Ucrânia celebra seu 1º Natal em 25 de dezembro para se desvencilhar da Rússia

Antes, como ocorre em Moscou, Igreja Ortodoxa celebrava data em 7 de janeiro, como manda o calendário juliano

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Andrew E. Kramer
Kiev | The New York Times

As luzes de Natal piscaram antes do previsto. As famílias cantaram canções natalinas um pouco mais cedo. E os primeiros presentes —tradicionalmente escondidos debaixo de um travesseiro ou em uma bota— apareceram duas semanas antes.

Das muitas mudanças na Ucrânia em direção ao Ocidente implementadas desde a independência e aceleradas durante a invasão russa, uma trouxe alegria especial neste ano: o Natal chegou mais cedo.

Após séculos de comemoração da data em 7 de janeiro, de acordo com o calendário da Igreja Ortodoxa Ucraniana, neste ano de 2023 a igreja formalmente mudou a data para celebrar em 25 de dezembro, juntamente com a maioria da Europa —e não com a Rússia.

Para a menina Drinka, 6, isso significou cantar canções natalinas mais cedo e desfrutar da emoção de receber presentes como uma boneca Rainbow High e um conjunto de pintura duas semanas antes do que no ano passado. "Eu amo o Natal!", disse ela.

Sua mãe, Halina Chvets, viu um passo em direção à Europa na decisão de mudar a data em relação à tradição russa, não apenas para as celebrações de Natal, mas também para outras festas religiosas.

"Estamos realmente felizes", afirmou. "A fé em Deus é um pilar fundamental de nossas vidas. Celebrar o Natal, o nascimento de Jesus, é uma oportunidade para nos reunirmos para essa linda tradição."

O Natal, assim como muitas outras coisas na Ucrânia atualmente, está intimamente ligado à guerra com a Rússia.

A Igreja Ortodoxa Ucraniana adotou a posição de que o calendário juliano usado na igreja russa não tem significado religioso e que os feriados devem ser celebrados de acordo com o calendário pelo qual as pessoas vivem suas vidas diárias. Mesmo antes da mudança formal deste ano, alguns fiéis ortodoxos ucranianos, no primeiro ano após a invasão da Rússia, já haviam mudado o Natal para dezembro.

Tecnicamente, a mudança na celebração é uma recomendação; as paróquias têm autonomia para decidir quando marcar o feriado. Mas, das aproximadamente 7.500 paróquias da Igreja Ortodoxa Ucraniana, todas, exceto 120, mudaram a data do Natal este ano, à medida que a invasão russa se aproxima de completar dois anos.

A maioria das igrejas ortodoxas orientais já havia adotado essa posição. Após a mudança da igreja ucraniana, apenas quatro das 15 denominações ortodoxas orientais —a saber: Rússia, Sérvia, Finlândia e Jerusalém— ainda seguem o calendário juliano, que está atrasado 13 dias devido a uma diferença no cálculo da duração do ano.

Algumas comunidades religiosas na Grécia, Bulgária e Romênia, conhecidas como "Velhos Festivos", também continuam com o antigo calendário.

Em seu discurso de Natal, o presidente Volodimir Zelenski mencionou o segundo Natal em guerra e a mudança na data para que ucranianos ortodoxos e católicos celebrem no mesmo dia.

"Hoje, todos os ucranianos estão juntos", disse ele. "Todos nós celebramos o Natal juntos. Na mesma data, como uma grande família, como uma nação, como um país unido."

Zelenski disse que muitos ucranianos celebrariam com lugares vazios à mesa para os soldados que estão na guerra. No entanto, todos orariam pela paz juntos "sem uma diferença de duas semanas no tempo".

Após a independência da Ucrânia em 1991, a Igreja Ortodoxa Ucraniana se separou da Igreja Ortodoxa Russa, embora grande parte da liturgia e das tradições tenham permanecido semelhantes. Em 2018, essa separação se tornou formal, embora um ramo da igreja tenha permanecido alinhado com a Rússia.

Após a invasão, esse ramo removeu dos documentos da igreja a menção formal de lealdade à igreja russa, mas continua a celebrar o Natal em janeiro. Líderes da igreja e fiéis dizem que celebrar feriados separados dos russos é uma mudança importante.

"Vemos que a Igreja Patriarcal de Moscou cria mitos sobre o czar e o mundo russo, e as pessoas acreditam neles", disse o padre Mikhailo Omelian, porta-voz da igreja ucraniana. Celebrar separadamente dos russos ajudará a diferenciar o ramo ucraniano da ortodoxia, disse ele.

"Esse processo começou nas esferas econômica, política, social e cultural e agora chega ao aspecto espiritual. A esfera religiosa não pode pertencer a um país agressor."

Na linha de frente da guerra, cerca de 700 padres da Igreja Ortodoxa Ucraniana que atuam como capelães visitaram trincheiras e abrigos para abençoar as tropas, disse Mikhailo. Eles não celebrarão a missa de Natal em áreas próximas à frente de batalha, pois qualquer congregação de soldados se torna um alvo para a artilharia ou mísseis russos.

Houve alguns contratempos na mudança de data. Com menos tempo de férias escolares antes do Natal, preparar a refeição festiva e seu prato principal —grãos de trigo cozidos com nozes e frutas secas— é mais corrido, disse Halina Chvets. Mas isso é um inconveniente menor.

"Esperamos por isso há muitos anos", disse Shvets. "Estamos muito felizes e gratos", disse ela. "É maravilhoso para nós que celebremos com o resto do mundo."

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