Sob pressão na guerra, Ucrânia recebe apoio da União Europeia

Chanceleres se reúnem em Kiev com vitória de pró-Rússia na Eslováquia e temor sobre ajuda dos EUA

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São Paulo

O temor da perda de apoio ocidental para o esforço de guerra da Ucrânia contra a Rússia levou os chanceleres da UE (União Europeia) a Kiev nesta segunda-feira (2), na primeira ocasião em que um encontro deste tipo ocorre em um país que não integra o bloco.

"Eu estou certo de que a Ucrânia e todo o mundo livre são capazes de vencer esse confronto. Mas nossa vitória depende diretamente da cooperação com vocês", afirmou o presidente Volodimir Zelenski aos representantes dos 27 países integrantes do grupo.

Chanceleres europeus em foto com Zelenski (ao centro) e autoridades ucranianas em Kiev
Chanceleres europeus em foto com Zelenski (ao centro) e autoridades ucranianas em Kiev - Serviço Presidencial de Imprensa da Ucrânia/Reuters

Apesar das palavras de comprometimento e apoio a Zelenski, duas grandes sombras oriundas do fim de semana cobriram o evento: o temor de uma mudança no apoio militar americano à Ucrânia e a vitória de um partido pró-Rússia na eleição parlamentar da Eslováquia, membro da UE e da Otan, a aliança militar ocidental.

No sábado (30), um acordo emergencial no Senado americano fez passar um projeto de lei sobre gastos federais para evitar, por 45 dias, a paralisação dos serviços do governo. O texto não traz previsão de ajuda à Ucrânia, um dos temas controversos entre a oposição republicana e a situação democrata.

No domingo (1º), o presidente Joe Biden fez um apelo para que a negociação final retome a ajuda nos termos atuais. O país é, de longe, o maior doador militar à Ucrânia. Segundo o Instituto para a Economia Mundial de Kiel (Alemanha), do início da guerra em 24 de fevereiro de 2022 até 31 de julho deste ano, R$ 223 bilhões dos R$ 370 bilhões enviados por Washington a Kiev foram em armamentos.

O chanceler ucraniano, Dmitro Kuleba, tentou minimizar a situação ao receber os colegas europeus. "Nós não sentimos que o apoio americano foi estilhaçado porque os EUA entendem que o que está em jogo na Ucrânia é bem maior do que só a Ucrânia", afirmou, ao lado do chefe da diplomacia da UE, o espanhol Josep Borrell.

Borrell fez um anúncio mais protocolar, dizendo que irá propor um novo fundo de € 5 bilhões (R$ 26,6 bilhões) em 2024 para Kiev.

Kuleba foi menos enfático em relação à outra má notícia para Kiev no fim de semana, a vitória do partido nacionalista Smer (Direção) na eleição da Eslováquia, país vizinho à Ucrânia. "É muito cedo para julgar", afirmou, citando o fato de que a sigla do ex-premiê Robert Fico terá de formar um governo de coalizão nas próximas duas semanas.

O vencedor, contudo, foi inequívoco ao dizer que manterá as promessas de fim do apoio eslovaco, que incluiu o envio de sistemas antiaéreos e caças MiG-29, ao esforço de guerra ucraniano. "A Eslováquia e seus habitantes têm problemas mais importantes do que a Ucrânia. Estamos preparados para ajudar a reconstruir o Estado ucraniano, mas vocês conhecem nossa opinião sobre armá-lo", disse.

No próximo dia 15, a Polônia irá às urnas para escolher parlamentares, e o atual governo está cada vez mais crítico de Kiev, tendo inclusive anunciado que não mais enviaria armas para Zelenski em favor de seu próprio rearmamento. Em outro vizinho da Ucrânia, a Hungria, o governo de Viktor Orbán se declarou contra o apoio incondicional aos invadidos e condena as sanções contra a Rússia, ainda que as aplique no âmbito da UE.

A Eslováquia é a sexta maior apoiadora da Ucrânia em termos de porcentagem do seu Produto Interno Bruto enviado como ajuda. A UE, como instituição, é dona da maior fatia de ajuda a Kiev na guerra: R$ 450 bilhões, embora R$ 410 bilhões sejam em repasses financeiros, não militares.

O calendário eleitoral é um fator importante também nos EUA, onde os republicanos cada vez mais refratários ao apoio de Biden à Ucrânia deverão pressionar por uma modulação do presidente na campanha pela Casa Branca em 2024.

O tempo corre contra Kiev, e também o clima. As primeiras chuvas do outono do Hemisfério Norte devem começar nos próximos 15 dias, dificultando a já ineficaz contraofensiva iniciada em junho por Zelenski. Ela teve ganhos incrementais, mas estudo divulgado pelo jornal americano The New York Times, insuspeito de simpatias por Putin, mostrou que foram menos do que os também poucos avanços dos russos neste verão.

Restaram a Zelenski ações mais ousadas e midiáticas, como os ataques à Frota do Mar Negro da Rússia na Crimeia e o emprego de drones contra o território russo, particularmente contra bases aéreas. Mas o balanço da guerra tem favorecido a Rússia no longo prazo.

A ministra das Relações Exteriores da Alemanha, Annalena Baerbock, pediu empenho especial aos colegas para preparar a Ucrânia contra uma segunda onda de bombardeios de sua infraestrutura energética no inverno europeu. De outubro a janeiro passados, a Rússia deixou repetidamente o país no escuro.

"No inverno passado, vimos a forma brutal com que o presidente russo está conduzindo essa guerra", afirmou ela. Zelenski foi na mesma linha: "É muito importante maximizar o reforço do escudo sobre o céu da Ucrânia antes do inverno. Os sistemas de defesa aérea que já recebemos, como o Patriot, o Iris-T, Nasams e outros, já estão salvando vidas", disse.

No Kremlin, o discurso oficial é o de não celebrar demais as agruras do adversário. A votação nos EUA, disse o porta-voz Dmitri Peskov nesta segunda, "é um fenômeno temporário". "Os EUA vão continuar seu envolvimento neste conflito, de fato um envolvimento direto", afirmou.

Sobre a vitória de Fico na Eslováquia, ele foi econômico, dizendo ser "um absurdo que políticos sensatos que buscam o interesse de seu país sejam chamados de pró-Rússia".

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