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Migrantes trocam sonho de viver nos EUA por refúgio no México

Com ajuda da ONU, país antes visto como 'meio do caminho' oferece asilo e emprego a latinos refugiados

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Laura Gottesdiener Daina Beth Solomon
Saltillo (México) | Reuters

Durante um turno de fábrica na cidade Saltillo, no norte do México, o refugiado hondurenho Walter Banegas, 28, molda uma peça de metal para um poste de rua. Ele diz ter fugido para os Estados Unidos, ainda quando adolescente, para escapar do tráfico de Honduras, mas foi deportado em 2014. Em 2020 voltou a entrar no país norte-americano em busca de asilo, mas foi deportado novamente.

Em 2021, Banegas conseguiu fugir mais uma vez das ameaças do tráfico, mas não mirou os Estados Unidos, e sim, o México. Ele recebeu status de refugiado em janeiro e, com a ajuda de um programa das Nações Unidas, foi realocado para Saltillo, onde conseguiu um emprego em uma indústria que tem sede no estado americano de Michigan.

Walter Banegas, 28, natural de Honduras, hoje vive como refugiado no México
Walter Banegas, 28, natural de Honduras, hoje vive como refugiado no México - Daniel Becerril/REUTERS

Há muito tempo conhecido como um país de emigração e trânsito, o México nos últimos cinco anos se tornou um destino para um número pequeno, mas crescente, de refugiados, atraídos por um sistema de asilo menos restritivo do que nos EUA, bem como por maiores oportunidades profissionais devido à escassez de mão de obra no país.

Banegas diz receber cerca de US$ 800 por mês —menos do que ganharia nos EUA, mas o suficiente para enviar pelo menos US$ 50 por mês para sua família. Ele afirma se dar bem com seus colegas mexicanos e se orgulha que seu filho de seis meses, David, seja um cidadão mexicano.

"Me sinto em paz aqui", diz. "Não é necessário ir para os Estados Unidos. Você também pode progredir aqui, no México."

Há uma década, algumas centenas de pessoas recebiam asilo no México anualmente. Em 2021, o número subiu para 27 mil, de acordo com a agência de refugiados mexicana. Este ano, o país está no caminho para aprovar, pelo menos 20 mil casos de asilo, com chegadas vindas de Honduras, Haiti, Venezuela, El Salvador e Cuba.

A maioria dos migrantes que entram no México continua em direção aos Estados Unidos, país que registrou mais de 700 mil pedidos individuais de asilo no ano passado.

Chefe da agência mexicana de refugiados das Nações Unidas (ACNUR), Giovanni Lepri, diz que o México está se tornando uma "opção muito sólida" para migrantes, em parte devido às suas altas necessidades de mão de obra.

O México tem mais de um milhão de vagas de emprego em todo o país, de acordo com um estudo divulgado em julho pela associação empresarial Coparmex, e os empregadores nos setores de turismo, agricultura, transporte e manufatura muitas vezes têm dificuldade em encontrar trabalhadores.

Segundo a pesquisa com mais de 2.500 empresas, 85% dos empregadores do setor de manufatura relatam mais problemas do que qualquer outro setor para encontrar mão de obra.

O crescimento esperado em nearshoring —prática de proximidade geográfica para relações comerciais — à medida que as empresas se mudam para o México para ficarem próximas de clientes dos EUA, pode aprofundar essa escassez de mão de obra, de acordo com a associação mexicana de manufatura Index.

Autoridades mexicanas, dos EUA e da ONU pediram cooperação regional para ajudar os migrantes a se estabelecerem em lugares como México, Costa Rica e Colômbia, com o objetivo de reduzir a migração ilegal para o território norte-americano.

O diretor de migração do Ministério das Relações Exteriores do México, Arturo Rocha, diz que o governo está focado em expandir programas de visto de trabalho para conectar empregadores a migrantes em busca de emprego, especialmente "para aproveitar a nearshoring".

O México está trabalhando com o governo da Guatemala para trazer até 20 mil trabalhadores, anualmente, para o país, com o objetivo de ampliar o programa eventualmente para Honduras e El Salvador.

José Medina Mora, chefe da Coparmex, elogiou o programa da ONU que ajudou Banegas e instou o governo mexicano a expandir os programas de visto de trabalho para que mais migrantes possam ser conectados a empregadores.

"Isso ajudaria, especialmente, diante dessa realidade de vagas de emprego que não conseguimos preencher", diz Medina Mora.

O programa da ONU ajuda os refugiados a se realocarem do sul do México, onde a maioria completa seu processo de asilo, para cidades no centro e norte, fornecendo subsídios em dinheiro e assistência com colocação no emprego e acesso a creches, escolas e cuidados de saúde. Em 2022, cerca de 5.500 refugiados conseguiram um emprego e, até o momento deste ano, aproximadamente 3.000.

Quando Fernando Hernandez, 24, fugiu de Honduras para o sul do México no ano passado com sua parceira e filha pequena, seu plano era atravessar o país o mais rápido possível para chegar aos EUA .

Então ele viu postagens em redes sociais de crianças se afogando no rio na fronteira dos EUA e imaginou a filha de dois anos, Kaitlyn, sendo arrastada. Ele lembrou ainda de sua mãe, que imigrou em 2017, vivendo em um parque de trailers no Texas e gastando a maior parte de seu salário com aluguel.

Hernandez decidiu buscar asilo no México. Depois que foi aprovado em fevereiro, a ONU ajudou a família a se mudar para a cidade industrial do norte de Monterrey e Hernandez começou a trabalhar em uma loja de conveniência.

Rapidamente, Hernandez aprendeu que havia vagas de emprego em todos os lugares. Ele mudou para uma fábrica e depois se tornou cozinheiro em um restaurante P.F. Chang's, ganhando cerca de US$ 225 por semana.

"Aqui temos tudo: uma casa, comida e família", diz. "Não poderia pedir mais."

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