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Um ano após morte de Mahsa Amini, perseguição se concentra em quem conta sua história

As grandes vítimas são, é claro, os iranianos, mas o resto do mundo também é afetado

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Washington

Iranianos lembram um duro aniversário neste sábado (16). Faz um ano que foram às ruas protestar contra o governo, no que se tornou uma das ameaças mais graves ao regime dos aiatolás desde a criação da República Islâmica em 1979.

O aniversário pesa porque, apesar de algumas vitórias, os manifestantes amargaram também diversas derrotas. Entre elas, o recrudescimento da perseguição à imprensa —isso em um país já conhecido pela restrita liberdade de expressão.

Mulher sem véu em cima de veículo em estrada no Irã diante de pessoas a caminho de cemitério após morte de Mahsa Amini, em 2022
Mulher sem véu em cima de veículo em estrada no Irã diante de pessoas a caminho de cemitério após morte de Mahsa Amini, em 2022 - UGC - 26.out.22/AFP

Em relatório recente, a organização Repórteres Sem Fronteiras afirmou que o regime iraniano deteve 79 jornalistas desde o início dos protestos —31 deles são mulheres. Essa entidade, com base em Paris, descreve essas prisões e acusações arbitrárias como "um labirinto de repressão estatal". Dos 79 jornalistas que foram presos, 12 ainda estão atrás das grades.

Os protestos começaram há um ano com a morte de Mahsa Amini. A polícia religiosa tinha acusado essa jovem de 22 anos de violar o código de vestimenta do país, que obriga as mulheres a cobrir o cabelo. Sua morte foi um lembrete da violência de um regime que se apoia em interpretações radicais do islã.

Manifestantes aproveitaram a mobilização histórica para reivindicar mudanças estruturais no país. O Irã passa por uma severa crise econômica, agravada pelas sanções internacionais. Agarrando-se ao poder, o regime respondeu com brutalidade. Mais de 500 pessoas morreram e outras 22 mil foram detidas desde o início do levante.

As autoridades iranianas querem silenciar a oposição. Nesse contexto, a detenção de jornalistas, entre os milhares de outros presos, é uma medida estratégica. A ideia é impedir a circulação de informação, vital ao funcionamento de uma sociedade saudável.

Alguns repórteres foram presos durante os protestos. Outros, dentro de suas casas ou nas Redações dos veículos para os quais trabalham. Enfrentam acusações graves —e vagas— resumidas com frases como "propaganda contra o Estado", "conluio contra a segurança pública" e "colaboração com um país hostil".

Quem passou algum tempo no Oriente Médio conhece bem esse vocabulário. É o tipo de coisa que o regime egípcio, outro notório violador da liberdade de imprensa, usa. São termos que dizem, em resumo, que o detento incomoda os ditadores.

O relatório da Repórteres Sem Fronteiras pinta cenários de horror. Jornalistas —como os demais presos— são vítimas de violência física e psicológica. Enfrentam um sistema corrupto que impede que tenham um julgamento justo. Por exemplo, ficam sabendo de última hora que uma audiência foi cancelada. Não podem se comunicar com regularidade com sua família ou seus amigos.

É enganoso o fato de que dezenas dos detidos foram soltos nos últimos meses. Muitos se beneficiaram de uma onda de anistias. Sua liberdade, porém, é condicional. Podem voltar à prisão caso incomodem o regime conservador outra vez. Isso contribui, nesse sentido, para um cenário de autocensura.

As grandes vítimas são, é claro, os iranianos. O resto do mundo, porém, também é afetado. A imprensa internacional depende da vitalidade do jornalismo local, onde recolhe informações valiosas. Além disso, correspondentes e enviados especiais contratam repórteres locais para agendar e traduzir entrevistas —são os chamados "fixers", que muitas vezes não recebem reconhecimento algum.

Apertando o cerco, o regime quer evitar que as informações escapem do país. Outra maneira de fazer isso é ameaçar os jornalistas iranianos que vivem no exterior. As autoridades detêm e interrogam seus familiares que permanecem no Irã, forçando, assim, seu silêncio.

O resultado dessa crise, que já dura um ano, ainda não está claro. Pareceu por um tempo que alguma coisa tinha mudado no país. Algumas mulheres passaram a desafiar o regime, saindo de casa sem o véu.

As autoridades, porém, planejam uma nova onda de repressão e discutem inclusive aprovar medidas ainda mais duras. Em protesto, manifestantes vão voltar às ruas. É onde vão enfrentar o regime mais uma vez, na batalha pelo seu futuro.

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