Ucrânia convoca representante do Vaticano após fala do papa sobre 'bandeira branca'

Kiev diz que comentários do pontífice legitimam lei do mais forte e encorajam desrespeito à lei internacional

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Reuters

O Ministério das Relações Exteriores da Ucrânia convocou o núncio papal (representante diplomático do Vaticano) nesta na segunda-feira (11) para expressar "decepção" com os comentários do papa Francisco de que a Ucrânia deveria "mostrar a coragem da bandeira branca" e abrir negociações com a Rússia para encerrar a guerra.

Em uma entrevista divulgada pela televisão pública suíça RTS no sábado (9), Francisco foi questionado sobre as possibilidades de resolução do conflito na Ucrânia e pediu que para que não haja vergonha em negociar "antes que as coisas piorem".

Papa Francisco acena para fiéis durante oração na Praça de São Pedro, no Vaticano
Papa Francisco acena para fiéis durante oração na Praça de São Pedro, no Vaticano - Alberto Pizzoli - 10.mar.2024/AFP

"Acredito que são mais fortes aqueles que veem a situação, que pensam no povo, que têm a coragem de levantar a bandeira branca e negociar", declarou o papa.

O embaixador papal na Ucrânia, o arcebispo Visvaldas Kulbokas, foi informado de que o papa deveria se abster de declarações que "legalizem a lei do mais forte e encorajem mais desrespeito às normas do direito internacional", disse um comunicado no site do ministério ucraniano.

O comunicado afirma que seria esperado do papa que ele enviasse "sinais à comunidade mundial sobre a necessidade de unir imediatamente forças para garantir a vitória do bem sobre o mal".

A Ucrânia, segundo o comunicado, "busca a paz como nenhum outro Estado. No entanto, essa paz deve ser justa e baseada nos princípios da Carta da ONU e na fórmula de paz proposta pelo presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski."

Zelenski rejeitou os comentários do papa no domingo (10). Embora não tenha se referido diretamente a eles, o presidente ucraniano disse que figuras religiosas distantes não deveriam se envolver em "mediação virtual entre alguém que quer viver e alguém que quer destruir".

A fórmula de Zelenski até agora defendida pede a retirada das tropas russas do território ucraniano, responsabilização da Rússia pelas ações no conflito e o retorno da área ocupada a Kiev, incluindo a Crimeia, península ocupada em 2014.

O presidente russo, Vladimir Putin, por sua vez, essencialmente oferece congelar o campo de batalha ao longo das atuais linhas de frente, premissa rejeitada pela Ucrânia.

"É bastante compreensível que ele [o papa] tenha falado a favor de negociações", disse o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, a jornalista nesta segunda. Ele afirmou que Putin havia repetido várias vezes que a Rússia estava aberta a negociações de paz.

"Infelizmente, tanto as declarações do papa quanto as declarações repetidas de outras partes, incluindo as nossas, recentemente receberam recusas absolutamente duras", disse Peskov.

O secretário-geral da Otan (aliança militar ocidental), Jens Stoltenberg, afirmou que as negociações que preservem a Ucrânia como uma nação soberana e independente só aconteceriam quando Putin percebesse que não venceria no campo de batalha.

"Se quisermos uma solução negociada, pacífica e duradoura, o caminho para chegar lá é fornecer apoio militar à Ucrânia", disse ele à Reuters na sede da Otan, em Bruxelas. Questionado se isso significava que agora não era hora de falar sobre uma bandeira branca, ele disse que "não é hora de falar sobre rendição pelos ucranianos. Isso será uma tragédia para os ucranianos".

A Conferência dos Bispos da Alemanha também reagiu à entrevista do pontífice. Em comunicado, a instituição disse que cabia, em última instância, à Ucrânia decidir, "após cuidadosa consideração, quando chegou o momento para negociações de paz." "Seria bom se a Santa Sé comunicasse um esclarecimento substantivo de sua posição sobre essas questões", disseram os bispos alemães.

Em um comunicado publicado em seu site, a Conferência dos Bispos da Alemanha disse que cabia, em última instância, à Ucrânia decidir, "após cuidadosa consideração, quando chegou o momento para negociações de paz."

"O fato de o Papa Francisco não ter abordado os pontos mencionados aqui em sua entrevista causou irritação entre muitos observadores, o que podemos entender. Seria bom se a Santa Sé comunicasse uma clarificação substantiva de sua posição sobre essas questões", disseram os bispos alemães.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, reagiu ao comentário nesta segunda. "O presidente Biden tem grande respeito pelo papa Francisco e se une a ele nas orações pela paz na Ucrânia que poderia ser alcançada se a Rússia decidisse colocar fim a essa guerra injusta", afirmou à agência Ansa um porta-voz do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca.

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