EUA ameaçam retomar sanções contra Maduro após novo avanço contra eleições livres

Suprema Corte da Venezuela confirmou perda de direitos de María Corina Machado, principal opositora do ditador

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Caracas | AFP

Os Estados Unidos avaliam voltar atrás e retomar sanções contra a Venezuela, informou o porta-voz do Departamento de Estado americano, Matthew Miller, neste sábado (27).

O motivo é a confirmação, anunciada pela Suprema Corte de Caracas na véspera, da inelegibilidade de María Corina Machado por 15 anos. A política havia sido escolhida pela oposição para enfrentar o ditador Nicolás Maduro nas eleições presidenciais deste ano, ainda sem data para acontecer.

A líder da oposição venezuelana, Maria Corina Machado, fala a apoiadores durante manifestação na praça Altamira, em Caracas - Gabriela Oraa - 23.jan.2024/AFP

A decisão do tribunal "contradiz o compromisso assumido pelos representantes de Nicolás Maduro de organizar eleições presidenciais justas em 2024", diz o comunicado de Washington, em referência a uma negociação ocorrida na ilha caribenha de Barbados no ano passado.

Engenheira de formação, María Corina, 56, foi considerada inelegível pela primeira vez em 2015, impedida de concorrer por um ano. A justificativa da Controladoria-Geral venezuelana na época foi de que ela teria cometido irregularidades administrativas no período em que atuou como deputada, de 2011 a 2014.

A retirada de seus direitos políticos se deu, porém, depois de ela denunciar supostas violações de direitos humanos durante protestos contra Maduro ao participar de uma reunião da OEA (Organização dos Estados Americanos) como "embaixadora alternativa" do Panamá —o regime afirmou que sua presença no encontro enquanto ainda era deputada violava o artigo 191 da Constituição, que impede congressistas de aceitarem cargos de governos estrangeiros.

Em junho passado, María Corina sofreu uma nova inabilitação, esta com prazo de 15 anos. A medida também afetou outros críticos do regime, como Henrique Capriles, duas vezes candidato à Presidência, e Juan Guaidó, que chegou a ser reconhecido como presidente interino da Venezuela por mais de 50 países entre 2019 e 2022.

Sob pressão dos EUA e após os acordos assinados em outubro pelo regime e pela oposição com a mediação da Noruega, o TSJ (Tribunal Supremo de Justiça) criou um mecanismo de contestação das inabilitações. Washington condicionou o cumprimento do acordo à flexibilização, por seis meses, das sanções americanas ao petróleo, ao gás e ao ouro venezuelanos —são elas que estão em jogo agora.

Com base nesse mecanismo, Machado pediu que a inabilitação fosse revisada em dezembro do ano passado, mas, segundo a decisão desta sexta da corte, seu recurso "não cumpre os requerimentos estabelecidos e exigidos" no acordo de Barbados.

A negociação já estava sob ataque nesta semana. Na quinta-feira (25), Maduro afirmou que as negociações tinham ficado "mortalmente feridas" após denúncias de supostos planos para assassinar o ditador.

"Declaro-os em terapia intensiva, apunhalados, chutados. Tomara que possamos salvar os acordos de Barbados e impulsionar, por meio do diálogo, grandes acordos de consenso nacional [...] sem planos para me assassinar, nos assassinar ou encher o país de violência", declarou o líder perante funcionários do alto escalão de seu governo.

Os processos de inelegibilidade política têm sido uma arma do regime para afastar seus rivais nos últimos anos.

"O regime decidiu acabar com o Acordo de Barbados", criticou Machado, que venceu as primárias da oposição em outubro com mais de 2 milhões de votos, ou 92% do total. "O que não acaba é nossa luta pela conquista da democracia por meio de eleições livres e limpas. Maduro e seu sistema criminoso escolheram o pior caminho para eles: eleições fraudulentas. Isso não vai acontecer."

A Sala Político-Administrativa do TSJ venezuelana validou os argumentos da Controladoria de sancionar Machado por participar do que chamou de "trama de corrupção orquestrada pelo usurpador Juan Antonio Guaidó, que propiciou um bloqueio criminoso à República Bolivariana da Venezuela, assim como a espoliação descarada das empresas e riquezas do povo venezuelano no exterior, com a cumplicidade de governos corruptos".

A decisão desta sexta a princípio põe fim à possibilidade de Machado enfrentar Maduro, candidato natural do chavismo, nas eleições previstas para o segundo semestre deste ano, com presença de observadores internacionais —requisito que também faz parte do Acordo de Barbados.

Também nesta sexta, o Supremo concedeu decisões favoráveis a Leocenis García, um jornalista e dirigente não alinhado com a oposição tradicional; Richard Mardo, um ex-parlamentar; Pablo Pérez, ex-governador do estado de Zulia; e Daniel Ceballos, antigo prefeito de San Cristóbal.

Capriles, que desistiu de participar das primárias opositoras de outubro passado, não recorreu ao mecanismo de Barbados. No seu caso, a corte respondia a um recurso impetrado em 2017, ano em que o político foi sancionado por supostas irregularidades administrativas durante seu mandato como governador do estado de Miranda (2013-2017), que engloba parte de Caracas.

"Essa solicitação não cumpre com os requerimentos estabelecidos e exigidos no Acordo de Barbados assinado em 17 de outubro de 2023 e, por isso, o cidadão Henrique Capriles Radonski está inabilitado por 15 anos para o exercício de funções públicas", indicou a sentença.

Nesta semana, o chefe da diplomacia da Venezuela, Yván Gil Pinto, reuniu-se com o assessor especial da Presidência para assuntos internacionais do Brasil, Celso Amorim. O venezuelano esteve em Brasília para se encontrar com o chanceler da Guiana em meio à disputa por Essequibo, território rico em petróleo.

Segundo relatos, na reunião com Amorim no Palácio do Planalto, Pinto falou que as eleições na Venezuela devem ocorrer no segundo semestre deste ano, conforme o previsto.

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