para torná-la mais "democrática, representativa, efetiva e eficiente".

Também defendem aumentar a "representação dos países em desenvolvimento na composição do conselho, para que ele possa responder adequadamente aos desafios predominantes globais".

O documento representa um avanço em relação ao que a China aceitava subscrever até então. Nas reuniões anteriores do Brics, as declarações se limitavam a dizer: "China e Rússia reiteram a importância que atribuem ao status e ao papel do Brasil, da Índia e da África do Sul nos assuntos internacionais e apoiam sua aspiração de desempenhar um papel mais importante na ONU".

No total, mais de 20 países manifestaram oficialmente interesse em fazer parte do Brics. A lista inclui, entre outros, Argélia, Bangladesh, Belarus, Cuba, Marrocos, Nigéria e Venezuela.

Os atuais sócios trabalharam em uma lista de candidatos que incluísse nomes de consenso. Além das seis nações convidadas, a relação de postulantes com maior potencial abrigava também a Indonésia. O país, no entanto, comunicou o governo da África do Sul —que ocupa a presidência rotativa da aliança— que não entrará no grupo neste momento porque atualmente ocupa a presidência da Asean (Associação de Nações do Sudeste Asiático). Assim, seria melhor esperar uma ocasião mais oportuna.

Houve mudanças que só foram definidas no final das negociações. Nas últimas horas, Ramaphosa fez um apelo aos colegas para que a Etiópia fosse incluída, sob a justificativa de que era preciso reforçar a representação da África Subsaariana. Os anfitriões também tentaram emplacar o ingresso de Senegal, mas os demais sócios decidiram priorizar a Etiópia por ser a sede da União Africana.

Havia uma preocupação do Brasil em evitar que o novo Brics se tornasse uma espécie de fórum internacional contra os Estados Unidos e o G7, o grupo das economias mais industrializadas do globo. A avaliação é a de que esse era o objetivo da China ao patrocinar uma expansão que incluísse adversários históricos dos americanos, como Venezuela e Cuba.

O próprio Lula manifestou essa preocupação e disse, na terça (22), que o Brics não pretende ser um bloco antagônico. "A gente não quer ser contraponto ao G7 ou ao G20, nem aos Estados Unidos. A gente quer se organizar. A gente quer criar uma coisa que nunca teve, que nunca existiu. O Sul Global... Nós sempre fomos tratados como se fôssemos a parte pobre do planeta, como se não existíssemos. Nós sempre fomos tratados como se fôssemos de segunda categoria. E de repente a gente está percebendo que podemos nos transformar em países importantes", afirmou o presidente brasileiro, durante uma live.

Se por um lado a ampliação foi menor do que a desejada por Pequim, a entrada do Irã deve, sim, reforçar o componente antiamericano do grupo. O país teve seu ingresso patrocinado principalmente por China e Rússia. Lula, por sua vez, já havia defendido a entrada da Argentina e da Arábia Saudita no Brics.

Outra linha que vinha sendo defendida pelo Brasil era a necessidade de adoção de critérios claros para o crescimento do bloco. No entanto, Celso Amorim, assessor especial de Lula para política externa, deu declarações na quarta que foram na contramão do discurso oficial pregado por autoridades brasileiras.

"Esse negócio de critérios, sabe... Você escolhe os países e aí depois define os critérios", disse ele. "Não vou dizer que é um critério absoluto, mas é natural que você procure algum equilíbrio geográfico. Países que representem uma certa diversidade. O Brasil não tem problema com nenhum nome colocado."

Houve outros temas nas negociações que esbarraram em divergências entre os atuais membros do Brics. Um deles foi o compromisso político com medidas de desdolarização do comércio exterior e de adoção de moedas de referência diferentes da divisa americana. Rússia e China —que enfrentam sanções dos EUA— foram as defensoras de uma linguagem mais ousada em relação ao tema. A mais resistente foi a Índia, que tem se aproximado de Washington e vê em Pequim um adversário.

O resultado foi um parágrafo que destacou a importância de incentivar o uso de moedas locais no comércio internacional e nas transações financeiras entre os países do Brics. Os líderes orientaram seus respectivos ministros das Finanças a "avaliar o tema das moedas locais, instrumentos e plataformas de pagamento e produzir um relatório até a próxima cúpula".

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