Falta de munição faz Ucrânia reduzir ataques contra a Rússia

Queixa de general eleva pressão sobre EUA e UE para fornecer mais armas contra a invasão

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São Paulo

A Ucrânia está tendo de reduzir o ritmo de suas operações contra a invasão russa devido à falta de auxílio militar do Ocidente, particularmente munição de artilharia —o item mais precioso ao longo dos 1.000 km de frente de batalha no país.

A afirmação foi feita nesta segunda (18) à agência de notícias Reuters pelo general Oleksandr Tarnavskii, um dos mais respeitados oficiais ucranianos, que liderou o último grande sucesso de Kiev na guerra, a retomada da cidade de Kherson (sul do país) em novembro do ano passado.

Soldado tapa ouvidos enquanto um obuseiro sueco Archer é disparado por brigada de artilharia ucraniana em Donetsk
Soldado tapa ouvidos enquanto um obuseiro sueco Archer é disparado por brigada de artilharia ucraniana em Donetsk - Thomas Peter - 16.dez.2023/Reuters

Ela pode ser lida como parte do esforço do governo de Volodimir Zelenski de sensibilizar seus aliados ocidentais numa semana decisiva. A oposição republicana no Congresso americano está bloqueando um pacote de R$ 300 bilhões de ajuda para 2024 a Kiev, enquanto a Hungria lidera o veto a um pacote de cerca de R$ 250 bilhões da UE (União Europeia) para o mesmo período.

Sem o dinheiro, ou parte dele, há dúvidas sobre a capacidade ucraniana de se manter acima da linha d'água no conflito iniciado pela invasão das forças de Vladimir Putin em fevereiro do ano passado.

"Temos um problema com munição. Os volumes que recebemos não são suficientes, então os estamos redistribuindo. Estamos replanejando missões que havíamos estabelecido e as fazendo menores, porque precisamos prover [os soldados]", afirmou.

Do início da guerra até 31 de outubro, segundo estimativa do Instituto para a Economia Mundial de Kiel (Alemanha), R$ 1,2 trilhão foi despejado nos cofres e arsenais de Kiev. Só que, de agosto em diante, o ritmo de ajuda despencou, sendo 90% menor do que o registrado no mesmo período de 2022.

Na semana passada, Zelenski chegou a viajar para Washington e Oslo, atrás de apoio, mas recebeu apenas tapas nas costas por ora. Os EUA liberaram uma fatia final de auxílio financeiro já previsto, mas não há acordo sobre 2024, o que levou o presidente Joe Biden a dizer que seus rivais republicanos, de olho na Casa Branca no ano que vem, dariam "um presente de Natal" a Putin.

Além da política doméstica, seja nos EUA ou na Hungria, que quer ver bilhões de euros em fundos congelados pela UE devido a seu namoro com a autocracia, há o cansaço com o conflito.

A contraofensiva de Zelenski, propagandeada como ponto da virada da guerra pelo presidente e bancada por novas armas ocidentais, não logrou o sucesso esperado: seccionar a ponte terrestre estabelecida por Putin no sul da Ucrânia, dando ligação direta entre a Rússia e a Crimeia, anexada em 2014.

Mesmo os sucessos pontuais estão sendo questionados. Reportagem do The New York Times, insuspeito quando o assunto é apoio quase cego à Ucrânia e ao governo Biden, mostrou que a propalada tomada de posições na margem ocupada do rio Dnieper não é bem o que Kiev disse ser.

Segundo soldados ouvidos pelo jornal americano, as tropas são enviadas em missões suicidas através do rio, sem conseguir estabelecer controle territorial algum. Em tom inusualmente crítico, o texto sugere que a ação toda é uma peça de propaganda para Kiev pedir mais dinheiro para o Ocidente.

A fala do general, em linha com as queixas de Zelenski, ocorreu após um mês de grande ruído entre as cúpulas política e militar da Ucrânia. O chefe das Forças Armadas, Valeri Zalujni, disse à revista britânica The Economist que a contraofensiva tinha falhado e que a guerra estava num impasse.

Zelenski o criticou, negando tal cenário, em meio a substituições de comandantes militares. Agora, Zalujni parece ter se alinhado ao chefe: nesta segunda, afirmou à rede ucraniana RBC que não há um impasse, mas não respondeu quando questionado se haveria mais operações terrestres ofensivas.

Com as linhas de frente se estabilizando, com exceção mais notável no esforço russo de conquistar Avdiivka (Donetsk, leste) antes que o inverno se instale de vez na região, o foco se volta para o ar.

A campanha de mísseis russos contra cidades ucranianas recomeçou, assim como o emprego de aviões-robôs. No domingo (17), Moscou lançou 20 drones e 1 míssil de cruzeiro contra o vizinho, que respondeu com 35 drones contra território rival. Ambos os lados alegam ter derrubado todos os alvos, mas ao menos uma pessoa morreu em Odessa, porto no sul da Ucrânia.

O general Tarnavskii reafirmou a esperança de que o Ocidente forneça defesas antiaéreas e caças americanos F-16 para tentar mudar o cenário favorável à Rússia nos céus. O treinamento de pilotos começou e Holanda e Dinamarca prometeram enviar os primeiros aviões talvez em março, mas há dúvidas disso com a recente eleição de um governo de direita em Amsterdã.

"Com a presença do F-16, tudo será diferente. Na minha opinião, como um oficial de infantaria, um F-16 é como uma Mercedes comparada com um Zaporojets [um antigo carro soviético]. Todos estão esperançosos", afirmou.

A Alemanha confirmou que deverá enviar uma terceira bateria do sistema antiáereo americano Patriot para Kiev. O anúncio veio após o relato, não confirmado pelos ucranianos, de que uma das unidades recebidas no ano passado foi destruída na semana passada por um míssil hipersônico russo Kinjal.

Berlim também assinou, nesta segunda, acordo formalizando a instalação de um batalhão de 4.800 militares na Lituânia, que estará operacional em 2027 junto à fronteira da Rússia —os Estados Bálticos são um dos pontos mais sensíveis de atrito entre Moscou e a Otan, a aliança militar ocidental à qual as antigas repúblicas soviéticas da região pertencem.

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