Presidente de Israel pede desculpas por ataque contra ONG em Gaza que matou 7

Isaac Herzog conversou com o chef José Andrés, fundador da organização WCK, que distribui ajuda humanitária

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São Paulo

O presidente de Israel, Isaac Herzog, pediu desculpas nesta terça-feira (2) pelo ataque que resultou na morte de sete funcionários da ONG World Central Kitchen (WCK) enquanto eles distribuíam alimentos na Faixa de Gaza.

Herzog conversou com o fundador da ONG, o chef espanhol José Andrés, e expressou "profunda tristeza e sinceras desculpas pela trágica morte da equipe da WCK", segundo comunicado de seu gabinete.

Mais tarde na mesma data, as forças israelenses afirmaram ter cometido "um grave erro" ao atingir o comboio, segundo elas "provocado por uma identificação equivocada durante a noite, em meio a uma guerra, em condições muito complexas".

"Isso não deveria ter acontecido", disse o chefe do Estado-Maior do Exército, o general Herzi Halevi. Antes de sua declaração, militares haviam dito ao jornal Haaretz sob condição de anonimato que o ataque foi resultado da indisciplina de parte dos comandantes da operação terrestre em Gaza.

Veículo da ONG World Central Kitchen (WCK) atingido por ataque das forças de Israel em Deir al-Balah
Veículo da ONG World Central Kitchen (WCK) atingido por ataque das forças de Israel em Deir al-Balah - Yasser Qudih - 1.abr.2024/Xinhua

Os funcionários voltavam de Deir al-Balah, no centro do território palestino, onde haviam descarregado mais de cem toneladas de alimentos, quando foram atingidos pelas forças israelenses. Eles viajavam em três veículos, dois deles blindados e com o logotipo da WCK, e haviam coordenado seu deslocamento com o Exército de Tel Aviv.

Entre os mortos há três cidadãos britânicos, um australiano, um polonês, uma pessoa com dupla nacionalidade dos Estados Unidos e do Canadá e um palestino. As identidades de seis deles foram reveladas: a australiana Lalzawmi Frankcom, 44, o polonês Damian Sobol, 35, o palestino Saif Issam Abu Taha, 27, e os britânicos John Chapman, James Henderson e James Kirby —estes, identificados pela BBC.

Autoridades de Austrália, Reino Unido, Espanha, Polônia e Canadá demandaram mais esforços por parte de Israel para proteger agentes humanitários que atuam na guerra —os britânicos chegaram a convocar o embaixador de Tel Aviv em Londres, ato de reprimenda na prática diplomática, para pedir uma explicação urgente para o episódio.

Os Estados Unidos também reagiram. Joe Biden, cujas relações com o primeiro-ministro israelense, Binyamin Netanyahu, têm se tornado cada vez mais tensas, ligou para o chef Andrés para prestar suas condolências.

E apesar de a Casa Branca ter feito a ressalva de que não havia evidências de que Israel tinha como alvos os agentes humanitários, ela afirmou estar "indignada" com o ataque e acrescentou que Israel tinha que garantir que representantes de organizações de ajuda que atuam em Gaza não sejam feridos.

"Essas pessoas são heróis", disse o chefe da diplomacia dos EUA, Antony Blinken, a jornalistas em Paris. "Não deveríamos ter uma situação em que quem que está só tentando ajudar os outros enfrente riscos tão grandes", prosseguiu, acrescentando que Washington espera que Tel Aviv faça uma investigação ampla e transparente sobre o ocorrido e responsabilize os culpados.

À noite, o próprio Biden se pronunciou. Em nota, afirmou estar "indignado e com o coração partido", pediu uma investigação "veloz, na qual os culpados sejam indicados e as descobertas sejam divulgadas publicamente" e disse que Israel não estava fazendo o suficiente para proteger agentes humanitários e civis no território palestino.

O incidente, que a despeito do número relativamente baixo de mortos configura um dos mais graves envolvendo estrangeiros na guerra em Gaza desde o seu início, aprofunda ainda mais o isolamento diplomático de Tel Aviv.

Apesar dos pedidos de desculpa públicos, Herzog, o presidente, exerce um papel meramente cerimonial. Como ele não faz parte do gabinete de guerra, não tem controle algum sobre decisões militares, que passam por Netanyahu. Este, por sua vez, havia dito mais cedo que lamentava as mortes, mas que esse tipo de coisa "acontece em tempos de guerra".

"Estamos investigando minuciosamente o assunto, estamos em contato com os governos [dos estrangeiros entre os mortos] e faremos de tudo para garantir que isso não ocorra novamente", afirmou o premiê em um pronunciamento por vídeo.

Ao menos 196 funcionários de agência humanitárias morreram desde a incursão do Hamas no sul Israel que deixou 1.200 mortos e deu início ao conflito, em 7 de outubro passado. Desde então, autoridades ligadas ao grupo terrorista estimam que mais de 32 mil palestinos tenham morrido em decorrência dos confrontos.

Além dos bombardeios constantes, os moradores do território ainda enfrentam dificuldades para obter itens básicos como alimentos e remédios em razão do cerco que Tel Aviv estabeleceu ao seu redor, restringindo a entrega de carregamentos sob a justificativa de que eles podem representar um risco à sua própria segurança.

A WCK vinha tentando contornar essas limitações enviando navios com comida diretamente do Chipre. Depois do ataque ao seu comboio, porém, a organização informou que pausaria suas operações imediatamente, e embarcações com as 240 toneladas restantes de recursos que ainda seriam desembarcadas deram meia-volta.

Os Emirados Árabes Unidos, um dos principais responsáveis pelas doações que garantiram o estabelecimento de um corredor marítimo pela WCK partindo do Chipre, afirmaram que também estavam suspendendo os carregamentos até que houvesse mais garantias de segurança e uma investigação completa do incidente por parte de Tel Aviv.

Questionado sobre o episódio, o porta-voz da ONU Stéphane Dujarric afirmou nesta terça que as mortes dos funcionários eram "o resultado inevitável da forma como esta guerra está sendo conduzida". "Deixem os agentes humanitários trabalharem", acrescentou.

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