Otan faz exercício militar inédito contra a Rússia no mar Báltico

Ação ocorre em meio à tensão entre Polônia e Belarus; comandante fala em provar capacidade de ataque

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São Paulo

A Otan começa no próximo sábado (9) o primeiro exercício militar no mar Báltico simulando um ataque da Rússia na região, palco de crescente tensão entre a aliança militar ocidental, Moscou e sua aliada Belarus.

Serão 30 navios e cerca de 3.000 militares envolvidos, todos dos países da Otan que margeiam o mar: Alemanha, Dinamarca, Polônia, Lituânia, Letônia, Estônia e Finlândia, além Suécia, candidata a admissão no clube.

Um barco de combate sueco pratica assalto anfíbio em exercício com a Finlândia perto de Estocolmo em abril deste ano
Um barco de combate sueco pratica assalto anfíbio em exercício com a Finlândia perto de Estocolmo em abril deste ano - Andres Wiklund - 28.abr.2023/TT News Agency/Reuters

Outros países da aliança também participarão, como os Estados Unidos, que enviarão o navio de assalto anfíbio Mesa Verde, uma embarcação de 200 metros capaz de desembarcar 800 fuzileiros navais de uma só vez.

Enquanto manobras militares sempre são desenhadas para cenários reais, é raro que seus formuladores digam o objetivo em público. A tensão na Europa desde que Vladimir Putin invadiu a Ucrânia, em 24 de fevereiro do ano passado, mudou isso.

"Nós estamos enviando uma clara mensagem de vigilância para a Rússia: não conosco aqui", afirmou o almirante Jan Christian Kaack em Berlim nesta sexta (1º). Ele foi além, descrevendo um cenário de ataque russo que há anos está no radar, no qual os três Estados Bálticos são isolados com a tomada da faixa de terra na fronteira polonesa-lituana que separa a Belarus do exclave russo de Kaliningrado.

"Se o corredor de Suwalki [nome da ligação] for bloqueado, e isso pode ser feito facilmente dado que lá só há duas rodovias e uma linha férrea, então nós só teremos rotas marítimas [para apoiar lituanos, letões e estonianos]. É lá que nós teremos de avançar", afirmou Kaack.

A guerra alterou 200 anos de configuração geopolítica no Báltico. A Suécia abandonou a neutralidade que marcou sua derrota para o Império Russo e pediu para entrar na Otan, enquanto a Finlândia deixou sete décadas de não alinhamento ingressando no clube este ano.

A movimentação ocorre em um momento particularmente agudo na região. Não bastasse as tensões naturais da guerra, a Polônia tem batido de frente com a Belarus, ditadura que é a única aliada de Putin na região e considerada uma vassala militar de Moscou.

Minsk não participa diretamente do conflito na Ucrânia, mas permite o uso de seu território para movimentações e ataques russos. Após anos de equilíbrio entre a condição de país secundário do chamado Estado da União com a Rússia e parceiro da União Europeia, Belarus está totalmente integrada à estrutura militar do vizinho agora.

Isso ocorreu a partir de 2020, quando grandes protestos contra fraude eleitoral enfraqueceram a posição do ditador Aleksandr Lukachenko, no poder desde 1994. Agora, Putin tem até armas nucleares táticas suas instaladas em Belarus, o que gerou alarme geral na região.

O temor só aumentou quando os mercenários do Grupo Wagner foram realocados para campos sob o controle de Lukachenko como parte do acordo que pôs fim ao motim deles contra a cúpula militar russa, em 24 de junho. A morte em condições suspeitas do líder deles, Ievguêni Prigojin, num acidente aéreo no último dia 23 só fez aumentar a desconfiança sobre o futuro das ações dos soldados.

Polônia e Lituânia reforçaram suas fronteiras, com o segundo país fechando 2 dos 6 pontos de passagem para Belarus. Varsóvia acusou Minsk de uma intrusão de seu espaço aéreo com helicópteros há duas semanas, e nesta sexta-feira foi a vez de os belarrussos apontarem a mesma ação por parte dos poloneses.

Para piorar, o próprio Putin elevou o tom contra os poloneses, sugerindo que eles querem intervir militarmente na guerra que o russo começou, tomando o oeste ucraniano. Um dos mais beligerantes membros da Otan, que pretende gastar recordistas 4% do PIB com defesa neste ano, a Polônia negou a intenção.

Com esse clima, o exercício da Otan certamente trará mais oportunidades de esbarrões acidentais entre forças russas, belarrussas e ocidentais na região. Nas últimas semanas, houve diversas interceptações aéreas de lado a lado, uma prática cada vez mais comum e que pode acabar em uma escalada indevida.

No mar Negro e na Síria, por exemplo, caças russos atingiram drones americanos neste ano. A atividade nas duas regiões fez os EUA deslocarem mais aeronaves para monitorar a situação. Na última terça (29), Washington pousou pela primeira vez um bombardeiro estratégico com capacidade nuclear na Noruega, algo que não ocorreu nem na Guerra Fria.

Um modelo B-2 Spirit, avião furtivo ao radar apelidado de bombardeiro invisível, fez um reabastecimento na base aérea de Orland, a cerca de 1.000 km da base da Frota do Norte russa, em Murmansk (Ártico). O avião integra um destacamento de três B-2 que estão operando a partir de Keflavik, na Islândia, desde 13 de fevereiro.

Segundo a Força Aérea americana, o objetivo é manter a projeção de força ativa na contestada região ártica, onde os russos têm grande presença. Como a Noruega, que é membro da Otan, proíbe a presença de armas nucleares em seu território, é presumível que o B-2 estava ou desarmado, ou com mísseis e bombas convencionais.

O recado, contudo, é claro.

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