Brasil diz que governo de Israel 'não tem qualquer limite ético ou legal' em Gaza

Itamaraty condena morte de civis que esperavam ajuda e fala em declarações cínicas da gestão de Binyamin Netanyahu

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São Paulo

Um dia após os relatos das mortes de dezenas de civis que aguardavam em fila por ajuda humanitária em Gaza, o Itamaraty voltou a criticar as ações de Israel no território palestino, empregando alguns de seus termos mais duros desde o início do conflito.

"O governo [de Binyamin] Netanyahu volta a mostrar, por ações e declarações, que a ação militar em Gaza não tem qualquer limite ético ou legal", escreveu a pasta do governo Lula (PT) em nota na manhã desta sexta-feira (1º).

Familiares e amigos de feridos se reúnem no arredor do hospital Al-Shifa, na Cidade de Gaza
Familiares e amigos de feridos se reúnem no arredor do hospital Al-Shifa, na Cidade de Gaza - Malik Atallah - 29.fev.24/Xinhua

Um dia antes, a facção palestina Hamas havia dito que mais de 110 civis palestinos morreram em meio a tiros de tropas israelenses enquanto aguardavam ajuda humanitária ao lado de caminhões.

Tel Aviv argumentou que os tiros de seus militares, acuados, teriam matado somente cerca de dez civis e que a maior parte das mortes e ferimentos foi causada pela aglomeração e pelos saques aos caminhões, que teriam levado a atropelamentos e pisoteamentos.

Na nota, o Ministério das Relações Exteriores, comandado por Mauro Vieira, disse que "as aglomerações em torno dos caminhões que transportavam ajuda humanitária demonstram a situação desesperadora a que está submetida a população civil da Faixa de Gaza e as dificuldades para obtenção de alimentos no território".

Relatório da Global Nutrition Cluster, ligada à ONU, retrata a presença da fome na faixa de terra adjacente a Israel. O documento diz que mais de 90% das crianças de 6 meses a 2 anos e das mulheres grávidas enfrentam o que chamam de "pobreza alimentar extrema", consumindo apenas dois ou até menos grupos alimentares por dia.

Doenças infecciosas também afetam 90% das crianças menores de 5 anos, e 70% delas tiveram diarreia nas últimas duas semanas.

O Itamaraty voltou a criticar duramente o governo Netanyahu, com o qual as relações do Brasil se deterioraram após o presidente Lula, em viagem à Etiópia, comparar as ações de Israel em Gaza ao Holocausto nazista de Adolf Hitler.

O petista foi declarado "persona non grata" por Israel, e Bibi, como o premiê é conhecido, disse que o brasileiro cruzou uma linha vermelha.

"A inação da comunidade internacional diante dessa tragédia humanitária continua a servir como velado incentivo para que o governo Netanyahu continue a atingir civis inocentes e a ignorar regras básicas do direito humanitário internacional", disse o Itamaraty, um histórico defensor da solução de dois Estados, com a criação de um Estado palestino independente que conviva com Israel.

"Declarações cínicas e ofensivas às vítimas do incidente, feitas horas depois por alta autoridade do governo Netanyahu, devem ser a gota d’água para qualquer um que realmente acredite no valor da vida humana", seguiu a diplomacia brasileira.

O comunicado chama as ações que se desenrolam há quase cinco meses em Gaza de um massacre e volta a mencionar o termo "genocídio", que Lula vem empregando para descrever as atividades militares de Tel Aviv, para dizer que Israel deve implementar as medidas que impeçam um crime desse tipo.

Ainda nesta sexta-feira, novo balanço do Ministério da Saúde de Gaza —atrelado ao Hamas, que governa a Faixa desde a segunda metade dos anos 2000— disse que passou de 30,2 mil o número de palestinos mortos no conflito. Outros 71,3 mil teriam ficado feridos. A cifra, acredita-se, engloba tanto civis quanto combatentes da facção, que se refere a todos como mártires.

No decorrer das últimas semanas, os desdobramentos das declarações de Lula comparando a operação militar israelense ao Holocausto foram marcados por reiteradas críticas da diplomacia de Tel Aviv com o chanceler Israel Katz fazendo ácidas publicações no X mencionando Lula e exigindo um pedido de desculpas.

O petista não se retratou. Em vez disso, argumentou não ter dito a palavra "Holocausto" em suas declarações durante o giro pela África. O presidente de fato não usou o termo, mas descreveu o que foi o Holocausto. "O que está acontecendo em Gaza com o povo palestino, não existe em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu quando Hitler resolveu matar os judeus", disse ele na Etiópia.

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