Em Angola, Lula questiona pagamento da dívida de países africanos ao FMI

Presidente brasileiro ainda diz que Conselho de Segurança da ONU 'faz a guerra' e cobra reforma ampla

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Fabiana André
Luanda

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) questionou nesta sexta-feira (25), durante viagem a Angola, a modalidade do pagamento da dívida que os países africanos possuem com o Fundo Monetário Internacional (FMI), atualmente próxima de US$ 800 bilhões (R$ 3,9 trilhões). A declaração foi feita perante cerca de 800 empresários brasileiros e angolanos no Fórum de Negócios Angola-Brasil.

"Os países africanos estão com uma dívida de quase US$ 800 bilhões com o FMI. Por que o fundo não faz um acordo e transforma essa dívida em dinheiro para investir no desenvolvimento em vez de pagar para ele? Ou fazer as obras no continente africano, sobretudo, a questão energética?", questionou.

Lula cumprimenta o ministro das Relações Exteriores de Angola, Tete António, em Luanda
Lula cumprimenta o ministro das Relações Exteriores de Angola, Tete António, em Luanda - Divulgação Presidência do Brasil via AFP

Em Luanda desde a noite de quinta-feira (24) para uma visita de dois dias após a cúpula do Brics em Joanesburgo, na África do Sul, Lula se reuniu com o presidente angolano, João Lourenço. O petista viaja com uma delegação composta por seis ministros e 170 empresários brasileiros e justificou a visita dizendo que a "Angola é importante porque dá estabilidade". "Angola paga, não vive devendo", disse.

"Voltamos à África para dizer aos empresários brasileiros e angolanos que vamos voltar a financiar os países africanos. Vamos voltar a fazer investimento na Angola, que é um bom pagador das coisas que o Brasil investiu aqui", disse, acrescentando que o país africano sempre "deu certeza de que cada dólar investido seria ressarcido", em referência à quitação, até 2019, de uma dívida que tinha com o Brasil.

Além de defender que o FMI transforme a dívida dos países africanos em obras, Lula voltou a pedir uma reforma ampla no Conselho de Segurança das Nações Unidas, acusando o órgão de "fazer guerra". "A ONU de 2023 está longe de ter a mesma credibilidade de 1945 [ano de fundação]. O Conselho de Segurança, que deveria ser da paz e tranquilidade, é o conselho que faz a guerra sem conversar com ninguém."

Lula enalteceu a expansão do Brics, que a partir de janeiro de 2024 terá seis novos membros, e defendeu maior representatividade no organismo com a entrada de países da África, da América Latina e da Ásia. "A Rússia vai para a Ucrânia sem discutir com o Conselho de Segurança. Os EUA vão para o Iraque [...]. Ou seja, quem faz a guerra são os países do Conselho de Segurança, quem produz e quem vende armas são os países do conselho. Está errado", disse o presidente, acrescentando que a ONU está "enfraquecida".

No seu discurso no Fórum de Negócios, o presidente angolano aproveitou para propor ao seu homólogo brasileiro uma aproximação entre a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), principal grupo multilateral do sul do continente africano, e o Mercosul, bloco que reúne países sul-americanos.

Com PIB de US$ 470 bilhões (R$ 2,3 trilhões) e população estimada em 210 milhões de habitantes, a SADC reúne 16 países da região sul de África: Angola, Botsuana, Comores, República Democrática do Congo, Essuatíni, Lesoto, Madagáscar, Maláui, Maurícias, Moçambique, Namíbia, Seychelles, África do Sul, Tanzânia, Zâmbia e Zimbábue.

Antes, na sexta, Lula convidou Angola para participar em dezembro da reunião do G20, grupo dos países com as maiores economias do mundo, porque, segundo o presidente, a "África oferece ao Brasil as oportunidades que o país, às vezes, fica procurando em outros lugares".

O presidente brasileiro disse que hoje, o Brics representa 32,1% do Produto Interno Bruto mundial. Com a entrada de mais seis países, passará a responder por quase 37% do PIB global.

Para Lula, isso demonstra "pura e simplesmente, que os países do Sul resolveram se organizar", e uma reaproximação com o continente africano traria benefícios não apenas ao país, como ao Mercosul. O petista ainda voltou a criticar Jair Bolsonaro (PL) devido ao distanciamento do antecessor com a África.

"O Brasil se afastou. Por falta de visão de longo prazo. Ou por falta do imediatismo de achar que o investimento tem que trazer um retorno no dia seguinte. Não é assim que as coisas acontecem. A volta do Brasil ao continente africano não deveria ser uma volta, porque nós nunca deveríamos ter saído do continente africano. O Brasil não tem noção de quantas coisas nós poderemos fazer junto com os países do continente africano", disse Lula.

O presidente brasileiro foi condecorado com a mais alta distinção do governo de Angola, a medalha António Agostinho Neto. Ele conclui neste sábado (26) a visita a Angola após um encontro com a comunidade brasileira residente no país, estimada em 27 mil cidadãos —a maior comunidade no continente africano, seguida da África do Sul, com três mil.

A visita de Lula a Luanda resultou na assinatura de acordos em diferentes áreas, com destaque para a Defesa, que prevê o fortalecimento da Marinha de Guerra Angolana e a formação de tropas nacionais para a Organização das Nações Unidas (ONU).

Depois de Angola, Lula viaja neste domingo (27) para São Tomé e Príncipe, onde participará da 16ª conferência da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

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